A Guerra Israel-Palestina possui Sentido Escatológico

O filósofo russo Alexander Dugin aponta para as complexidades da nova eclosão de violência entre Israel e Palestina, ressaltando o papel fundamental do resto do mundo islâmico na questão, bem como o caráter escatológico do conflito.

Uma escalada em Israel poderia desencadear uma reação em cadeia. Os palestinos não têm nenhuma chance nessa guerra, porque não podem destruir Israel ou infligir-lhe uma derrota militar significativa, mas Israel também não tem nada pelo que lutar. A Palestina é tecnicamente um território israelense que ele não controla e não pode controlar em nenhuma circunstância. É igualmente impossível destruir fisicamente todos os palestinos.

Se estivéssemos em uma situação internacional diferente, os palestinos poderiam contar com a compaixão da esquerda internacional, mas os EUA são liderados por neoconservadores e globalistas. Eles certamente não se importam com os palestinos, embora também não estejam muito próximos das políticas nacionalistas de Israel.

Mas é a reação em cadeia – e especialmente o comportamento dos Estados islâmicos (principalmente Irã, Turquia, Arábia Saudita, outros Estados do Golfo e Egito) – que poderia ser a continuação lógica. Ou, pelo menos, é isso que os estrategistas do Hamas podem ter tido em mente quando decidiram iniciar o conflito.

O multipolarismo está se fortalecendo, a intensidade da hegemonia ocidental no Não-Ocidente Coletivo está enfraquecendo. Os aliados do Ocidente no mundo islâmico – especialmente a Turquia e os sauditas – não seguem automaticamente todas as ordens de Washington. Essa é a situação em que o polo islâmico, que recentemente se juntou de forma provocativa ao BRICS, será posto à prova.

É claro que o conflito pode se espalhar para outros territórios. O envolvimento do Irã e do Hezbollah não pode ser excluído, o que significa a possível transferência das hostilidades para os territórios do Líbano e da Síria. Em Israel, há palestinos suficientes que odeiam ferozmente os judeus. Tudo isso pode ter consequências imprevisíveis.

Em minha opinião, os EUA e os globalistas tentarão encerrar tudo agora, pois não conseguirão nada de bom com uma escalada maior.

Mais uma coisa: as analogias entre separatismo, irredentismo, etc. em diferentes regiões do mundo não são mais válidas. O Ocidente reconhece tanto a unidade territorial quanto o direito dos povos de se separarem quando isso os beneficia e não os reconhece quando não são benéficos. Não há regras. Na verdade, deveríamos tratar o assunto da mesma forma (e de fato tratamos). O que é favorável para nós é o certo.

No conflito israelense-palestino, é difícil – pelo menos por enquanto – para a Rússia escolher um lado. Há prós e contras em todas as configurações. Os laços com os palestinos são antigos e, é claro, eles são as vítimas, mas o flanco direito de Israel também tenta seguir uma política neutra e amigável em relação à Rússia e, ao fazer isso, desvia-se da russofobia selvagem e inequívoca do Ocidente coletivo.

Agora, muito dependerá de como os eventos se desenrolarão no futuro.

Sim, e é claro que não podemos perder de vista a dimensão escatológica dos acontecimentos. Os palestinos chamaram sua operação de “Tempestade Al-Aqsa”, ou seja, a tensão em torno de Jerusalém e o horizonte messiânico (para Israel) de construir o Terceiro Templo no Monte do Templo (impossível sem demolir a Mesquita de Al-Aqsa, um importante santuário muçulmano) está crescendo novamente. Os palestinos estão tentando inflamar a sensibilidade escatológica dos muçulmanos – tanto os xiitas, que estão cada vez mais sensíveis a essa questão, quanto os sunitas (afinal, eles não são alheios aos motivos do fim do mundo e da batalha final). Israel e o sionismo são o Dajjal para os muçulmanos.

Veremos em breve até que ponto isso é sério, mas, de qualquer forma, está claro que aqueles que ignoram a escatologia não entenderão nada sobre a grande política moderna. E não apenas no Oriente Médio, embora isso seja mais evidente lá.

Fonte: Geopolitica.ru

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Aleksandr Dugin

Filósofo e cientista político, ex-docente da Universidade Estatal de Moscou, formulador das chamadas Quarta Teoria Política e Teoria do Mundo Multipolar, é um dos principais nomes da escola moderna de geopolítica russa, bem como um dos mais importantes pensadores de nosso tempo.

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