No núcleo da sociedade brasileira há um “Brasil Profundo” extremamente rico e variado, o que provavelmente explica o inexprimível encanto, a flexibilidade e a multidimensionalidade da riqueza da cultura brasileira (A. Dugin)
Nota Preliminar:
Abaixo apresentamos um pequeno trecho da obra O Logos de Ariel: a metafísica e a existência de uma Civilização Latino-Americana, do filósofo contemporâneo Alexander Dugin. A síntese da tese apresentada por Dugin na obra é um trabalho ainda a ser feito. No entanto, a título de anotação preliminar, pode-se dizer que trata-se da aplicação dos conceitos gerais da Noomaquia (método de análise e interpretação das civilizações criado por Dugin) e da Etnossociologia à realidade iberoamericana. Em se tratando de Brasil, Dugin passeia por diversos momentos históricos e intérpretes nacionais (como Darcy Ribeiro, Câmara Cascudo, Vicente Ferreira da Silva) para construir sua esquematização noológica de nossa civilização. O caráter mestiço povo iberoamericano (inclusive do ponto de vista da Raça Cósmica de José Vasconcelos), sua originalidade, as energias arcaicas/tradicionais que alimentam o continente são alguns dos marcadores conceituais a partir dos quais Dugin parte. O trecho abaixo é altamente sintético e consiste na conclusão do capítulo sobre o “Grande Brasil”. Dugin apresenta o Brasil como configurado por pelo menos quatro eixos socioculturais e tradicionais distintos.
Boa leitura!
. . .
Esquema do Logos Brasileiro
Agora podemos completar o esquema arquimoderno brasileiro a partir daquilo que concluímos sobre a civilização candomblé, bem como acerca de sua contribuição para o logos brasileiro:
Cada uma das três camadas na metade inferior da estrutura (pré-moderna/arcaica), tal como a estrutura da modernidade na Europa e nos Estados Unidos requerem cautela do ponto de vista da interpretação noológica. Mas o que já temos de conhecimento das seções anteriores da “Noomaquia” [conjunto de obras onde Dugin analisa as civilizações humanas] permite-nos chegar a um quadro geral sobre os parâmetros básicos do logos brasileiro.
1. A civilização iorubá possui um caráter apolíneo-dioníésico e é uma forma de religião solar.
2. A civilização bantu – uma civilização de Deméter, cuja identidade, na América do Sul, tornou-se um núcleo da cultura africana jeje-nagô, influenciando o restante das formas religiosas africanas e outras correntes.
3. A civilização o tupi-guarani, próxima da ctônica, com elementos do culto da Grande Mãe (as tribos de caçadores-coletores), mas também com uma série de características da civilização de Deméter (que, tipologicamente, é próxima das tribos Bantu).
E, finalmente,
4. A identidade portuguesa no Brasil, em grande parte de origem católico-imperial, de característica pré-moderna.
Deste modo, temos uma vasta gama de todos os três logos – um forte domínio solar, a parte ctônica tupi e o diurno-arcaico africano. Isso faz com que, no núcleo da sociedade brasileira, haja um “Brasil Profundo” extremamente rico e variado, o que provavelmente explica o inexprimível encanto, a flexibilidade e a multidimensionalidade da riqueza da cultura brasileira. Quanto às influências modernistas, vemos claramente dois vetores divergentes: (A) influências externas do liberalismo, do capitalismo e do secularismo que, no geral, representam uma continuação do vetor colonial e a forma da hegemonia civilizacional extraterritorial até os polos do próprio Brasil (a América do Norte rica, a estratégia moderna do Atlântico Norte etc.) e, só outro lado, (B) o interior profundamente enraizado [isto é, o Brasil Profundo] no desejo arcaico por emancipação, identidade, liberdade, independência e auto-afirmação, ou seja, pela implantação de um logos brasileiro pleno, baseado em seu núcleo arcaico [em suas raízes tradicionais].
Ambos os vetores convergem na fração arquimoderna “numeradora” e são expressos em um fenômeno tão complexo como a descolonização e a busca por identidade, cujas possibilidades vão desde a adoção da lógica universalista do “Norte rico” (estar de acordo com o “progresso”) a uma talvez tentativa de encontrar sua própria pureza brasileira – ou latina, em sentido amplo – no caminho do futuro, organicamente decorrente do destino e da estrutura brasileira, com base no único e complexo Dasein brasileiro.