Trump ou Harris?

O que a eleição dos EUA em 2024 representa para o Brasil e para a América Ibérica? É necessário atentar para as diferenças existentes entre as prioridades geopolíticas do nosso continente e de outras partes do mundo.

Independente do resultado nas eleições dos EUA, a minha posição e a dos patriotas brasileiros que eu represento é de que a política de Washington para o Brasil e a América Ibérica é uma “política de Estado” que independe, em sua essência, das “danças de cadeiras” na Casa Branca.

Apesar de haver distinções significativas em outras questões (mas menos do que nas presidenciais de 2016 e 2020), tanto internas quanto geopolíticas, há pouca variação na leitura que republicanos, democratas e o Deep State fazem da nossa zona geográfica.

Que leitura é essa?

A leitura consensual é de que os EUA não podem arcar com uma perda da hegemonia no Caribe, América Central e do Sul. O Consenso de Washington teria permitido aos EUA relaxar e abriu caminho para desenvolvimentos políticos desfavoráveis ao hegemon unipolar em nosso continente, e o resultado disso era que há 10 anos havia várias lideranças hostis ou indiferentes aos EUA.

Mas se lidar com isso era necessário, mas não urgente, no contexto geopolítico contemporâneo a coisa muda de figura. Porque os EUA estão sendo contestados na Europa, na Eurásia, no Oriente Médio, na África e na Ásia, e essa contestação é simultaneamente ideológica, cultural, econômica e militar.

Essa contestação se desdobra efetivamente pelo fortalecimento de outras potências contra-hegemônicas, as quais alimentam o dissenso por meio de uma colaboração multifacetada, fomentando o antiatlantismo em todos os continentes.

Não obstante, a América Ibérica ostenta reservas de importantes recursos estratégicos em abundância – inclusive de recursos vitais para o salto tecnológico buscado pelas grandes potências (como o lítio) – além de dispor de uma reserva demográfica razoável, de uma posição geográfica insular e de uma série de outras vantagens que tornam a mera dominação da região condição suficiente para suspender a transição multipolar ou revertê-la em algumas décadas. Sobre isso, basta recordar as declarações da General Laura Richardson sobre a Amazônia como pertencendo à zona de interesses de Washington.

É isso que está previsto na geopolítica talassocrática dos EUA desde sua fundação, com Alfred Mahan – em que o Caribe é pensado como “mediterrâneo americano” e o continente como um todo é pensado como “plataforma para a conquista mundial”.

E a política externa dos últimos 3 governos dos EUA confirma isso, como em uma reativação da Doutrina Monroe. Se a política externa dos EUA para outras regiões teve mais inconsistências e giros inesperados, na América Ibérica ela é caracterizada por uma perfeita continuidade de propósitos.

Da Operação Lava-Jato até a política externa vacilante do governo atual, passando por inúmeras revoluções coloridas no continente e pelo narcoterrorismo (que sempre acaba eventualmente justificando a presença de tropas dos EUA), sem esquecer a misteriosa expansão da Embaixada dos EUA, tudo fluiu suavemente em benefício da garantia de hegemonia atlantista na região.

Nada disso é tendente a ser modificado sob Harris ou Trump, ao contrário, trata-se de uma direção geopolítica que unifica todos os principais motores da geopolítica dos EUA.

Nesse sentido, entre Trump e Harris, a única coisa que realmente queremos é ser deixados em paz.

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Raphael Machado

Advogado, ativista, tradutor, membro fundador e presidente da Nova Resistência. Um dos principais divulgadores do pensamento e obra de Alexander Dugin e de temas relacionados a Quarta Teoria Política no Brasil.

Artigos: 39

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