A Questão Palestina: Precisões Necessárias

A questão palestina não é uma disputa abstrata entre duas narrativas equivalentes: é a história concreta de um povo privado de sua terra, de seus direitos e da possibilidade de autodeterminação.

Introdução

O texto de Roberto Giuliani, intitulado O Lar Judeu – National Home, apresenta-se como uma contribuição para a compreensão da “questão palestina” através de um resumo histórico sobre o nascimento de Israel e suas consequências. No entanto, desde as primeiras linhas, emerge claramente uma abordagem que privilegia de forma nítida a perspectiva judaico-sionista, minimizando ou ignorando elementos fundamentais da narrativa e da experiência palestina.

Não se trata apenas de um problema de posicionamento político. Toda reconstrução histórica implica escolhas interpretativas, mas o que chama a atenção no texto de Giuliani é o uso de simplificações, anacronismos e omissões que acabam por deformar o quadro geral. A história da Palestina e de Israel é uma das mais intrincadas e controversas do século XX, e justamente por isso exige rigor metodológico, equilíbrio e a capacidade de reunir múltiplas vozes, frequentemente conflitantes entre si. Quando, porém, a narrativa se reduz a uma única perspectiva, o risco é duplo: por um lado, oferece ao leitor um relato que pode parecer autorizado, mas que se mostra parcial; por outro, contribui para consolidar estereótipos que tiveram – e continuam a ter – consequências políticas e humanas dramáticas.

A questão palestina não é uma disputa abstrata entre duas narrativas equivalentes: é a história concreta de um povo privado de sua terra, de seus direitos e da possibilidade de autodeterminação. Ignorar ou marginalizar esta dimensão significa esvaziar o conflito de seu cerne pulsante. Uma leitura equilibrada deveria levar em conta ambas as dimensões, sem apagar uma em benefício da outra.

A réplica que se segue pretende abordar ponto por ponto as afirmações de Giuliani, reproduzindo as passagens centrais de seu texto e confrontando-as com os consensos da pesquisa histórica e com uma perspectiva que inclua, finalmente, também a voz palestina, demasiadas vezes relegada às margens. O objetivo não é substituir uma narrativa por outra, mas restaurar a complexidade a uma história que não pode ser compreendida senão em sua integralidade, com todas as suas contradições e suas feridas ainda abertas.

As entidades estatais antes do Antigo Israel

Giuliani escreve: «até a chegada dos judeus naquelas terras nunca existiu antes alguma entidade de tipo estatal independente».

Esta afirmação é problemática e redutora. A pesquisa histórica e arqueológica mostra que a Palestina pré-israelita não era de modo algum um território desprovido de organização política. Já na Idade do Bronze Antigo (III-II milênio a.C.) existiam cidades-Estado florescentes como Hazor, Megido, Laquis e Bet-Seã, dotadas de muralhas monumentais, sistemas de irrigação, armazéns para estocagem, templos e palácios reais. Hazor, por exemplo, era um importante centro político e econômico que controlava as rotas comerciais entre Egito, Síria e Mesopotâmia. As cartas de Amarna (século XIV a.C.), correspondência diplomática entre os faraós egípcios e os reis cananeus, mostram-nos uma rede intrincada de cidades governadas por soberanos locais, com relações de vassalagem e aliança, capazes de negociar, guerrear e comerciar.

Quando os israelitas se estabeleceram nas montanhas da Palestina, por volta dos séculos XII-XI a.C., não entraram num “vácuo de poder”, mas numa região já estruturada, com culturas complexas e centros urbanos consolidados. Os reinos de Israel e Judá próprios surgiram dentro desta realidade, herdando formas administrativas e culturais dos cananeus. Até o templo de Salomão em Jerusalém apresenta fortes influências arquitetônicas fenícias.

