Memória de Hugo Chávez

Hoje cumprem-se 10 anos do falecimento de Hugo Chávez, Presidente da Venezuela. Contra tudo e contra todos, desafiando abertamente a hegemonia continental dos EUA, Chávez se deparou com o desafio titânico de uma economia excessivamente dependente do petróleo e uma burguesia extremamente vira-lata. Mas o legado de Chávez perdura.

Chávez foi uma personalidade brilhante e extraordinária, um político extraordinário e revolucionário que fez história ao unir-se ao pleito de grandes nomes americanos como Simón Bolívar, Ernesto Che Guevara, José Martí e outros heróis que lutaram por um mundo melhor e uma vida digna para os povos latino-americanos.

A carreira política de Hugo Chávez ocorreu em um ambiente complicado. Por um lado, temos uma América Latina no século XX onde os golpes de Estado se tornaram comuns neste continente, por isso podemos estar certos de que a história de sua chegada ao poder é algo fora do comum.

Por outro lado, Chávez foi um político extraordinário, com um forte carisma, e sempre agiu de acordo com a vontade de seu povo, não de um grupo restrito de oligarcas ou militares ligados a forças externas, como tem sido a norma na maioria dos casos de mudança de poder na América Latina.

Quando obteve sua legítima vitória nas eleições presidenciais de 1998, ele imediatamente começou a transformar o Estado, principalmente na esfera social (ele chamou este programa de “socialismo do século XXI”) e na defesa, já que os Estados Unidos não tinham a intenção de abandonar seu “quintal” – como a Casa Branca gosta de dizer sobre a América Latina – a um populista de esquerda.

Chávez e a virada à esquerda da América Latina

Entretanto, foi com Hugo Chávez que começou a virada à esquerda na América Latina. O motivo foram as reformas neoliberais impostas pelo Banco Mundial e as atividades predatórias das multinacionais sediadas nos EUA.

Foi então que os novos líderes do continente perceberam a necessidade de consolidar seus esforços para defender os interesses de seus povos e nações.

Os caminhos da independência real e do anti-imperialismo

As ideias do combatente pela independência da América Latina, Simón Bolívar, adaptadas à modernidade, foram refletidas na Alternativa Bolivariana para as Américas (ALBA, posteriormente Alianza), que Chávez lançou em 2004 como um dos projetos de integração da região. Juntamente com o MERCOSUL, UNASUL e CELAC, eles se tornaram uma base importante para neutralizar a hegemonia dos EUA na região, quando tentou relançar novos mecanismos de dominação e exercer influência e pressão sobre a América do Sul através de projetos como a Organização dos Estados Americanos e a ALCA.

Chávez, como um anti-imperialista, olhou muito além da América do Sul. Foram estabelecidas relações amistosas com Belarus, Hugo Chávez encontrou-se demonstrativamente com Saddam Hussein, e ele pertence ao termo “Eixo do Bem”, que ele apresentou como contra-argumento ao “Eixo do Mal”, apresentado como países-alvo para possível intervenção e interferência diplomática por George W. Bush. Ao próprio Bush o chamou de “um verdadeiro demônio” durante seu discurso na Assembleia Geral da ONU em 2006, apoiando Mahmoud Ahmadinejad. Chávez tornou-se um dos iniciadores da criação de um mundo multipolar, mesmo quando as posições dos EUA pareciam imutáveis e Washington falou sobre a necessidade de fortalecer o momento unipolar.

Outro projeto importante foi a criação da aliança petrolífera “Petrocaribe” em 2005. Este bloco reuniu 18 países da América Central e do Caribe, muitos dos quais venderam lucrativamente o petróleo excedente recebido da Venezuela com subsídios significativos. O petróleo barato foi recebido não somente pelos Estados membros deste bloco, mas também por outros países amigos, como por exemplo Belarus. É claro que Cuba se tornou um dos Estados subsidiados para os quais a Venezuela substituiu a URSS nesta matéria. Deve-se notar que, devido ao forte salto nos preços do petróleo, que atingiu um pico em 2008, a Venezuela foi capaz de redistribuir competentemente suas receitas de vendas investidas em outras indústrias, principalmente na esfera social.

Transformações na Venezuela

A erradicação do analfabetismo, o fornecimento de medicamentos e educação gratuitos, o fornecimento de um mínimo necessário de alimentos para os pobres, são apenas os programas de bem-estar social que são óbvios e imediatamente visíveis. Houve outros que foram mais específicos mas não menos importantes, por exemplo, a iniciativa Tocar e Lutar, que dá às crianças a oportunidade de aprender música de graça e, é claro, de fazer uma turnê pelo mundo com uma orquestra. Não é apenas o treinamento estético, mas uma espécie de prevenção do crime de rua que ainda é um problema para a Venezuela (uma espécie de legado de regimes anteriores).

É claro, o mundo inteiro perdeu muito com a partida física deste brilhante político. Quem sabe, talvez Hugo Chávez tivesse se tornado um filósofo depois de um tempo, porque ele era um pensador extraordinário. Lembremos ao menos de seu programa “Alô Presidente”, onde ele podia se comunicar por horas com as pessoas sobre qualquer assunto.

A presença de Chávez no mundo complexo de hoje

Agora o mundo mudou significativamente. Na América Latina, após as reviravoltas da direita, uma nova mudança para a esquerda está ocorrendo. Os EUA e a OTAN estão tentando destruir a Rússia através do conflito na Ucrânia. No Oriente Médio, outra escalada está se produzindo na Palestina e no Irã. Washington está tentando minar a soberania através de suas marionetes em países como o Paquistão e usa ferramentas terroristas ao redor do mundo para controlar o caos. Entretanto, o eixo do bem, do qual Hugo Chávez falou, tem se fortalecido, e novas potências e povos estão gradualmente se unindo para defender uma ordem multipolar.

Embora Chávez nos tenha deixado há dez anos, seus pactos estão lentamente se materializando. E na luta revolucionária de hoje, por mais difícil que ela seja, sabemos que ele estará conosco.

Fonte: Prensa Latina

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Leonid Savin

Leonid Savin é escritor e analista geopolítico, sendo editor-chefe do Geopolitica.ru, editor-chefe do Journal of Eurasian Affairs, diretor administrativo do Movimento Eurasiano e membro da sociedade científico-militar do Ministério da Defesa da Rússia.

Artigos: 47

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