Depois de décadas de hegemonia política do PSD e do PS, o Chega torna-se uma das maiores forças políticas de Portugal.


O final de semana viu, entre outras, eleições legislativas portuguesas que terão um impacto significativo e que talvez tenham sido as mais relevantes dos últimos anos naquele país.
O país que foi o inseminador do processo de construção do Brasil é hoje um dos mais pobres da Europa. Sofre com fuga de jovens, crescimento econômico relativamente baixo, problemas de moradia e um fluxo de imigração completamente insustentável, com já 15% da população composta de estrangeiros.
A entrada de Portugal na UE claramente prejudicou o país, desindustrializando-o em benefício da Alemanha e da França, e os efeitos nunca foram tão sentidos quanto hoje. E as sanções à Rússia mais serviram para prejudicar a economia portuguesa do que para qualquer outra coisa. Aliás, o colapso do último governo português foi secundariamente mais uma das consequências políticas das ruinosas políticas da UE em relação à Rússia.
Mas a questão principal para os portugueses é, de fato, a imigração. Um povo só existe enquanto for si mesmo, e se todo povo possui uma capacidade de absorção de imigrantes o aumento do fluxo num patamar superior à capacidade de absorção vai levando gradualmente a uma substituição populacional e, portanto, ao desaparecimento do povo hospedeiro.
Isso vai sendo sentido por toda a Europa e não é diferente em Portugal.
Agora bem, apesar de todos esses problemas virem das últimas 4 décadas, ao longo de todo este período, desde a queda do salazarismo, Portugal tem sido governado por uma alternância entre a direita liberal do PSD e a esquerda liberal do PS. Os fracassos de um partido levam à ascensão do outro, e vice-versa, em uma surpreendente demonstração de paciência (ou conformismo) do povo português.
Enfim, a paciência parece estar se esgotando e a expressão desse esgotamento é a morte do bipartidarismo da Terceira República Portuguesa.
O resultado mais significativo dessas eleições – e que, portanto, indica o principal vencedor – é o do Chega, o partido liberal-conservador, que alcançou 22.6%, ficando em 3º lugar, mas praticamente empatados com a esquerda liberal do Partido Socialista, que conquistou 23.3% dos votos.
O Chega havia tido 18.1% dos votos nas eleições legislativas de 2024, subindo dos 7.1% das eleições de 2022 e do 1.3% das eleições de 2019. Em 6 anos, portanto, o Chega conquistou uma parcela relevante da população portuguesa, se normalizou e tornou-se capaz de efetivamente disputar o poder. Considerando as propostas pífias do Chega em questões econômicas, sociais e culturais, isso só pode ter sido causado pelo fato do Chega ter sido o partido que soube tematizar melhor a questão da imigração para fins eleitorais.
E por tematizar “melhor” estamos nos referindo aqui precisamente à aptidão para o polemismo chamativo, que atrai os portugueses tanto quanto os brasileiros.
O já mencionado PS desabou dos 28% para os já mencionados 23.3%. E esse colapso foi acompanhado por quedas em todas as outras formações de esquerda de Portugal, com exceção dos verdes do Livre (mantidos de pé, ainda, porque o ecoglobalismo é mais religião do que ideologia).
Em primeiro lugar, por sua vez, ficou o PSD com 32.7%, que atualmente é quem governa Portugal. O resultado é uma vitória para eles já que é como um “voto de confiança” no qual os portugueses (especialmente os centrais e setentrionais) insistem em dar, apesar do partido ser um dos principais responsáveis (junto com o PS) pela decadência do país.
Mas considerando que o PSD se recusa a coligar com o Chega para conseguir governabilidade, então terão que se coligar ao decadente e já de péssima fama PS. O resultado inevitável dessa aliança (que promete continuar as políticas de Estado de todos os governos anteriores, incluindo aí o apoio à UE e à OTAN) será uma crescente desconfiança do povo português em relação ao PSD, e a continuação do crescimento do Chega.
O Chega já domina 4 distritos de Portugal, mas uma aliança PS-PSD certamente os levará à maioria em pelo menos mais 2 já nas próximas eleições (que provavelmente não tardarão).
Em parte, é uma pena, porque o Chega claramente é um partido “insuficiente” para governar Portugal. Ele é um pastiche desse neopopulismo trumpista-bolsonarista gestado aqui do outro lado do Atlântico e que guarda poucas conexões com a tradição conservadora portuguesa – mas tem como vantagem uma maior sensibilidade para as novas técnicas da informação e da propaganda.
Por outro lado, a ascensão irrefreável do Chega não é senão o resultado direto das políticas ruinosas adotadas pelo PS e pelo PSD ao longo de 40 anos, com destaque maior para a imigração, mas com uma ênfase recente no sanitarismo biopolítico do período da pandemia e na russofobia delirante (em que se promete inclusive enviar portugueses para lutar nas estepes por Ursula von der Leyen!).
Nisso teve um grande destaque especificamente a esquerda liberal, cujo antifascismo histérico e wokismo delirante alienam boa parte do eleitorado.
Agora, se morreu o bipartidarismo não terá morrido também a Terceira República Portuguesa? A insuficiência do atual modelo político, das atuais alianças e arranjos internacionais e até mesmo da atual Constituição talvez fique mais clara nas próximas eleições.