por Novas
Analisando a crítica feita pelo poeta e místico americano Charles Upton a Alexander Dugin, o autor identifica um cenário comum entre os críticos do filósofo: a falta de compreensão. Dugin é um pensador perigoso não só por seu alcance e obstinação, mas pela dificuldade entre os não iniciados de compreender suas motivações.
Inspirado na crítica de Upton a Dugin, acrescentarei alguns pensamentos e esclarecimentos sobre o que ele aborda.
Dugin não é um intelectual burguês tentando apresentar um sistema coerente para todos como se todos fossem iguais. Mas tampouco é um iniciado apolíneo que fala apenas para os aristocratas da alma.
Ele é um iniciado dionisíaco que versa sobre diferentes níveis da realidade, criando brechas, liberando a luz antes aprisionada na escuridão. Há nele tanto um lado esotérico quanto exotérico.
Ao dialogar com mentes espiritualmente elevadas, ele apelará diretamente aos seus anseios de liberdade, e com mentes inferiores enfatizará a necessidade de disciplina e lealdade aos ideais e representantes superiores.
A quarta teoria política e o Eurasianismo não são a mesma coisa. O eurasianismo é sua sugestão quarto-teórica aplicada ao contexto russo, e não uma imposição sobre outras civilizações, que devem erigir seus próprios projetos.
Enfatizar Crowley como uma influência significativa de Dugin é um erro, que qualquer leitor de Dugin pode confirmar. Dugin elogia elementos entre milhares de intelectuais e esotericistas, assim como figuras das quais discorda.
A crítica de Dugin sobre nossas noções contemporâneas de espírito e do divino e seu caminhar na direção do caos trata de um problema de simulação inautêntica e a letra morta do espírito e do divino, não sobre os dois em si.
Sua abordagem é ser verdadeiro em propósito, em fidelidade a revelações abertas, claras, que ele nomeia “caos”, de forma consciente e provocativa.
A linguagem de Dugin é conscientemente antinomiana para salvar o espírito das mãos dos “normies” e dá-lo ao heroi que pode pensar por si, em vez de reagir automaticamente por associação.
É claro, isso deixa uma série de possibilidades para qualquer um que queira associar Dugin ao mal, se quiser fazê-lo de má-fé.
Assim como na arte a tensão pode culminar em algo sublime, liberto mas integrante, sagrado, com sentido e propósito, assim também ocorre com a vida que é uma obra de arte, como é o caso do iniciado e seu trabalho.
A questão não é se Dugin é coerente em suas palavras, mas se ele parece representar uma força integrante e renovadora nos contextos que escolhe operar.
Aconselhar islãmicos sobre o que priorizar não é meu principal objetivo, mas deixe-me falar sobre a crítica de Upton nesse ponto também.
Dugin está ciente que a origem da Al-Qaeda, ISIS e do islamismo radical geral como forças operativas dos interesses americanos, e que o pano de fundo do 11 de Setembro é diferente das mentiras servidas na mídia e no discurso acadêmico.
Não obstante, no jogo de poder político, Dugin está disposto a usar as armas do inimigo contra ele mesmo se houver oportunidade. Eles fabricaram as mentiras e grupos baseados nelas, enquanto Dugin tenta criativamente jogar as mentiras de volta contra eles.
Se a ordem mundial unipolar é o inimigo, e eles buscam a vitória através da divisão e conquista, faz sentido que todo outro lado interessado pare de lutar uns contra os outros. Outras diferenças podem ser resolvidas depois da principal ameaça existencial.
Sobre o segundo ponto de Upton, Dugin reconhece que o homem ordinário contemporâneo está tão afastado de Deus, que falar Dele como uma presença imediata soará falso. As pessoas falam de Deus de uma posição conformidade e inércia.
Assim, você deve abordar as pessoas em seu grau horizontal e passional, para dali gradualmente reforçar a conexão vertical. O absoluto será primeiramente encontrado no particular que pode ser autenticamente amado.
Começando pelo volk particular, o Narod pode não parecer tão diferente do que Upton defende em The Shadow of the Rose, a visão romântica de um encontro com Deus na única mulher, excetuando-se que essa última opção só está disponível para o aristocrata.
