Em seu ensaio clássico “Contra Todos os Racismos”, Alain de Benoist rejeita tanto as teorias raciais do século XIX quanto o antirracismo moderno, defendendo o “etnopluralismo” como alternativa que valoriza diferenças culturais sem hierarquias biológicas. Veja neste texto de Constantin von Hoffmeister como o pensador francês articula uma crítica radical à homogeneização cultural promovida pelo liberalismo contemporâneo.
Alain de Benoist não escrevia manifestos, ele escrevia detonações. “Contre tous les racismes” (Contra todos os racismos) foi um divisor tectônico desenhado sob os pés da modernidade. Publicado em 1974, o ensaio se recusava a aceitar os roteiros pré-escritos transmitidos pela moralidade do pós-guerra: que se deve escolher entre as grotesquidades desacreditadas do racismo biológico e as bajulações sufocantes do antirracismo liberal. Ele escolheu um terceiro caminho. Uma ruptura. Uma destruição do espelho em que o Ocidente se vê tanto como juiz quanto como salvador.
O que De Benoist rejeitava era a ideia de que a história sempre deveria ser expurgada de identidade para ser moral. Em uma época em que o antirracismo havia se tornado uma religião cívica — incluindo pregações, rituais, e excomunhões — ele fez o impensável: questionou as fundações. Ele não defendeu os velho dogmas raciais, que repudiava abertamente. Ele viu que a nova fé na mesmice era mais insidiosa. Ela fingia se opor ao ódio e, ao mesmo tempo, achatava o mundo em uma monotonia. Ele afirmou o direito de ser diferente.
O ensaio se desenrola como uma declaração de guerra intelectual. De Benoist começa com uma rejeição precisa: o racismo biológico é insustentável, cientificamente absurdo, corrosivo para a integridade do pensamento e da comunidade. Ele não moraliza; ele disseca. Sua preocupação é a devastação causada pelo reducionismo — a maneira como ele achata as diferenças humanas em categorias sem sentido, tirando dos povos a forma cultural e a profundidade histórica. Reduzir uma pessoa a um genótipo, a um pigmento, a um tamanho de crânio é a primeira traição à condição humana. Em seguida, vem outra traição. Ela vem revestida de virtude, mascarada de benevolência: a exigência de que todos se tornem intercambiáveis.
De Benoist usa um bisturi no cadáver da ciência racial do século XIX e não se preocupa em costurá-lo novamente. O racismo biológico, escreve ele, é uma linguagem morta, uma taxonomia de fantasmas – formas de crânio, linhagens sanguíneas, hierarquias imaginárias gravadas em carne que nunca significaram nada real. Ele não lamenta isso. Ele passa através disso como uma faca na neblina. Não há raças superiores, apenas culturas com sua própria gravidade, suas próprias histórias, suas próprias canções intraduzíveis. O ser humano não é um cromossomo. É um mito, uma memória, uma forma. Assim, ele cospe os mapas genéticos e se volta para o mapa sagrado da diferença, não para dominar, mas para lembrar: somos o que herdamos, não em ossos, mas em significado.
A raça era um andaime erguido por uma ciência ruim e uma metafísica pior, uma categoria que pretendia explicar, mas que apenas reduziu. Gobineau e Chamberlain organizaram as pessoas como espécimes em gavetas, confundindo ordem com compreensão, confundindo diferença com valor. Suas hierarquias desmoronam agora, artefatos de uma visão de mundo que não consegue lidar com as complexidades do pertencimento humano. As lentes devem mudar – da biologia, que achata, para a cultura, que molda, relembra e dá forma. A identidade surge não do sangue, mas do significado compartilhado, das estruturas que habitamos, das tradições que levamos adiante, dos padrões que nos recusamos a abandonar.
O mundo liberal se torna o grande homogeneizador. De Benoist viu isso claramente. Em nome da tolerância, ele apaga as distinções. Em nome da abertura, ele dissolve as fronteiras — políticas, espirituais, simbólicas. A diferença, que antes era vista como fonte de beleza e tensão, é rebatizada como desigualdade e alvo de apagamento. O objetivo passa a ser a neutralidade. A assimilação substitui o respeito. As culturas sobrevivem como conteúdo, desprovidas de substância.
Nesse clima, o antirracismo se torna uma arma do império do mal. Bandeiras e soldados não são mais necessários. Mercados e valores fazem o trabalho. O novo império do mal exige que todos os povos falem a mesma língua dos “direitos” e do “desenvolvimento”. De Benoist entendeu isso como uma traição à pluralidade. Os ritmos antigos – tribais, nacionais, sagrados – são reembalados para exportação. O sagrado se torna uma exibição. O estrangeiro se torna um festival. A cultura perdura em simulacros.
De Benoist propôs o etnopluralismo como um princípio. Uma visão do mundo composta por comunidades enraizadas. Cada povo carrega uma história, uma forma, uma linguagem de ser que não pode ser transposta. Apagar tudo isso em nome do universalismo evoca a violência da conquista. O etnopluralismo afirma a diferença sem invocar a superioridade. Ele reconhece a coexistência de vozes distintas. A harmonia surge por meio da multiplicidade.
De Benoist não recuou. Ele estava traçando linhas de defesa. Memória, continuidade e identidade surgem da herança e não da seleção. Em um mundo cativado pela escolha, ele se voltou para o que a precede: idioma, ancestralidade, o que está gravado na profundidade histórica. Esses elementos oferecem um tipo diferente de dignidade. O eu cresce a partir de um lugar, formado por meio da transmissão.
O ensaio fala contra duas formas de tirania. Uma vem por meio da exclusão e da dominação. A outra chega por meio da abstração, professando amor enquanto dissolve toda forma. Ambas apagam o particular. Ambas tratam a diferença como uma ameaça. De Benoist se afastou desses pontos de fuga. Ele se voltou para o pertencimento, para a preservação da forma e a fidelidade ao lugar.
As implicações vão além da filosofia. Uma sociedade que abandona a diferença se abre para a indiferença. De Benoist identificou o multiculturalismo como um sintoma e não como uma cura. Quando todas as culturas se misturam sem medida, elas deixam de expressar mundos coerentes. Um mosaico precisa de clareza, contorno e distinção. A identidade sustenta a paz por meio da orientação. Um povo fundamentado em si mesmo não tem necessidade de subjugar os outros.
Fonte: geopolitika.ru.