Dizer que não existiu nada antes da chegada dos judeus significa, portanto, apagar séculos de história cananeia, filisteia, fenícia e arameia. A Palestina sempre foi um cruzamento de civilizações: os egípcios conduziram campanhas militares lá já no II milênio a.C., os micênios levaram artefatos e tecnologias, os povos do mar estabeleceram-se ao longo da costa, fundando cidades como Gaza e Ascalão.

A afirmação de Giuliani não é, portanto, apenas imprecisa do ponto de vista histórico: tem também um peso político, porque retoma implicitamente a fórmula sionista da Palestina como “terra sem povo para um povo sem terra”. Na realidade, aquela terra sempre foi habitada, povoada por comunidades organizadas, em relação com os grandes impérios circunvizinhos, e jamais redutível a um espaço vazio à espera da chegada de Israel.

A diáspora e o “retorno”

Giuliani afirma: «Aos judeus não restou senão recolher-se na meditação das leis mosaicas e Israel não abandonou a esperança de uma restauração de Sião […] sonhando o RETORNO».

Esta afirmação mistura dimensões diferentes e arrisca deturpar a perspectiva histórica. É verdade que após a destruição do Segundo Templo (70 d.C.) e a revolta de Bar Kokhba (132–135 d.C.) a vida judaica se reorganizou em torno da Torá e da tradição rabínica, e que o vínculo simbólico com Jerusalém permaneceu fortíssimo. Mas não é verdade que desde então os judeus tenham cultivado, no sentido político, um projeto de “retorno em massa” à Terra de Israel.

A tradição rabínica, codificada no Talmude, aliás, o proíbe. No tratado Ketubot 111a, os mestres falam dos Três Juramentos que Deus teria imposto ao povo judeu após o exílio: a proibição de subir “como um muro”, isto é, em massa, para a Terra de Israel; a proibição de rebelar-se contra as nações; e, em paralelo, o compromisso imposto às próprias nações de não oprimir excessivamente Israel.

Estes juramentos foram interpretados como uma clara proibição religiosa de forçar o fim do exílio e de reconstituir com meios humanos, e muito menos militares, um Estado judeu antes do advento do Messias. Por outras palavras, o exílio não era uma condição a ser quebrada com iniciativas políticas, mas uma fase providencial da história, a ser aceita até a redenção escatológica.

Justamente por isso, a ideia moderna de retorno, entendida como assentamento coletivo e político, é uma criação oitocentista do sionismo, nascida no seio dos nacionalismos europeus. Os fundadores do movimento sionista, de Herzl em diante, transformaram um símbolo religioso num projeto político e territorial, rompendo com séculos de interpretação rabínica.

Não por acaso, ainda hoje importantes correntes do judaísmo ortodoxo consideram ilegítimo o Estado de Israel. O rabino Yoel Teitelbaum, guia da dinastia hassídica Satmar, escreveu em 1961 a obra Vayoel Moshe, na qual reiterava que a fundação do Estado judeu antes do Messias representava uma violação dos Três Juramentos e um pecado grave. Segundo Teitelbaum, o Estado de Israel não só não tinha base teológica, como era causa de novas desgraças para os judeus.

Na mesma linha posicionam-se os grupos ultraortodoxos Neturei Karta, que ainda hoje participam em manifestações internacionais ao lado de palestinos e ativistas pró-palestinos, agitando cartazes com os dizeres “Judaism rejects Zionism” ou “We are Jews, not Zionists”. Eles distinguem nitidamente entre o judaísmo como religião e o sionismo, que consideram uma ideologia política moderna incompatível com a Torá. Para estes grupos, o verdadeiro “retorno a Sião” não pode ser obra de governos e de exércitos, mas ocorrerá somente com a vinda do Messias.

Apresentar, pois, a vicissitude como uma linha reta que vai da antiguidade a 1948, como faz Giuliani, significa simplificar e deformar a realidade histórica. A história da diáspora foi uma história de adaptações, integrações e convivências em muitas partes do mundo: da Espanha medieval ao Iêmen, da Polônia ao Marrocos. A ideia de um retorno político e coletivo não pertencia à tradição judaica até o século XIX: é o sionismo que, apropriando-se de símbolos religiosos, os transformou num projeto político e territorial.

