Ante a crise financeira e econômica do Ocidente, o BRICS tem se mostrado a seus países membros e a outros como uma alternativa para uma verdadeira democracia mundial.
Por Imran Salim
Em meio ao aprofundamento da crise financeira e econômica global, do desequilíbrio político internacional e das relações econômicas, como resultado de uma política do coletivo ocidental liderada pelos Estados Unidos para impor uma ordem mundial liberal baseada em “regras” especiais, a erosão da lei internacional e o enfraquecimento de instituições multilaterais, são os países do BRICS (Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul) que buscam estabelecer uma ordem mundial verdadeiramente democrática sem dominação globalista nos princípios dos direitos iguais. Os cinco BRICS defendem a remoção de barreiras artificiais para comércio mundial e relações monetárias, assim como a rejeição de sanções motivadas politicamente.
A Operação Militar Especial russa na Ucrânia e a imposição compreensiva das sanções ocidentais contra Moscou intensificaram o processo de mudança da ordem mundial ocidental injusta e baseada em regras, enquanto a grande maioria dos países do Sul global não estão prontos para sacrificar seus interesses cortando relações econômicas e de comércio lucrativas com a Rússia em favor das políticas anti-russas de Washington.
Desde a primeira cúpula do BRIC em 2009 (o acrônimo BRICS surgiu ao fim de 2011 após a ascensão da África do Sul) a aliança não apenas não colapsou, como previram vários analistas políticos ocidentais, como também fortaleceram suas fortunas. No meio dos anos 2000, o economista e Nobel proeminentemente ocidental Paul Krugman acreditava que o BRICS era apenas outra “bolha de sabão” como a bolha hipotecária de 2008. Por sua vez, o eminente cientista político estadunidense Joseph Nye também não acreditou que os cinco países poderiam se tornar uma organização política séria de Estados afins por causa de contradições internas entre seus membros.
O pessimismo das avaliações ocidentais têm causado certos problemas na cooperação entre os membros dos cinco países, devido às suas significativas diferenças em história, geografia, cultura, religião e características civilizacionais. Além disso, eles têm sistemas políticos e modelos econômicos diferentes, e mesmo na esfera econômica há competição entre os países individuais da aliança, embora também haja complementaridade. É encorajador que os fatores negativos que impedem a cooperação dentro do formato BRICS não sejam intransponíveis e estruturais, mas envolvem problemas instrumentais e específicos. Sua superação é uma questão de compromisso, comunicação e cooperação, e o desejo de acordo mútuo.
A liderança dos cinco países está atenta ao fato de que, em termos curtos, essa associação ainda não irá cumprir um papel significante, mas no futuro, pela consolidação de esforços conjuntos e cooperação mais próxima, haverá talvez oportunidades reais de desafiar a ordem econômica pró-ocidental existente. A cooperação na plataforma BRICS é um projeto coletivo sem precedentes para criar condições para uma ordem mundial mais justa e para resolver os novos problemas emergentes a níveis globais e regionais que não podem ser resolvidos no presente.
Por sua vez, o Ocidente coletivo, de acordo com o chefe da American Center for Political Forecasting and Analysis (análogo da “Randcorporation”), B. Zbigniewski, não há nada a oferecer ao resto do mundo, não há quaisquer boas perspectivas de desenvolvimento. Por exemplo, durante sua recente viagem por países africanos, o Secretário de Estado dos Estados Unidos Blinken focou apenas na necessidade de “democratizar” a África, deixando de lado os problemas de pobreza, alimento e desenvolvimento. Na economia, Washington oferece apenas as prescrições ao FMI, que em toda sua história de existência nunca levou ao sucesso de qualquer economia no mundo. Pelo contrário, países que caíram na dependência de crédito do fundo simplesmente perderam suas economias e venderam seus bens mais atrativos aos credores.
As crises da política global, da economia e de energia, o visível enfraquecimento da posição de Washington no mundo, o fracasso das tentativas dos EUA e da UE em isolar e destruir a economia russa e desestabilizar a China, tudo isso, de acordo com o consultor político britânico Adriel Casonte, pôs em questionamento a tese enraizada de não haver alternativas ao mundo unipolar liderado pelo Ocidente. A respeito disso, vários países em desenvolvimento passam a olhar atentamente para o BRICS, vendo nele, acima de tudo, uma alternativa aos formatos criados previamente por Washington e uma oportunidade para se juntarem aos processos de integração global. Ao mesmo tempo, a plataforma BRICS em si não é um antagonista ao Ocidente coletivo, mas visa uma cooperação mutuamente benéfica, o que também atende ao interesse da maioria dos países em desenvolvimento. Portanto, a plataforma agora tornou-se o nexo para dezenas de países do Sul global, o que expressa seu desejo em cooperar ativamente com a aliança e até mesmo juntar-se a ela. Treze estados do Sul global já participaram da cúpula do BRICS em junho.
