O que Marco Aurélio, considerado um dos 5 grandes imperadores da Roma Antiga, tem a nos dizer sobre a vida em 10 ensinamentos baseados em suas obras.
Quando os bárbaros souberam que um filósofo havia ascendido ao poder em Roma, eles entenderam isso como um sinal de fraqueza: mas não poderiam estar mais enganados. Marco Aurélio terminou seu reinado sem perder sequer uma única batalha em toda a sua vida; seus 19 anos de governo foram marcados pelo enfrentamento a inimigos ferozes (de um lado, os germanos, do outro, os partos), e pela prosperidade e estabelecimento da paz. Corriam informações, através de seus súditos, que, além de muitas vezes dormir em camas simples ou esteiras, o soberano vestia-se de maneira tão simples quanto o mais modesto dos serviçais (hábitos mal vistos por muitos de seus pares), sendo um homem desapegado de validações externas ou reconhecimento.
Muitas de suas conhecidas meditações eram escritas em campo de batalha e direcionadas a si mesmo, com pretensões de cunho íntimo, ficando perdidas durante muitos séculos e só sendo resgatadas no período histórico do Renascimento.
Selecionamos algumas destas reflexões do Imperador-Filósofo — tantas de caráter atemporal —, adequadas à vida prática do homem contemporâneo.
1. O que é do outro não te pertence
Não desperdice o que resta de sua vida especulando sobre seus vizinhos. Qualquer coisa que o distraia da fidelidade aos teus princípios ou rumos significa perda de oportunidade para outra tarefa; administração de tempo é uma das habilidades mais desejadas de ser adquirida em contextos de acesso e excesso de informação — como é o caso da era vigente—, e saber separar aquilo que é teu daquilo que não é se torna uma tarefa difícil. Portanto, use como parâmetro o limite entre você e o seu vizinho (o outro): é um ponto de partida para saber o que deve ou não ser da sua conta, e o que deve ou não tomar teu tempo.
2. Você é o que absorve
A vida é apenas o que você considera. A vida é opinião. A questão é que você, na maioria dos casos, é quem determina o que irá te atingir e quais conceitos externos irão te definir ou te modificar. Quanto menos defesas tiver contra as expectativas sociais sobre você, mais definido por elas você será; a questão aqui é possuir a autonomia de defletir tudo aquilo que escolhe desconsiderar, mantendo sua personalidade o mais isenta possível do modo de vida alheio. É conviver sem modificar-se — caso não desejar ser modificado.
3. Aja pouco, mas aja preciso
Se quiser conhecer a satisfação, que sejam poucas as suas ações. Melhor ainda, limite-as estritamente ao essencial e àquelas que são de ordem social (mas reféns da razão). Você frequentemente fará coisas que, pondo num grau de hierarquia, escolheria não fazer (mas que foi necessário). Ao menos torne essas ações enfadonhas úteis para o seu bem-estar ou dos seus. Mesmo ambientes sociais podem te favorecer por reforçar laços, contatos, amizades e demais conexões que facilitem a busca pelo bem-comum, que também era uma das preocupações primárias de Marco Aurélio. A saúde da comunidade também é importante, por isso expor-se é relevante: mas faça dessas exposições eventos vinculados à razão, para que não desperdice energia e tempo além do necessário.
4. Memento Mori
Suponha que você morreu hoje e a história da sua vida terminou e, daqui em diante, considere quanto tempo mais lhe for concedido como um excedente não autorizado. A ideia é que você valorize a vida através do constante pensamento de que você pode — e irá — morrer: essa partida pode ser hoje, amanhã, daqui a meses ou anos, mas irá acontecer. Por isso, lembre-se de que morrerá (memento mori) e viva a sua vida com vigor e realização, atrelado aos demais princípios estoicos citados aqui.