A expulsão após 70-135 d.C.

Giuliani fala de «repressão, expulsões em massa e banimento dos judeus de Jerusalém, agora destruída» como causa da diáspora.

Esta imagem, muito difundida na historiografia tradicional, é hoje posta em discussão. Não houve, de fato, uma expulsão total do povo judeu da Palestina. Após a destruição do Segundo Templo em 70 e a revolta de Bar Kokhba em 135, é verdade que os judeus foram excluídos de Jerusalém – redenominada Aelia Capitolina pelo imperador Adriano –, mas numerosas comunidades continuaram a viver na Galileia, na Judeia e nas áreas rurais. Fontes rabínicas atestam o florescimento de centros de estudo como Tiberíades, Seforis e Cesareia.

A diáspora, portanto, foi um processo gradual, não uma deportação total. Uma parte consistente da população permaneceu no local e, com o passar dos séculos, converteu-se primeiro ao cristianismo bizantino, depois ao Islã após a conquista árabe do século VII. Isto leva a uma consequência de grande relevo: os palestinos contemporâneos não são “estranhos” à história antiga da região, mas poderiam ser, em parte, os descendentes diretos dela.

Não se trata de uma hipótese ideológica, mas de uma ideia reconhecida também por importantes líderes sionistas. Já em 1918, David Ben Gurion e Itzhak Ben-Zvi publicaram em iídiche um folheto intitulado Eretz Israel in the Past and Present, onde sustentavam que os fellahin palestinos eram em grande parte os descendentes dos judeus que permaneceram na terra após a época romana e gradualmente se converteram. Escreviam:

“Os árabes do campo não são outros senão os restos dos antigos habitantes judeus da terra, que no decorrer dos séculos se converteram ao Islã.”

Ben-Zvi voltou a este tema nos anos 30 e 40. No seu livro Sha‘ar ha-Yishuv (A Porta do Assentamento Judeu), publicado em 1929 e depois várias vezes reeditado, reiterava que a população rural palestina conservava “traços linguísticos, culturais e até físicos” de uma origem judaica. Ele citava em particular as vilas das montanhas de Hebron como comunidades que poderiam ser consideradas herdeiras diretas dos judeus antigos.

Também o historiador judeu Yitzhak Baer sublinhava que, no decorrer dos séculos, “as populações judaicas nunca desapareceram por completo da Palestina, mas fundiram-se com os recém-chegados, deixando traços de continuidade”.

Esta consciência estava presente no sionismo das origens: alguns pioneiros viam nos camponeses palestinos uma espécie de “irmãos perdidos”, a serem reconduzidos à consciência judaica. Posteriormente, porém, a narrativa oficial do movimento sionista mudou radicalmente, preferindo insistir na rutura histórica e na ideia de que os árabes seriam “imigrantes” relativamente recentes, a fim de reforçar a legitimidade exclusiva da colonização judaica.

Reduzir, pois, a diáspora a uma “expulsão total e absoluta”, como faz Giuliani, não é apenas historicamente incorreto: é também funcional para negar a continuidade histórica da população local. Se se admite, como fizeram Ben Gurion e Ben-Zvi, que os palestinos são em grande parte descendentes dos judeus que permaneceram no local, torna-se difícil sustentar que eles sejam um corpo estranho, desprovido de raízes históricas na Palestina.

Os árabes como “imigrantes recentes”

Giuliani sustenta: «Neste período [otomano] houve uma conspícua imigração de populações árabes e/ou arabizadas, que se sobrepuseram às preexistentes».

Esta afirmação retoma uma tese difundida em certa literatura filosionista, segundo a qual os palestinos seriam na sua maioria fruto de ondas migratórias recentes e, portanto, desprovidos de um enraizamento histórico na Palestina. Trata-se, porém, de uma simplificação que não encontra respaldo nas fontes históricas.

