Oscar 2025

A cerimônia do Oscar uma vez mais consagra os filmes que confluem na narrativa que as elites estadunidenses querem emplacar em sua guerra cultural.

Independentemente das diferenças que vemos ano após ano, o Oscar é, há décadas, tão somente a autocelebração das elites “letradas” dos EUA, bem como um dos meios pelos quais eles estabelecem uma bússola para o mundo do cinema. É, como sempre, o retrato atual da hegemonia globalista.

E em 2025 não é muito diferente se compararmos com 2024. Existem algumas “arestas” aparadas, com a remoção de alguns exageros wokes, mas a linha seguida pela “Academia” segue sendo a mesma de todos os últimos anos. Sempre haverá ali uma veia subversiva voltada para a relativização de determinados valores basilares.

A premiação de Anora (em várias categorias) foi um esforço de uma escolha politicamente neutra, em uma era de saturação do progressismo, mas ela não deixa de ser uma celebração da “independência feminina”, a qual, aparentemente, tem como sua máxima expressão a prostituição. Tudo isso em um contexto no qual o status de “imigrante” é central.

The Brutalist também possui aspectos razoavelmente neutros e tem a sua qualidade narrativa, mas tudo isso é empacotado necessariamente em dois “mantos sagrados”: o protagonista é um imigrante e, ao mesmo tempo, sobrevivente do Holocausto.

A premiação de uma biografia de um sobrevivente do Holocausto serve para a Academia compensar a premiação dada a um documentário sobre a situação de uma família palestina na Cisjordânia. É claro, necessário apontar que o olhar do documentário No Other Land é, também, israelense, mas o do “israelense piedoso”, e, portanto, não pode faltar simultaneamente “pena” pelos palestinos e uma veia anti-Hamas. Trata-se de um documentário que rodou os cinemas e festivais de quase todas as capitais europeias e serve para que a elite ocidental se sinta bem consigo mesma ao derramar lágrimas de crocodilo pelos palestinos.

O Conclave culmina com a eleição de um Papa hermafrodita e progressista, que ao final dá um discurso “do bem” tão genérico que poderia ter sido escrito pelo ChatGPT.

Emilia Pérez, que chegou a ter algum favoritismo para várias categorias, era uma história sobre cirurgia de redesignação de gênero, mas a equipe meteu tanto os pés pelas mãos e se envolveu em tantas polêmicas que acabou sepultando a maioria de suas chances de premiação.

A maioria dos outros filmes não merece muitos comentários. As premiações dadas a Substância e Duna foram merecidas.

Naturalmente falta comentar sobre Ainda Estou Aqui.

O filme brasileiro, dirigido pelo bilionário ongueiro Walter Salles, ganhou a premiação de Melhor Filme Estrangeiro.

Nos meses que antecederam a premiação criou-se todo um movimento nas redes sociais em prol do filme brasileiro – com muita gente inclusive costurando argumentos “nacionalistas” para defendê-lo.

Sobre esse tipo de “nacionalismo” de defensor de premiação do Oscar, me recordo a distinção feita no âmbito das identidades entre “identidade difusa”, “identidade extrema” e “identidade profunda”. A primeira sendo aquela do apego a expressões externas e superficiais (torcer pela seleção, comemorar premiação internacional para a Anitta, etc.), a segunda é o tipo de identidade artificial que assume feições intransigentes e excludentes, o que pode ir desde uma mera obtusidade social até a violência (“se você prefere [insira qualquer banda estrangeira] a Caetano Veloso você não é brasileiro de verdade”), e a terceira sendo a compreensão íntima do que é “ser” do seu povo, o que passa pela absorção do que há de melhor na filosofia, na literatura, na música, nos mitos e nos símbolos de seu povo.

Essa galera do “culto a Fernanda Torres” (ótima atriz por sinal) e que se descabelou com a vitória de Ainda Estou Aqui transita, naturalmente, entre a identidade difusa e a identidade extrema. Na verdade, praticamente todo o nacionalismo brasileiro contemporâneo não vai além disso, em sua perpétua emulação do Policarpo Quaresma.

Mas sempre há uma agenda no Oscar e a agenda no que concerne a premiação do Ainda Estou Aqui já foi indicada também pelas redes sociais: não tem nada a ver com a memória histórica da ditadura, e sim com a difusão de narrativas contrárias aos “autoritarismos”, onde a Academia claramente situa o atual governo dos EUA.

Independentemente dos méritos da Fernanda Torres, ou mesmo dos méritos do Walter Salles, a premiação de Ainda Estou Aqui só foi possível porque ela se presta à função de ajudar a construir a narrativa ideológica de Hollywood para os próximos anos.

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Raphael Machado

Advogado, ativista, tradutor, membro fundador e presidente da Nova Resistência. Um dos principais divulgadores do pensamento e obra de Alexander Dugin e de temas relacionados a Quarta Teoria Política no Brasil.

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