Arquitetado por Ariano Suassuna, em 1970, o Movimento Armorial tinha como principal premissa valorizar e difundir manifestações originais e profundamente nordestinas nos mais diversos campos da arte, criando uma obra, a um só tempo, popular e erudita.
Principal expoente do Movimento Armorial, o primeiro álbum do Quinteto Armorial foi lançado na época pelo selo independente Discos Marcus Pereira.
O texto a seguir foi escrito por Suassuna e publicado na contracapa do LP.
Iniciado oficialmente em 1970, o Movimento Armorial interessa-se por Cerâmica, Pintura, Tapeçaria, Gravura, Teatro, Escultura, Romance, Poesia e Música, sendo que estamos a ponto de tentar nossas primeiras experiências no campo do Cinema e no da Arquitetura.
No que se refere à Música, o trabalho do Quinteto Armorial é o que, na minha opinião, temos de mais importante, pois contamos com compositores que já estão dando o que falar, no campo da Música brasileira e erudita, de raízes nacionais e populares.
Sem se falar dos nossos dois grandes patronos de nome já firmado – Guerra Peixe e Capiba, aqui presentes neste disco – trata-se de gente como Antonio Carlos Nóbrega de Almeida, Jarbas Maciel, Egildo Vieira, e, sobretudo, esse extraordinário Antônio José Madureira, a meu ver a maior esperança da Música brasileira atual.
Assim como Gilvan Samico, partindo das xilogravuras da Literatura de Cordel, criou importância para a Cultura brasileira, o mesmo está fazendo Antônio José Madureira a partir dos cantadores do nosso Romanceiro Nordestino, dos toques de pífano, das violas e rabecas dos Cantadores – toques ásperos, “desafinados”, arcaicos, acerados como gumes de faca-de-ponta.
Foram os compositores armoriais que revalorizaram o pífano, a viola sertaneja, a guitarra ibérica, a rabeca e o marimbau nordestino, estranho e belo instrumento, de som áspero e monocórdio, lembrando – como a rabeca também – os instrumentos hindus ou árabes, estes últimos de presença tão marcante no nordeste, por causa da nossa herança ibérica.
Os músicos do Quinteto Armorial poderiam ter partido em busca de dois caminhos fáceis: limitar-se, por um lado, à boa execução convencional da Música europeia, tradicional ou “de vanguarda”, e procurar, por outro lado, o fácil sucesso popular, tocando, à sua maneira, “baiões” comerciais. Não o quiseram.
Convencidos de que a criação é muito mais importante do que a execução, preferiram a tarefa mais dura, mais ingrata, mais difícil e mais séria: a procura de uma composição nordestina renovadora, de uma Música erudita brasileira de raízes populares, de um som brasileiro, criado para um conjunto de câmera, apto a tocar a Música europeia, é claro – principalmente a ibérica mais antiga, tão importante para nós – mas principalmente apto a expressar o que a Cultura brasileira tem de singular, de próprio e de não europeu.
O Quinteto Armorial tem seu trabalho ligado ao Departamento de Extensão Cultural da Pré-Reitoria para Assuntos Comunitários da Universidade Federal de Pernambuco.
Faixas do disco “Quinteto Armorial – do romance ao galope nordestino”
1. Revoada (Antônio José Madureira)
2. Romance da Bela Infanta* (Romance ibérico do século XVI, recriado por Antônio José Madureira)
3. Mourão (Guerra Peixe)
4. Toada e Desafio (Capiba)
5. Ponteio Acutilado (Antônio Carlos Nóbrega de Almeida)
6. Repente (Antônio José Madureira)
7. Toré (Antônio José Madureira)
8. Excelência (Tema nordestino de canto fúnebre, recriado por Antônio José Madureira)
9. Bendito (Egildo Vieira)
10. Toada e Dobrado de Cavalhada (Antônio José Madureira)
11. Romance de Minervina* (Romance nordestino, provavelmente do século XIX, recriado por Antônio José Madureira)
12. Rasga (Antonio Carlos Nóbrega de Almeida)
*Tocadas com pífano e rabeca
Integrantes do Quinteto Armorial: Antônio José Madureira (viola sertaneja); Edilson Eulálio (violão); Fernando Torres Barbosa (marimbau nordestino); Egildo Vieira (pífano/flauta); Antonio Carlos Nóbrega de Almeida (rabeca/violino).
O marimbau e a rabeca usados pelo Quinteto Armorial foram fabricados e restaurados pelo artesão popular nordestino João Batista de Lima.
Capa: Gravura “Alexandrino e o Pássaro de Fogo”, de Gilvan Samico.