É verdade que sob o Império Otomano, como em qualquer contexto imperial, houve movimentos de população: drusos provenientes do Líbano, circassianos fugidos do Cáucaso, armênios sobreviventes dos massacres turcos, e também árabes atraídos pelas oportunidades econômicas. No entanto, a grande maioria da população da Palestina otomana era constituída por camponeses árabes, os fellahin, enraizados há séculos na mesma terra. A “imigração” oitocentista foi, pois, um fenômeno marginal em relação à continuidade de fundo.

A narrativa de uma Palestina “esvaziada” e depois “repovoada” é funcional ao mito sionista da terra sem povo para um povo sem terra. Na realidade, os censos otomanos e as fontes de viagem europeias do século XIX descrevem uma região habitada, cultivada, pontilhada de vilarejos. O próprio rabino Yehiel Michel Pines, enviado a Jerusalém em 1878 pela Hovevei Zion (Associação dos Amantes de Sião), escrevia que “a terra é habitada por numerosos árabes, e não há um lugar livre que possa acolher colônias sem comprar terrenos já ocupados”.

Se se aceita, além disso, a argumentação – já recordada anteriormente – reconhecida pelos próprios chefes sionistas David Ben Gurion e Itzhak Ben-Zvi nos anos 20 e 30, segundo a qual os fellahin palestinos eram em grande parte os descendentes dos judeus antigos que permaneceram no local e se converteram com o tempo, então a contraposição entre “judeus autóctones” e “árabes imigrantes” desaba por completo. Nessa perspectiva, os palestinos não aparecem como um corpo estranho surgido no último momento, mas como a continuidade viva da população histórica da Palestina.

Negar este enraizamento significa construir um relato funcional para justificar a ideia de que os árabes não teriam “direitos históricos” sobre a terra. Mas as pesquisas históricas, arqueológicas e até genéticas mostram hoje um quadro diferente: um tecido demográfico que, ainda que mudando de religião e língua ao longo dos séculos, mantém fortes elementos de continuidade com as populações antigas da região.

Portanto, a imagem proposta por Giuliani, de uma “sobreposição recente” que quase torna os palestinos hóspedes tardios, não só é incorreta do ponto de vista histórico, como contribui para perpetuar uma visão ideológica que nega a legitimidade de uma presença enraizada e plurissecular.

A Declaração Balfour

Giuliani escreve: «Iniciava-se assim a colaboração do Reino Unido com o movimento sionista, criando os pressupostos para a formação de uma entidade pré-estatal judaica na Palestina. Em suma, deu legitimidade à migração de judeus naquelas terras».

Esta interpretação negligencia aspectos fundamentais. A Declaração Balfour de 2 de novembro de 1917, endereçada pelo ministro das Relações Exteriores britânico Arthur James Balfour a Lord Rothschild, chefe da comunidade judaica britânica, não tinha nenhum valor jurídico. Em 1917 a Palestina ainda fazia parte do Império Otomano, e a Grã-Bretanha não tinha nenhuma soberania sobre aqueles territórios. Tratou-se de uma promessa unilateral, formulada num contexto colonial, funcional aos interesses britânicos na partilha do Império Otomano após a guerra.

A declaração deve ser lida em conjunto com os outros acordos paralelos: o acordo Sykes-Picot de 1916, que previa a divisão do Oriente Médio entre França e Grã-Bretanha, e as cartas Hussein-McMahon de 1915-16, nas quais Londres prometia aos árabes a independência se se rebelassem contra os turcos. Por outras palavras, os britânicos prometeram a mesma terra a mais de um interlocutor, gerando contradições destinadas a explodir.

