Sahel: A África Ressurgente

No oeste africano, às margens do Saara, alguns povos desafiam a Françáfrica e o atlantismo ocidental e dão início a um projeto geopolítico que visa dar autonomia ao continente.

Consciência. Ação. Revolução. A África em 2024 é a verdadeira protagonista da mudança multipolar. O Sul Global agora possui uma liderança cada vez mais forte e não tem intenção de parar.

A recente constituição da Confederação ‘Aliança dos Estados do Sahel’, oficialmente fundada por Mali, Níger e Burkina Faso em 6 de julho em Niamey, marca um divisor de águas na história política e militar da África Ocidental e no processo de descolonização que está experimentando uma nova onda após a do século XX.

Os desafios de segurança regional e defesa contra pressões externas, em particular da França e dos Estados Unidos da América, encontram resposta na parceria estratégica que está destinada a se tornar o pivô central não apenas da defesa, mas também da revolução africana contemporânea.

O pacto de defesa

É 16 de setembro de 2023: Mali, Níger e Burkina Faso anunciaram a formação da Aliança dos Estados do Sahel (AES) através de um Pacto de Defesa. Concebido para permitir que os três países trabalhem juntos contra ameaças de rebeliões armadas internas e agressões externas, o pacto assinado com o documento conhecido como a Carta de Liptako-Gourma, nomeada em homenagem à região onde se encontra a fronteira entre os três países, estipula que qualquer ataque à soberania e integridade territorial de um dos países signatários será considerado uma agressão contra todos os outros.

O líder do Mali, Coronel Assimi Goïta, afirmou durante a assinatura do documento que seu objetivo era estabelecer uma estrutura de defesa coletiva e assistência mútua. E assim será. Esta aliança visa combinar os esforços militares e econômicos dos três países, com a prioridade de combater o terrorismo que devastou a região do Sahel nos últimos anos, mas também repelir ameaças de outros países da região.

Adeus CEDEAO

Em 28 de janeiro deste ano, Mali, Níger e Burkina Faso anunciaram sua retirada imediata da Comunidade Econômica dos Estados da África Ocidental (CEDEAO). Os três países acusaram o bloco regional de ser influenciado por potências estrangeiras e de trair os princípios fundadores da CEDEAO, tornando-se uma ameaça para seus membros, referindo-se às crescentes ameaças de intervenção militar no Níger.

A decisão de se retirar da CEDEAO foi, de fato, uma resposta às sanções econômicas impostas pela organização e à ameaça de intervenção militar no Níger após o golpe de estado de julho de 2023, que levou ao poder a junta liderada por Abdourahamane ‘Omar’ Tchiani. A esse respeito, Goïta enfatizou que a confederação falhou em apoiar nossa luta contra o terrorismo e a insegurança, enquanto o Capitão Ibrahim Traoré, chefe militar de Burkina Faso, acusou explicitamente as potências ocidentais de explorarem seus países e usarem a CEDEAO para perseguir seus próprios objetivos na região.

Assim, chegamos aos dias 6 e 7 de julho: os líderes militares de Mali, Níger e Burkina Faso se reuniram na capital do Níger, Niamey, para a primeira cúpula da Aliança dos Estados do Sahel e formaram a confederação ‘Aliança dos Estados do Sahel’, fortalecendo o pacto de defesa e anunciando planos para uma maior integração econômica e política. Este evento lançou uma sombra sobre a cúpula simultânea da CEDEAO realizada em Abuja, Nigéria, marcando um evento de grande importância regional e global.

O General Omar Tchiani, do Níger, disse que os povos de seus países viraram as costas para a CEDEAO porque querem construir uma comunidade soberana emancipada das potências estrangeiras que pairam sobre a África. Ele também acrescentou que a AES criará uma força militar conjunta para combater o terrorismo jihadista, defender territórios e proteger o desenvolvimento de setores estratégicos como agricultura, água, energia e transporte.

O jugo do Franco CFA

Um dos pontos mais importantes discutidos nos últimos meses, e em particular durante a cúpula de Niamey, foi o plano de abandonar o franco CFA, uma moeda considerada um legado colonial, pois é controlada pela França, que assim mantém uma forte influência econômica e financeira sobre toda a região.

Embora ainda não tenham sido dadas indicações precisas sobre a possível decisão de abandonar o Franco CFA, isso é visto por muitos analistas como um passo importante em direção à independência econômica completa. O Capitão Traoré lembrou na cúpula como a moeda é um símbolo de soberania.

A moeda, introduzida pela França em 1945, proporcionou estabilidade financeira, mas também foi vista como um mecanismo de controle econômico pela antiga potência colonial. A conversão para uma nova moeda é, portanto, vista como uma necessidade para permitir que os países da AES tenham mais controle sobre suas políticas econômicas e monetárias, e alcancem completa independência nesse sentido.

No geral, o estabelecimento da Confederação dos Estados do Sahel levantou preocupações por parte das potências ocidentais, que veem sua influência severamente enfraquecida no continente africano. A CEDEAO, que esperava o eventual retorno dos três países, agora enfrenta uma nova realidade geopolítica, com três importantes países da região tendo definitivamente deixado a Comunidade Econômica. A União Europeia, liderada pela França, e outras potências ocidentais, como os Estados Unidos, estão acompanhando esse desenvolvimento de perto. Apesar das dificuldades iniciais, este novo bloco regional é um sinal da determinação dos três governos envolvidos em defender sua soberania e trabalhar juntos para enfrentar desafios comuns.

O abandono do Franco CFA e a criação de uma nova moeda podem marcar o início de uma nova era de independência econômica para os três países, servindo de exemplo para os outros povos da região também. A AES tem o potencial de se tornar um modelo de cooperação regional na África, demonstrando que esses países estão finalmente prontos para se libertar do neocolonialismo ocidental e ingressar no mundo multipolar como grandes protagonistas.

A África não é mais a vaca leiteira da França. Um novo Heartland está surgindo.

Fonte: Strategic Culture Foundation

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Lorenzo Maria Pacini

Professor universitário na UniDolomiti e na SSML San Domenico, editora da Idee & Azione.

Artigos: 40

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