A modernidade abunda em falsos heróis, falsos ídolos, falsas genialidades e falsos martírios. Caso emblemático é o da pintura “Guernica”, de Pablo Picasso, mundialmente famosa por representar os “horrores da guerra civil espanhola”. Mas será verdade?
A obra foi solenemente apresentada ao público com o nome “Guernica” pelo próprio Pablo Picasso e por Max Aub, subcomissário da exposição, na inauguração do Pavilhão de Espanha da “Exposition Internationale des Arts et Techniques”, em Paris, no dia 4 de Maio de 1937.
Esta data pode ser verificada facilmente, uma vez que se tratou de um acontecimento público e que foi amplamente divulgado nas primeiras páginas da imprensa da época.
Todavia, pesquisando na internet sobre o quadro “Guernica”, quase sempre se encontram textos em que abundam muitos outros pormenores, muitos inúteis e fantasiosos, mas essa data é geralmente esquecida.
A razão também é fácil de compreender. Logo na inauguração Max Aub afirmou que muito se iria falar daquela pintura. E efetivamente logo a partir dessa apresentação pública a obra converteu-se num símbolo publicitário do Governo Republicano, durante o resto da Guerra Civil e mesmo no exílio posterior. E sobretudo, tal como ainda agora acontece, apresentava-se o quadro como tendo sido elaborado por Picasso como resposta indignada ao bombardeamento que tinha sofrido a cidade de Guernica.
Porém, se atentarmos na data, logo se conclui que não pode ser assim.
Na verdade, o bombardeamento de Guernica ocorreu na tarde de 26 de Abril de 1937. Nos dias seguintes o facto tinha começado a ser noticiado e comentado em Paris, mas o quadro foi apresentado praticamente uma semana depois do acontecimento. Trata-se de uma obra com 3,5 metros de altura por 7.77 metros de largura. Não consta que estivesse a pingar tinta quando foi colocado na Exposição.
O próprio Picasso chegou a declarar que tinha demorado 60 dias a executar o trabalho. Dadas as suas dimensões, não é dizer pouco.
Pensar que o quadro foi iniciado e completado entre 27 de Abril e 3 de Maio não cabe nem na mais delirante imaginação, pese embora a conhecida produtividade de Picasso.
Uma conclusão se impõe: o trabalho não foi inspirado nem representa o bombardeamento da cidade de Guernica.
Na realidade, a história do “Guernica” começou em Janeiro de 1937, quando Max Aub, então adido cultural da Embaixada de Espanha em Paris, além de subcomissário da Exposição que se preparava, encomendou a Pablo Picasso, por ordem do Governo Republicano transmitida ao Embaixador Luís Araquistáin, um mural para ser exposto no Pavilhão de Espanha da dita exposição, mediante o pagamento de 150.000 francos.
Em vez de um mural foi executado aquele enorme painel, em óleo sobre tela, que cumpriu o seu papel na parede. Se foi Picasso, ou Max Aub, ou outro qualquer, que anteviram o potencial da designação, para cavalgar a onda noticiosa, e se lembraram de batizar o quadro de “Guernica”, nos breves dias que antecederam a inauguração da exposição, é facto que dificilmente poderá ser esclarecido. Mas a restante fatualidade que envolveu a encomenda é irrefutável.
Desde então, “Guernica” tem sido objeto de estudo, crítica, opinião e inspiração um pouco por toda a parte.
Representará uma visão particular obre os horrores da guerra, de todas as guerras? Segundo alguns a tensão expressa no quadro lembra “Los horrores de la Guerra”, de Goya.
O que não se distingue nele, nem podia, é alguma alusão direta aos acontecimentos históricos que então se deram, nomeadamente aos bombardeamentos de Guernica.
A denominação da obra e toda a propaganda desencadeada a partir daí representa apenas uma operação política, em que participou o milionário “comunista” Pablo Picasso (duas vezes “Prêmio Lênin da Paz”) e todas as centrais de intoxicação ao serviço das causas do costume.
Algumas más línguas sugerem que o quadro com que Picasso correspondeu à encomenda estava feito antes, ou em adiantada execução, e chamava-se realmente “Lamento en la muerte del torero Joselito”, evocando a memória do toureiro Joselito (José Gómez Ortega), morto na arena de Talavera de la Reina a 16 de Maio de 1920. Não sei, mas é verdade que o malaguenho Picasso sempre dedicou grande atenção aos temas taurinos, desde a sua juventude. E observando o quadro podem distinguir-se touros e cavalos, uma composição de motivos tauromáquicos num paroxismo de morte. O que não se consegue descortinar são aviões, casas, guerra ou bombardeamentos.
De qualquer modo, nada exime o franquismo de ter se perpetuado no poder além de seu tempo, forçando a saída de inúmeros intelectuais, artistas e cientistas como Buñuel, No, Myra-y-Lopez, etc. e deixado uma sequela de imaturidade social.