O texto rezava que o governo britânico «encara com favor o estabelecimento na Palestina de um lar nacional para o povo judeu, ficando claramente entendido que nada será feito que possa prejudicar os direitos civis e religiosos das comunidades não judaicas existentes na Palestina». A ambiguidade era evidente: por um lado, a expressão “lar nacional” (national home) não equivalia a “Estado”; por outro, os direitos reconhecidos às comunidades não judaicas eram apenas civis e religiosos, não políticos. Na prática, a Declaração concedia direitos políticos a uma minoria judaica internacional, mas negava a legitimidade política da maioria árabe, que constituía cerca de 90% da população.

Não surpreende, portanto, que a Declaração suscitasse desde logo uma oposição duríssima entre os chefes árabes e palestinos, que a perceberam como uma traição das promessas de independência e como um ato de expropriação política. Já no Congresso Árabe de Damasco de 1919, os delegados provenientes da Síria histórica (que compreendia então também a Palestina) declararam inaceitável a Declaração Balfour, afirmando que a Palestina era parte integrante da grande Nação árabe e que a vontade da sua população não podia ser ignorada.

As tensões explodiram logo no terreno. Em 1920, durante as celebrações de Nabi Musa em Jerusalém, manifestações árabes transformaram-se em confrontos violentos contra a comunidade judaica, com dezenas de mortos e feridos. Aquelas revoltas foram a primeira expressão de uma resistência popular contra a aplicação prática da Declaração Balfour, que os palestinos percebiam como o início de um processo de colonização sustentado pela administração britânica.

A passagem de promessa a instrumento legal ocorreu alguns anos depois: em 1922, com o Mandato britânico sobre a Palestina, a Declaração Balfour foi incorporada integralmente no texto aprovado pela Sociedade das Nações. Um ato que originalmente não tinha nenhum valor jurídico tornou-se assim parte do direito internacional, institucionalizando o apoio ao projeto sionista e relegando a população árabe a uma condição subalterna.

Falar, pois, de uma Declaração que “deu legitimidade à migração judaica” significa deturpar a sua natureza. Mais do que legitimidade, ela representou um ato de imperialismo colonial: uma potência europeia prometia a um movimento político internacional uma terra habitada por outro povo, sem que este último fosse minimamente consultado.

O Plano de Partição da ONU de 1947

Giuliani sustenta: «A elite palestina e a Liga Árabe recusaram a deliberação e responderam com uma guerra de agressão contra Israel».

Esta formulação é enganadora porque descontextualiza a recusa palestina e árabe, apresentando-a como uma escolha irracional ou ditada por ódio ideológico. Na realidade, a Resolução 181 da Assembleia Geral das Nações Unidas, aprovada em 29 de novembro de 1947, previa a divisão da Palestina mandatária em dois Estados, um judeu e um árabo, com Jerusalém colocada sob administração internacional. Mas a repartição era profundamente desequilibrada: 56% do território iria para o Estado judeu, embora os judeus representassem cerca de um terço da população e fossem proprietários, segundo os dados oficiais britânicos de 1945, de apenas 6-7% das terras.

Não era apenas uma questão de proporções, mas de qualidade do território. Ao Estado judeu eram atribuídas áreas estratégicas e férteis: a planície costeira, o Vale de Jezreel, parte da Galileia, ou seja, as melhores zonas para agricultura e infraestruturas. Ao Estado árabe, por sua vez, restariam territórios fragmentados, menos férteis e desprovidos de continuidade geográfica. Na prática, a população árabe, que constituía a maioria absoluta, via reconhecida uma soberania fraca sobre um mosaico de áreas residuais.

Não surpreende, pois, que os palestinos tenham percebido a proposta como radicalmente iníqua. Falar simplesmente de “recusa” obscurece o fato de que a maioria árabe foi privada do direito à autodeterminação sobre uma terra na qual constituía a parte preponderante da população. Para muitos palestinos, a Resolução 181 representava não uma solução de compromisso, mas uma forma de expropriação política, sancionada pelas potências internacionais.

