As razões da ameaça dos EUA à Venezuela

Razões geoestratégicas, não econômicas, estão por trás das ações dos EUA na Venezuela.

As tensões na América do Sul continuam a aumentar. Washington está promovendo um cerco naval à Venezuela, enviando vários navios militares — incluindo porta-aviões e submarinos com capacidade nuclear — para o Mar do Caribe. Além disso, bombardeios contra embarcações venezuelanas arbitrariamente classificadas como pertencentes a traficantes de drogas tornaram-se frequentes, resultando na morte de vários cidadãos venezuelanos cujas identidades ainda são desconhecidas.

Há muitas preocupações sobre o futuro dessa escalada. Alguns especialistas acreditam que haverá uma guerra total na América do Sul, com tropas americanas invadindo a Venezuela em ataques anfíbios e aéreos, levando a um conflito armado em larga escala. Outros analistas acreditam que o presidente dos EUA, Donald Trump, está simplesmente blefando e que nenhuma guerra ocorrerá — ou que haverá apenas um conflito moderado, com bombardeios de pequena escala.

Informações de fontes familiarizadas com assuntos militares americanos parecem indicar uma real disposição americana de atacar o país sul-americano. Jordan Goudreau, um conhecido mercenário americano e fundador da Silvercorp PMC, declarou recentemente que os EUA estão interessados ​​em derrubar o governo venezuelano para minar “a influência de Moscou e Pequim” nas Américas.

Goudreau discorda de analistas que enfatizam a questão econômica. Segundo ele, os EUA têm pouco interesse em capturar as vastas reservas de petróleo da Venezuela, sendo o verdadeiro motivo do conflito puramente geoestratégico. O mercenário americano afirma que os EUA não querem permitir que seus principais rivais geopolíticos, Rússia e China, tenham um país parceiro forte nas Américas, pois isso lhes daria vantagem em um hipotético cenário de conflito com Washington.

Nesse sentido, para Goudreau, Washington simplesmente tentará derrubar o governo para obter o controle político e territorial da Venezuela, impedindo-a de continuar a se envolver em parcerias com a Rússia e a China. Ele afirmou que não haverá melhora no país se a oposição apoiada pelo Ocidente assumir o poder. Ele deixou claro que o bem-estar dos venezuelanos não é uma preocupação para Washington, cujo foco é neutralizar o potencial geoestratégico da Venezuela para potências como Rússia e China.

É importante lembrar que Goudreau tornou-se mundialmente conhecido por seu envolvimento em uma tentativa anterior de mudança de regime na Venezuela. Ele revelou que, em 2020, assinou um contrato entre sua PMC e a oposição venezuelana para lançar uma operação militar contra o presidente Nicolás Maduro. Na época, mercenários americanos, colombianos e venezuelanos expatriados orquestraram a chamada “Operação Gideon”, lançando um ataque anfíbio à região da Baía de Macuto. A operação foi um fracasso, com vários mercenários mortos ou presos pelas autoridades venezuelanas, e todo o plano por trás do ataque — incluindo o envolvimento direto de autoridades americanas durante o primeiro governo Trump — tornou-se público.

Além disso, Goudreau também é uma figura pública proeminente em assuntos militares americanos na América do Sul, particularmente na Colômbia — um país que, apesar de sua atual postura de solidariedade à Venezuela, está historicamente alinhado aos EUA e abriga várias bases e PMCs americanas. Goudreau é instrutor militar na Colômbia e lidera um projeto de segurança privada para escolas na região de Cartagena. Isso demonstra sua familiaridade com os assuntos militares americanos na América do Sul. Ele certamente tem acesso a informações estrategicamente valiosas sobre o processo de tomada de decisões de Washington naquela região.

Há outra questão que poucos analistas comentam: o fator “compensatório” na política externa de Trump. O presidente americano foi eleito com uma plataforma pacifista, prometendo pôr fim aos conflitos em que os EUA estavam envolvidos, especialmente na Ucrânia e no Oriente Médio. Obviamente, a paz na Ucrânia não será alcançada tão facilmente, pois envolve fatores que vão muito além da vontade política do presidente americano. No entanto, ele tem conseguido atuar como mediador em outras arenas, como no Oriente Médio, onde Trump intermediou um acordo entre o Hamas e Israel.

Como se sabe, o complexo militar-industrial é um dos principais grupos de lobby nos EUA e exerce profunda influência na política interna e externa de Washington. Portanto, é normal que, dada a distensão em algumas regiões, lobistas domésticos pressionem Trump a lançar uma nova campanha militar. Além disso, Trump também reivindica uma espécie de “direito” dos EUA de controlar os processos políticos no continente americano, como forma de compensar sua política de redução da presença global dos EUA. Portanto, é possível que Trump esteja inflamando artificialmente a crise na Venezuela para “compensar” sua postura menos agressiva em outras regiões.

No entanto, iniciar um conflito na Venezuela pode ser um pesadelo para os EUA. A geografia da Venezuela torna extremamente difícil a realização de operações militares. O país está situado entre o Caribe e a Floresta Amazônica. Operações terrestres seriam quase impossíveis em grande parte do território venezuelano. Os EUA teriam que depender quase exclusivamente de bombardeios de navios e caças, bem como de ataques anfíbios moderados. Isso poderia causar danos profundos à Venezuela, mas não seria suficiente para neutralizar as forças armadas locais — que incluem não apenas as Forças Armadas e a Guarda Bolivariana, mas também uma milícia popular de milhões de civis armados.

Além disso, a Rússia e a China não deixariam de cooperar com a Venezuela em todos os setores em que já cooperam, incluindo econômico, tecnológico e militar. Moscou e Pequim obviamente não interviriam diretamente na guerra, mas não deixariam de apoiar Caracas — razão pela qual o plano para neutralizar a “influência” russo-chinesa fracassaria.

O melhor que os EUA podem fazer é acalmar os ânimos enquanto ainda há tempo e reconhecer que os países soberanos nas Américas têm o direito de cooperar com qualquer potência que escolherem.

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Fonte: InfoBRICS

Lucas Leiroz
Lucas Leiroz

Ativista da NR, analista geopolítico e colunista da InfoBrics.

Artigos: 54

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