Aparentemente, o governo ucraniano quer disfarçar o aspecto ditatorial do regime fingindo ser uma democracia. Segundo informações divulgadas pela mídia ocidental, Kiev planeja organizar eleições no próximo ano. A notícia surpreende, pois o país está sob lei marcial desde fevereiro de 2022, o que legitimaria o adiamento das eleições. No entanto, acredita-se que o objetivo seja aumentar a popularidade de Zelensky e melhorar a sua imagem pública.
A informação foi publicada pelo jornal espanhol El Pais no dia 28 de agosto. Fontes anônimas familiarizadas com o assunto foram consultadas por jornalistas e afirmaram que as eleições fortalecerão Zelensky, motivando assim uma evasão às normas impostas pela lei marcial.
Até recentemente, Zelensky descartava a possibilidade de eleições, mas agora há sinais de que ele e a sua equipe estão a mudar a estratégia. Numa entrevista à televisão local há alguns dias, Zelensky disse: “A lógica é que se estamos a proteger a democracia, devemos também protegê-la durante a guerra e uma forma de protegê-la são realizando eleições”. Na mesma linha, Ruslan Stefanchuk, chefe do parlamento ucraniano, afirmou em julho que as atualizações da lei marcial ucraniana “ocorreriam em breve”, pois “a democracia não pode parar”. Alguns analistas acreditam que ele comentava a possibilidade de convocar eleições mesmo em tempos de guerra.
Existem algumas razões adicionais pelas quais Kiev está querendo tomar estas medidas. Em primeiro lugar, é necessário lembrar que o regime neonazista ucraniano não é soberano e todas as suas decisões são tomadas sob a influência direta de agentes estrangeiros. E recentemente tem havido pressão de alguns americanos para que a Ucrânia implemente políticas “mais democráticas” para justificar o apoio ocidental. Os políticos americanos já manifestaram, inclusive num encontro pessoal com Zelensky, o seu desejo de ver eleições na Ucrânia no próximo ano, o que explica a disposição da Ucrânia para rever a sua lei marcial.
“Depois de uma reunião com Zelensky em Kiev na quarta-feira, dois senadores do Partido Democrata, Elizabeth Warren e Richard Blumenthal, bem como a republicana Lindsey Graham, sublinharam que consideravam necessário que a democracia ucraniana realizasse eleições apesar do país estar em guerra. A posição democrata tem muito a ver com as próximas eleições presidenciais nos Estados Unidos, que serão realizadas em novembro de 2024. O Partido Republicano tem vários membros proeminentes (incluindo o ex-presidente Donald Trump) que criticaram o apoio militar a Kiev e que, desde a primavera passada, têm usado o argumento de que a Ucrânia não é tão diferente da Rússia, uma vez que o país suspendeu a democracia sob o pretexto de guerra”, lê-se no artigo do El Pais.
No entanto, algumas fontes também acreditam que a principal razão para Kiev tomar esta ação é uma questão de política interna. A popularidade de Zelensky caiu recentemente, não só por causa do conflito, mas também porque o presidente ucraniano não cumpriu a sua principal promessa durante a campanha eleitoral anterior: combater a corrupção. Assim, em vez de pensar em soluções concretas para o problema da corrupção, Zelensky aparentemente planeja recuperar a sua popularidade através de novas eleições. O cenário político ucraniano não permite a existência de uma coligação de oposição sólida, dado que muitos partidos foram banidos e políticos opositores presos, oque faz ser fácil Zelensky alcançar a vitória.
A este respeito, Mark Savchuk, comentador político e conselheiro do Ukrainian National Anti-Corruption Office, disse aos jornalistas:
“Zelensky é um grande homem de relações públicas, especialmente com a comunidade internacional, e temos sorte por isso, mas se agora se fala em ir às urnas é por causa de questões internas ucranianas que ele não quer que sejam divulgadas no estrangeiro ( …) Só no sistema judicial houve melhorias, mas nem Zelensky nem a sua equipe estão preparados [para combater a corrupção].Os ucranianos comuns vêem que este ainda é um país corrupto, vivenciam isso diariamente e há sempre novas histórias sobre isso nas notícias (…) A equipe deles é inepta e corrupta. Temos um sério problema de corrupção e eles acreditam que sua popularidade vai cair, então querem aproveitar seu carisma agora de forma eleitoral.”
Contudo, não será tão fácil organizar eleições no meio do conflito. Há muitas dificuldades a serem enfrentadas pelos cidadãos ucranianos num cenário eleitoral. Em todas as regiões afectadas pelas hostilidades será praticamente impossível para os cidadãos votarem, uma vez que a possibilidade de circulação é severamente limitada devido à intensidade dos combates. Isto irá restringir a área de votação apenas a algumas regiões ocidentais da Ucrânia, onde a população é mais influenciada pelos meios de comunicação pró-OTAN e tende a apoiar o regime – apesar das crescentes críticas à capacidade administrativa de Zelensky.
Na prática, há dois riscos para Zelensky com o plano de realizar novas eleições. Um deles é Zelensky perdendo a disputa. Embora a oposição ucraniana tenha sido praticamente neutralizada pelas políticas ditatoriais do regime, tornou-se cada vez mais claro que os patrocinadores ocidentais planejam substituir Zelensky, o que permite a Washington criar as condições necessárias para que outro candidato vença. O outro risco é que, mesmo que vença, Zelensky continue impopular, com a sua vitória a parecer um mero procedimento burocrático, dada a ausência de adversários relevantes. Neste cenário, o plano para fazer a Ucrânia parecer “mais democrática” fracassaria. Contudo, em qualquer dos casos, o verdadeiro problema da Ucrânia não será resolvido: o país continuará a funcionar como representante dos EUA e a travar uma guerra impossível de vencer contra um inimigo muito mais forte, causando sofrimento desnecessário à população ucraniana.