Há depois um outro elemento frequentemente esquecido: o próprio UNSCOP (Comitê Especial das Nações Unidas sobre a Palestina), encarregado de elaborar uma proposta, tinha discutido duas opções. Além do plano de partição, aprovado pela maioria dos membros, havia uma proposta de minoria que previa a criação de um único Estado federal, com amplas autonomias para as duas comunidades, capital compartilhada em Jerusalém e imigração judaica regulada de modo a não alterar drasticamente o equilíbrio demográfico. Era um modelo mais inclusivo, que procurava levar em conta tanto as aspirações judaicas quanto as árabes.

Esta solução foi, porém, rejeitada pelo movimento sionista, que não estava disposto a aceitar uma soberania compartilhada ou uma realidade binacional. Para os dirigentes sionistas, o objetivo central era a criação de um Estado judeu independente com uma maioria demográfica judaica: um compromisso federal não satisfaria tal condição.

À luz destes elementos, a recusa árabe do plano da ONU não aparece como um ato de “agressão gratuita”, mas como a reação a uma proposta percebida como profundamente injusta, imposta de fora e favorável a uma minoria recém-instalada em grande parte através da imigração recente. Neste contexto, explodiu a guerra de 1947-48: para os israelenses foi a “guerra de independência”, para os palestinos a Nakba, a “catástrofe”, marcada pela expulsão de cerca de 700.000 pessoas de suas casas.

Reduzir tudo a uma recusa “irracional” e a uma “guerra de agressão” significa apagar a complexidade do momento histórico e negar a legitimidade das reivindicações palestinas, que pediam simplesmente o que naqueles anos era reconhecido a outros povos colonizados: o direito à autodeterminação e à soberania sobre seu próprio território.

As guerras subsequentes

Giuliani escreve: «Seguiram-se outras guerras de agressão, intifadas e atentados contra o Estado judeu».

Esta formulação, extremamente genérica, nivela vicissitudes históricas muito diversas entre si e, sobretudo, apaga as responsabilidades israelenses, apresentando o conflito como uma sequência de ataques unilaterais sofridos por Israel.

A guerra de 1948, por exemplo, não foi simplesmente uma “guerra de agressão”. Para Israel representou o nascimento do Estado judeu, mas para os palestinos foi a Nakba, a “catástrofe”: cerca de 700.000 pessoas foram expulsas ou forçadas a fugir de suas casas, e até hoje a elas e a seus descendentes é negado o direito de retorno. Falar apenas de agressão árabe significa ignorar a expulsão sistemática de populações civis e a destruição de centenas de vilarejos palestinos.

Analogamente, dizer que em 1967 os Estados árabes queriam destruir Israel é simplesmente falso. A Guerra dos Seis Dias não pode ser interpretada como uma tentativa árabe de aniquilar o Estado judeu. O próprio Moshe Dayan, ministro da Defesa israelense na época, admitiu anos depois que boa parte das tensões com a Síria não eram fruto de uma estratégia agressiva de Damasco, mas sim de provocações deliberadas por parte israelense. Numa entrevista confidencial concedida ao jornalista Rami Tal em 1976, tornada pública somente em 1997, Dayan contou que cerca de 80% dos confrontos ao longo da fronteira com a Síria tinham sido “iniciados intencionalmente por Israel”. O exército, explicou, costumava enviar tratores para trabalhar nas zonas desmilitarizadas, sabendo que os sírios reagiriam. Se os sírios não atiravam de imediato, os tratores eram empurrados ainda mais para a frente até provocar o fogo sírio. A essa altura Israel replicava com artilharia e aviação, apresentando a reação síria como um ato de agressão.

O próprio Dayan definiu esta prática como um expediente calculado, visando criar o casus belli que permitisse a Israel intervir com a legitimidade aparente de quem “se defende”. É neste contexto que amadureceu a Guerra dos Seis Dias, a qual, longe de ser uma reação a um perigo existencial, foi o resultado de uma escolha política precisa: aproveitar a ocasião para conquistar territórios estratégicos. Em seis dias Israel ocupou Gaza, a Cisjordânia, Jerusalém Oriental, o Sinai e os Altos do Golã. Essa expansão militar modificou para sempre a geografia do conflito e lançou as bases para a atual situação de ocupação e colonização, que Israel nunca interrompeu de fato.