5. Conheça sua força interior para suportar
Que sorte tens que “determinado acontecimento” não lhe nutriu amargura; mantendo-o inabalável no presente e não distraído pelo futuro. A determinada “coisa” poderia ter acontecido com qualquer um, mas nem todos teriam emergido impassíveis. (Uma pessoa é mais forte do que se pensa). Sinta-se alegre que tal desafio bateu a tua porta, pois tu tens a força para domá-lo; tu — dentre tantos — estás preparado para ele, de tal modo que não se permitiu titubear. Passe por esta tormenta ciente de que ela precisa ser superada completamente para que suas cicatrizes e feridas não abram no futuro; o passado já não lhe atinge (pois já passou e está feito) e o futuro não te tira o presente (pois estás preparando-se para ele). Encontre sua força interior e apegue-se nela para a inabalável postura.
6. Viva para o seu propósito
O verdadeiro deleite de um homem é fazer as coisas para as quais ele foi feito para fazer. Para saber sobre aquilo que possui vocação, é preciso conhecer-se primeiro, e esse exercício de autoconhecimento é fruto da experiência de vida somada à maturidade e à força pessoal para a realização. Sem esses três elementos, juntos, poderás passar tua vida inteira sem saber a que veio. Adicione paciência a esta fórmula e equilibrará esse jogo de forças, onde tal desconforto (ocasionado por essa busca interior) acabará por revelar sua verdadeira vocação, aquilo para o qual foi criado, sua aptidão.
Se te ocorrer, de manhã, de acordares com preguiça e indolência, lembra-te deste pensamento: Levanto-me para retomar minha obra de homem.
— Meditações, Marco Aurélio
7. Evite Reclamações
O seu pepino é amargo? Jogue-o fora. Existem espinhos no seu caminho? Livre-se de quantos forem possíveis. Para clarear a sua rota é necessário saber qual é o problema e separá-lo daquilo que não é. Muitas de nossas preocupações são exportadas de outros lugares — devido ao acúmulo de influencias em nosso emocional. Busque separar com parcimônia cada desafio racionalmente, separando-os em graus de dificuldade e responsabilidade sobre eles, aí então saberá quais deles te cabem e quais deles não te cabem. Reclamação é a ausência desta racionalização dos problemas, visto que extravasamos por via delas angustias não processadas ou entendidas por nossa mente.
8. Sua (in)felicidade caminha com você
Deixe claro em sua mente que a paz dos campos verdejantes sempre anda contigo, esteja você nele ou em qualquer outro local: refugiando-se em si mesmo, estando nas montanhas, nas colinas, no mar ou onde for, todo lugar será como se fosse o mesmo, pois sua paz é interior. Esqueça a ideia de que viajar irá amenizar suas dores e tristezas: tudo isso será carregado com você; portanto, o lugar onde estiver é indiferente se sua mente não está em harmonia. Primeiro busque o auto-aprimoramento antes de afobar-se em procurar, em ambientes externos, as satisfações e alívios para suas dores internas.
9. Não permita que a rotina te domine
Evite ações aleatórias ou sem propósito; e segundo, que toda ação vise unicamente o bem-comum. Se você não antecipar minimamente o seu dia, suas ações ao longo dele serão sem sentido ou objetivo; seja a médio ou longo prazo, para evitar que as demandas externas ou flutuações emocionais ditem como será a sua rotina, planeje seus afazeres visando objetivos em 3 níveis: curto, médio e longo prazo. Antecipe o desanimo separando aquilo que precisa ser feito com prioridade e simplesmente o faça: a recompensa de concluir aquilo que se propôs, visando uma meta, é imensamente superior a frustração por ter adiado suas tarefas.
10. Seja grato pelo que já é teu
Não se entregue aos sonhos de ter o que não tem, mas reconheça as principais bênçãos que possui e, depois, lembre-se de como você as desejaria se elas não fossem tuas. Para facilitar este exercício mental, faça uso de um diário, anotando pensamentos, vontades, vitórias e derrotas. Após um tempo, o releia, como um arquivo pessoal, isso o fará lembrar de como era a sua percepção quando não possuía aquilo que possui hoje.
— Estes dez tópicos foram elaborados a partir de minha leitura do livro Meditações, de Marco Aurélio. Recomendo sempre a obra completa