Uma das “modas” do pensamento contemporâneo, inclusive entre supostos “conservadores”, é o neorreacionarismo de Land, Yarvin e de outros “iluministas escuros”, o qual serve de ponto de contato entre o turbocapitalismo dos globalistas e os anseios pós-gênero e transumanistas dos progressistas.
A democracia liberal será substituída por uma monarquia neocameralista dirigida por um diretor-geral, o homem se funde com a máquina para se tornar um super-homem, a magia do tempo das bruxas dos Mares do Sul faz parte da realidade… esses são os conteúdos de um novo livro que provavelmente deixará perplexos muitos de seus leitores. Está escrito por um homem que frequentemente escreveu sob os efeitos das drogas e que se entusiasma com as possibilidades oferecidas pela tecnologia e pelo capitalismo, chegando até a querer impulsioná-las ao ponto de eliminar o homem como obstáculo para seu desenvolvimento.
Nos países anglo-saxões, é sem dúvida um dos mais hostis e demonizados do nosso tempo: o filósofo, transumanista e escritor britânico Nick Land (nascido em 17 de janeiro de 1962), geralmente considerado como o pai do aceleracionismo. Trata-se de uma corrente de filosofia política que, longe de querer desmantelar ou abolir o capitalismo, quer, pelo contrário, exacerbar e acelerá-lo para liberar o progresso, que parece ter estagnado (veja-se a tese de Francis Fukuyama sobre o fim da história) do peso do universalismo (liberal de esquerda) e impulsioná-lo para novas alturas. Até agora, as teses de Land não estavam disponíveis em alemão (nem em francês), exceto por artigos isolados em coleções publicadas pela editora pós-marxista Merve. Mas isso está prestes a mudar com o volume Okkultes Denken (Pensamento oculto), publicado por Matthes & Seitz em Berlim, que reúne artigos escritos pelo controverso britânico entre 1991 e 2019.
Ele percorre a interessante carreira de Land: originalmente discípulo de Heidegger (escreveu sua tese sobre o tratado de Heidegger de 1953 A linguagem no poema) Land evoluiu, sob a influência do místico marxista George Bataille, de membro do establishment liberal de esquerda na Universidade de Warwick, onde ensinou filosofia continental (isto é, todas aquelas correntes da filosofia europeia que evitam a filosofia analítica anglo-saxã) até que em 1998, em associação com a feminista Sadie Plant e outros pós-marxistas, se tornou pela primeira vez um pregador do cyborg-super-humano-máquina como parte da CCRU (Unidade de Pesquisa da Cultura Cibernética).
Como parte desse grupo, Land não só realizava performances saturadas de drogas como parte dos discursos (uma vez rolou pelo palco possuído pelo “espírito de uma serpente”), mas também misturava ocultismo, ficção científica, cibernética e a esquizoanálise feminista de Deleuze e Guattari em uma singular amálgama. Graças ao que se conhece como hiperstição, supõe-se que seus textos fazem aparecer e falar na realidade entidades fictícias como os Deuses Antigos do universo aterrorizante de Lovecraft e a magia temporal lemuriana.
Qualquer um que esteja lendo isto e sorrindo ou pensando para si mesmo não deve esquecer que essa loucura faz parte da crítica de Land à filosofia e à razão ocidentais, às quais ele despreza profundamente, assim como toda forma de transcendência. Como outros promotores do movimento da “ontologia orientada ao objeto” e do realismo especulativo que ele inspirou, parte da ideia de Immanuel Kant da coisa-em-si, dos númenos, dos objetos que existem fora de nossa percepção, e rejeita toda ideia de Deus, a quem critica como mecanismo de controle do homem. Os monstros e objetos evocados por Land não estão explicitamente a serviço do homem, mas sim o desconstroem para dar lugar a outro mundo, o tecnocosmo, no qual nada é dado, mas tudo é produzido.
O pensamento ocultista do filósofo britânico não segue uma corrente de pensamento totalmente nova, mas prolonga o “Iluminismo escuro” definida pelo autoritarismo e pela desigualdade, da qual considera antepassado Thomas Hobbes. Liberdade e democracia são incompatíveis: esta é a fórmula básica do pensamento que Nick Land desenvolveu com o filósofo e desenvolvedor de software americano Curtis Yarvin (também conhecido como Mencius Moldbug) e seu movimento “neorreação” (NRx). Dado que a democracia se autodestrói pela corrupção que lhe é inerente, Land propõe a instauração de uma monarquia neocameralista, com acionistas e dirigida por um diretor-geral como se fosse uma empresa.
Por fim, o hiperracismo de Land consiste em um ataque frontal à ideologia liberal de esquerda e à sua obsessão pela igualdade por parte desse excêntrico britânico radicado em Xangai, que defende a melhoria dos seres humanos por meio da manipulação do DNA e das técnicas biônicas, como resultado das quais não haverá mais brancos, alemães ou europeus, mas apenas homens com tentáculos faciais. O livro de Nick Land é, portanto, um exemplo interessante de como podemos continuar pensando o pós-modernismo enfatizando o lado negro do Iluminismo e levando o ocultismo do Ocidente a um final abismal. Como patriotas, no entanto, devemos estar cientes de que no final desta linha de pensamento, não há um retorno à tradição como na obra de Aleksandr Dugin, mas um mundo onde os demônios reinam supremos.
Fonte: Euro-Synergies