Neste quadro, a decisão de Nasser de fechar o Estreito de Tirã não foi o início de um plano de extermínio, mas a reação a uma escalada de pressões e provocações israelenses. Uma jogada talvez arriscada, mas que respondia a uma dinâmica de tensões já alimentadas por Israel ao longo das fronteiras setentrionais.

A guerra de 1973, conhecida como Guerra do Yom Kippur, é outro exemplo de como a fórmula “agressão árabe” simplifica a realidade. Egito e Síria atacaram não para destruir Israel, mas para reconquistar os territórios perdidos em 1967. Foi um conflito dramático, mas não uma tentativa de apagar o Estado judeu dos mapas, como frequentemente é narrado.

Falar genericamente de “guerras de agressão” significa, pois, obscurecer a complexidade destes conflitos e isentar de responsabilidade Israel, que não foi um ator passivo vítima dos acontecimentos, mas, ao contrário, tomou decisões políticas e militares precisas, frequentemente orientadas para consolidar e ampliar seu controle territorial.

Os Acordos de paz

Giuliani conclui afirmando: «apesar de várias tentativas de chegar a acordos (Oslo 1 e 2, acordos de Abraão), todos descumpridos, em particular pela parte palestina».

Esta é uma leitura que inverte a realidade, porque reduz a complexidade das negociações a uma presumida incapacidade palestina de respeitar os compromissos, ignorando o que acontecia no terreno.

Os Acordos de Oslo, assinados em 1993-95, foram acolhidos como uma guinada histórica, mas enquanto em Washington se celebrava a “paz”, nos Territórios Ocupados Israel continuava a expandir os assentamentos. Em 1993 os colonos na Cisjordânia e Gaza eram cerca de 110.000; três anos depois, no final da temporada de Oslo, já tinham subido para 150.000. Este dado por si só revela a contradição: negociava-se o futuro de um Estado palestino enquanto, paralelamente, consolidava-se no terreno uma realidade que o tornava cada vez mais inviável.

Yitzhak Rabin, o homem que assinou Oslo e que frequentemente é lembrado como “o premier da paz”, foi explícito em seus discursos: aos palestinos, disse, seria concedido “algo menos que um Estado”. Não soberania plena, não controle das fronteiras, não direito de retorno dos refugiados, mas uma entidade reduzida, submetida ao controle militar e econômico israelense. Em seus últimos discursos no Knesset, antes de ser assassinado, Rabin falou de uma “autonomia estendida” e não de um Estado soberano: as palavras, hoje, pesam quanto aos fatos.

A mesma lógica reapareceu em Camp David em 2000, quando Ehud Barak propôs aos palestinos um “pacote generoso” que, porém, nos detalhes, configurava um arquipélago de cantões separados, desprovidos de continuidade territorial, com Israel a manter o controle das fronteiras, do espaço aéreo e dos recursos hídricos. Não surpreende que os palestinos o tenham rejeitado: não era o nascimento de um Estado, mas a formalização de um sistema de dependência. Também o plano Olmert de 2008, embora mais amplo nas concessões, mantinha esta assimetria: em troca do reconhecimento dos assentamentos israelenses nas áreas mais férteis e estratégicas da Cisjordânia, aos palestinos eram oferecidas porções de deserto no Neguev.

Nos anos subsequentes, a máscara caiu por completo. Benjamin Netanyahu declarou várias vezes, sem ambiguidades, que nunca permitirá o nascimento de um Estado palestino. Face a estas posições, imputar o fracasso das negociações aos palestinos não é apenas parcial: significa ocultar o dado estrutural, ou seja, que Israel usou os processos de paz não para pôr fim à ocupação, mas para geri-la de modo mais aceitável aos olhos da comunidade internacional.