Eu sempre fui repelido pela ideia de relação submissa a Deus. Essa pode não ser a abordagem de uma abordagem espiritualmente feminina, mas a mim parece gay.
Dugin é um idealista mágico; ideias como poder em conflito, onde o indivíduo absoluto, o magus, o profeta, o filósofo, o rei, servem o propósito de integração. Isso pode ser problemático para Upton e o Islã, mas não para mim.
Dugin acerta ao avaliar a guerra entre Rússia e EUA como inevitável, onde Ucrânia e Síria tiveram importante papel; uma guerra fria, e que esperamos jamais esquentar.
Com seu trabalho de preparação para este conflito, Dugin pode ter sido fundamental para que a Rússia mantenha sua posição. Seu propósito como figura pública é parcialmente alimentar o povo russo com a coragem e preparação para a guerra.
Os líderes ocidentais irresponsáveis parecem menos dispostos a provocar uma guerra nuclear aberta contra uma Rússia vista como louca e imprevisível. Eles mostravam mais tato diplomático com a União Soviética do que com os líderes russos de hoje.
Como Dugin afirma; para prevenir uma guerra, deve estar preparado para ela. A Rússia precisa tanto de meios adequados quanto a convicção para agir se quer sobreviver. Upton cita um antigo texto de Dugin, “Os cavaleiros templários do Proletariado” como se fosse uma posição atual, o que é parcialmente falso.
Parece haver um excesso de elementos titânicos no trabalho inicial de Dugin. Isso é esperado no período de iniciação heroica. A pergunta é se esses elementos titânicos foram ou serão suplantados no processo alquímico de desenvolvimento pessoal.
Para medir isso seria necessário julgar sua posição atual com boa fé, o que implica a leitura de Dugin em “À procura do Logos Sombrio”, “Noomaquia” e platonismo aberto, assim como sua interpretação da história e da luta entre Apollo e Dionísio contra Cibele e os Titãs.
Para aqueles que querem compreender a intuição de mundo atual de Dugin, suas palestras sobre a Noomaquia são um bom começo.
O caminho para o qual Dugin nos convida é material e espiritualmente arriscado. O caminho de Dionísio foi seguidamente pervertido no mundo antigo e falhou. O sonho da multipolaridade pode, por fim, falhar tanto quanto o Concerto da Europa. Mas o que é seguro hoje em dia?
Quaisquer perigos espirituais que ameaçam Dugin são os mesmos que ameaçam a mim, a todos nós. Eu ainda não consegui ler uma boa crítica a Dugin que mostre uma compreensão íntima de seu projeto, incluindo a critica de Charles Upton.
Uma compreensão íntima de alguém como Dugin é difícil, não só intelectualmente. Aqueles distantes em espírito serão repelidos pela distância, e os próximos serão repelidos pelo excesso de proximidade.
Os últimos talvez sejam a maior tragédia. Tanto os distantes quanto próximos dificilmente o lerão objetivamente. É triste ver um homem nobre como Upton, que respeito, com as melhores intenções, interpretar mal um grande homem.
Dugin tem sido central para mim nos últimos dez anos, e eu tento entender seu trabalho como um todo, além do contexto hermenêutico.
Entre outras influências cito Nietzsche, Platão, Heidegger, Guénon, Evola e o círculo de Moscou: Dzhemal, Golovin e Mamleev. Os cinco primeiros são centrais para a leitura de Dugin.
Como um jovem que lê muito e lê todos os tipos de escolas, isso ajuda na compreensão de um leitor voraz como Dugin. Mas uma chave mais importante é o sentido de existir num caminho singular, batalhando com os mesmos anjos, forjando um caráter existencial particular.
Eu me identifico com a posição do sujeito radical e a metafísica da dor descrita por Dugin em “À procura do Logos Sombrio”. A dor se torna um compasso na busca pela sustância existencial e intelectual necessária, que para mim, após longa jornada, me levou até Dugin.
Fonte: Twitter
Tradutor: Augusto Fleck