Como todos sabem, no último final de semana, tentou-se um golpe de Estado na República Democrática do Congo, com uma invasão do palácio presidencial por homens armados liderados por um Christian Malanga. O presidente não estava no palácio, e apesar dos vídeos de TikTok do grupo rebelde, os militares congoleses rapidamente suprimiram a tentativa, capturando a maioria e matando o líder.
Mas há muitos outros detalhes interessantes no caso.
Apenas inicialmente, chama a atenção o fato de que apesar do que pode parecer à primeira vista, não se trata de uma tentativa de golpe militar. Malanga não era militar da ativa e não há indício de que qualquer um de seus homens fosse militar. Eles, ademais, eram acompanhados por um grupo de mercenários ocidentais, que pareciam ser liderados por um Benjamin Reuben-Zalman, de origem israelo-americana.
A partir daí, túneis de possibilidades e conexões vão se abrindo.
A figura de Christian Malanga chama a atenção por suas conexões internacionais. De origens razoavelmente irrelevantes, Malanga foi morar nos EUA como refugiado ainda na adolescência e lá recebeu parte de sua educação. Anos depois, ele funda uma ONG (Friends of America) e retorna ao Congo para prestar serviço militar e abre uma empresa; então tenta a sorte como político, mas fracassa e recusa um cargo governamental.
Ele então retorna para os EUA, onde funda um partido político congolês…sediado e registrado apenas nos EUA. A partir daí, a sua carreira é meteórica e alcanças os pináculos do poder nos EUA e na Europa. Malanga, que deseja restaurar o Zaire, começa a frequentar os circuitos das ONGs e cúpulas internacionais.
Ela começa como embaixador na “Mesa da Liberdade Religiosa Internacional”, um evento de um conglomerado de ONGs religiosas ligadas ao Partido Republicano que atua para a proliferação do neopentecostalismo dispensacionalista e que faz lóbi contra países que tentam barrar a invasão ou expansão neopentecostal.
Daí, ele é selecionado para o “Programa de Líderes Africanos”, sendo enviado para a Geórgia, onde ele é treinado nos temas de “anticorrupção”, “privatizações”, “austeridade fiscal” e outros temas semelhantes. Curiosamente, a sua esposa Lucile Malanga estaria vivendo ainda na Geórgia.
O elemento, então, repentinamente se declara o Presidente-em-Exílio da República do Zaire, em 2017, e começa a se articular. Ele aparece em muitas entrevistas e artigos de mídias ocidentais, sempre que elas querem começar sobre o Congo, especialmente quando da vitória eleitoral de Félix Tshisekedi – até mesmo no Financial Times! Nesses artigos, Malanga acusa a Rússia de estar assumindo o controle sobre o Congo.
É interessante, porém, que desde 2021 a mídia patriótica suazilandesa/essuatini denuncia os vínculos entre Christian Malanga e a Fundação Príncipe Sicalo, uma ONG criada pelo Ministro da Defesa de Essuatini (antiga Suazilândia), o Príncipe Sicalo. Malanga seria um dos principais financiadores da Fundação, em uma relação que seria para mútuo benefício. Sicalo acreditava que o Rei Mswati III morreria em breve, e queria um exército privado para garantir o próprio trono – com mercenários recrutados por Malanga, do mundo todo.
Esses mercenários acumulados em Essuatini, por sua vez, seriam eventualmente usados por Malanga para tomar o poder no Congo. Isso é comentário em Essuatini desde 2021, como eu falei. E de fato veio a acontecer agora.
Agora bem, aí entram conexões econômicas mais profundas que conduzem bastante longe. Porque Malanga e Ben Reuben eram sócios de empresas de mineração na própria Essuatini e também no Moçambique, onde eles estariam operando essas empresas (as quais, revelou-se, não teriam licença ou autorização).
O fio da mineração, porém, vai se estendendo até o homem mais rico do Congo, o bilionário israelense dos diamantes, Dan Gertler. Ex-traficante de diamantes atuando na Guerra Civil da Libéria, Gertler chegou ao Congo durante o governo de Kabila prometendo armas em troca do monopólio sobre as exportações de diamante do país.
Como senhor dos diamantes no Congo, Gertler usava trabalho escravo, inclusive infantil, e intermediava o acesso de multinacionais mineradoras estrangeiras às riquezas minerais do Congo. De fato, alguns relatos colocam Gertler como controlando 12% do mercado mundial de cobalto. No Congo, Gertler também controlava a maior parte da extração do petróleo.
Assim que Kabila foi derrotado por Félix Tshisekedi, atual Presidente da RDC, porém, Gertler começou a ter problemas no país. Aparentemente, o Presidente Tshisekedi queria retomar pelo menos parte das riquezas e recursos expropriados do país.
É importante ressaltar que Tshisekedi se aproximou imediatamente da Rússia e está utilizando combatentes do Grupo Wagner para finalmente liquidar as insurgências separatistas e rebeldes que ainda atuam em seu país, incluindo uma versão local do ISIS.
É assim que, em 2019, Yossi Cohen, Diretor do Mossad, visita o Congo 3 vezes, acompanhado de Dan Gertler. Não se sabe o que ele foi tratar, mas na terceira vez Cohen é expulso e deportado do Congo por ordem de Tshisekedi. Mas ressalta-se que na segunda visita de Cohen ao Congo, um avião presidencial explodiu, matando vários funcionários e assessores de Tshisekedi, que havia embarcado em um outro avião.
Recentemente emergiu a informação de que Tshisekedi havia feito um acordo com Gertler por meio do qual o Congo receberia de volta 2 bilhões de dólares, além de inúmeras propriedades e direitos, o que inclui campos de petróleo e pelo menos parte de suas minas. Esse acordo, claramente, não deve ter sido do agrado de Gertler. Não se devolve tamanhos montantes de dinheiro e propriedades de livre e espontânea vontade.
Assim, talvez não seja casual que Malanga foi filmado há alguns meses em Israel, acompanhado de soldados das FDI sionistas com Benjamin Reuben, o mercenário -que segundo algumas fontes não confirmadas havia, no passado, trabalhado para Cohen e Gertler.
Malanga, que está morto, provavelmente conseguiu o financiador de sua aventura militar em Gertler e em Israel, que também deve ter sido uma das principais fontes de mercenários de sua empreitada. Não funcionou.