Os Acordos de Abraão de 2020, por fim, confirmaram esta lógica: normalização das relações entre Israel e vários países árabes sem que a questão palestina fosse resolvida. De fato, os palestinos foram excluídos da mesa, transformados numa variável secundária no jogo geopolítico regional.

Atribuir, como faz Giuliani, a culpa do fracasso dos acordos de paz aos palestinos significa não ver o que é evidente: a solução do conflito nunca foi praticável porque Israel continuou a agir como potência ocupante, consolidando uma realidade na qual o Estado palestino nunca foi uma perspetiva concreta, mas apenas uma ficção útil para ganhar tempo e legitimidade internacional.

Conclusão

O texto de Giuliani, apesar de suas intenções divulgativas, não restitui a complexidade da questão israelo-palestina. Suas páginas tendem a propor como verdades consolidadas afirmações que a pesquisa histórica hoje considera controversas, omitem elementos fundamentais da narrativa palestina e acabam por atribuir unilateralmente as responsabilidades do conflito. Daí resulta uma reconstrução que, em vez de esclarecer, arrisca alimentar visões distorcidas e desequilibradas.

A história da Palestina não pode ser reduzida ao só “retorno judeu”. É também — e inseparavelmente — a história de uma população árabe-palestina enraizada há séculos naquelas mesmas terras, frequentemente herdeira dos próprios judeus da antiguidade que permaneceram no local e se converteram com o tempo. É a história de comunidades que viram restringir-se progressivamente espaços, recursos e direitos, até se encontrarem sob ocupação militar e numa condição de marginalização permanente.

A mais de setenta e cinco anos da nascimento de Israel, a questão palestina permanece aberta: milhões de refugiados vivem ainda em campos sem possibilidade de retorno, a Cisjordânia está fragmentada por assentamentos e checkpoints, e Gaza é submetida a um cerco imposto por Israel desde 2007, após a tomada do poder por parte do Hamas. Desde então, dois milhões de pessoas vivem encurraladas numa faixa de terra superpovoada, privada de liberdade de movimento, submetida a restrições sobre bens de primeira necessidade, eletricidade, água potável e cuidados médicos. Nos últimos anos, e em particular após as operações militares de 2023-25, a situação degenerou em formas de violência em massa que muitos observadores e organismos de direitos humanos descrevem como um verdadeiro genocídio. Falar hoje de soluções sem levar em conta estas realidades equivale a propor fórmulas vazias.

Se o objetivo é compreender e não simplificar, então é necessário dar espaço pleno à voz palestina, com o peso de suas perdas, das expulsões, das expropriações e das reivindicações de justiça que permaneceram inauditas durante décadas. Ignorar esta dimensão significa perpetuar a remoção de um povo que continua a viver sob ocupação, no exílio ou sob cerco.

Para os palestinos, a história de 1948 não é um capítulo fechado, mas o início de uma Nakba contínua (al-Nakba al-mustamirra), uma catástrofe que nunca se interrompeu: da expulsão dos refugiados e a confiscação das terras, à colonização da Cisjordânia, até o cerco de Gaza. Cada geração conheceu a mesma condição de privação e precariedade, como se o trauma fundador da perda se renovasse sem cessar.

A história, se enfrentada com honestidade e rigor, nunca é neutra: ela pode tornar-se um instrumento de denúncia e de responsabilidade. Restituir complexidade a esta vicissitude significa antes de tudo reconhecer a condição palestina pelo que foi e é ainda hoje — uma catástrofe ininterrupta feita de expulsões, injustiças e resistência — e abrir assim espaços de possibilidade: para a memória, para a justiça, para a paz.

Fonte: Eurasia Rivista

Gabriele Repaci
Gabriele Repaci

Colaborador da "Eurasia. Rivista di studi geopolitici". Escreve para a revista científica "Das Andere - L'Altro"; já colaborou com a Associação Político-Cultural Marx XXI e com a Arianna Editrice.

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