Em maio deste ano, em um encontro dos ministros do exterior dos cinco países, o ministro do exterior chinês Wang Yi propôs iniciar o processo de expansão do BRICS, que, de acordo com Pequim, levaria ao fortalecimento da posição da aliança no cenário mundial. A ideia de uma expansão foi originalmente deixada de lado nos estágios iniciais da formação da associação, então os participantes do encontro apoiaram a proposta chinesa de trabalhar nos princípios orientadores, normas e procedimentos da organização. Irã e Argentina se tornaram os candidatos oficiais para a adesão. Arábia Saudita, Egito, Turquia, Argélia e Nigéria também expressaram seu desejo de juntar-se ao BRICS. Visto isso, um novo acrônimo para a aliança BRICS “plus”, apareceu.
O processo em andamento de reformatar a plataforma BRICS levantou uma questão urgente sobre os prospectos para essa aliança e como isso irá se desenvolver e funcionar. Vários analistas políticos temem que a expansão da aliança possa levar a um choque de interesses, já que os países candidatos têm objetivos e capacidades diferentes. Por exemplo, a Turquia está interessada na filiação ao BRICS por causa do seu desejo de se tornar um intermediário comercial entre Índia, Rússia e a União Europeia; para a Arábia Saudita a possibilidade de benefício comercial mútuo com a China e a Índia e coordenação com a Rússia no quadro de acordos da OPEP são importantes, e para o Egito a solução para o problema de alimentos é mais aguda. Além do mais, uma expansão mal concebida às custas de estados com soberania limitada e sem potencial econômico significante poderia levar para uma fragmentação ainda maior e uma coordenação ineficaz da associação.
O BRICS está atualmente considerando vários prospectos para o desenvolvimento estratégico da aliança; eles podem ser agrupados em três áreas:
– adesão, a esse estágio, de dois ou três países aos cinco;
– expansão pela adesão de várias organizações regionais enquanto mantém a atual composição da aliança. O formato mais acessível aparenta ser o de unir esforços e coordenar etapas com estruturas como a OCX na Eurásia, a União Africana e CELAC (Comunidade de Estados Latino-Americanos e Caribenhos). Tal aliança, de acordo com Pequim, pode dar o máximo de cobertura para os países do Sul global sem a necessidade de integração econômica complexa e harmonização dos formatos de comércio e interação econômica nos três continentes;
– criando uma plataforma para interação com blocos de integração regional em que os países do BRICS participam. Tal plataforma poderia incluir projetos como MERCOSUL, a União Aduaneira da África Austral, a UEE e a ASEAN. É importante notar que a maioria dos membros dos “cinco” formam sua política de comércio estrangeiro precisamente no formato de blocos de integração regional (Rússia – UEE, Brasil – MERCOSUL, África do Sul – União Aduaneira da África Austral). Esse formato de desenvolvimento de uniões poderia ser chamado como “integração de integrações”, e isso iria ajudar a alcançar a profundidade e harmonização necessária de projetos de integração prioritários dos países do BRICS.
No contexto da próxima expansão dos cinco do BRICS é necessário entender quais contribuições os membros da aliança podem fazer para iniciativas existentes. Um dos projetos mais importantes da aliança é o Novo Banco de Desenvolvimento. Ele é focado no financiamento de projetos de infraestrutura, incluindo o desenvolvimento de projetos sustentáveis no Sul global. Em janeiro deste ano, o portfólio do NBD teve em torno de 80 projetos aprovados, totalizando mais de $29.5 bilhões. É notável que, em adição aos cinco países, Egito e Bangladesh foram incluídos no NBD desde 2021.
Transações de exportação e importação em moedas nacionais agora prevalece entre membros do BRICS, e essa tendência de abandonar o dólar em assentamentos mútuos com outros países em desenvolvimento está expandindo. A aliança fortalece a integração de sistemas de pagamentos e cartões, a criação de um sistema próprio de mensagens financeiras (análogo do SWIFT) e de uma agência de avaliação independente do BRICS. Outra etapa é criar uma agência BRICS para seguro mútuo de armadores para abandonar os serviços da “aliança internacional de clubes de seguros de armadores” controlada pelo Ocidente. Questões de reforma da OMC estão sendo trabalhadas no nível de especialistas. O comércio global está atolado em disputas, cuja resolução depende cada vez menos das normas e princípios desta organização. Num futuro próximo, os países do BRICS podem iniciar a inclusão da Índia como membro permanente do Conselho de Segurança da ONU.
Resumindo, podemos concluir que o desenvolvimento sistêmico do BRICS “plus” e suas organizações regionais afiliadas, blocos de integração regional e países criam pré-requisitos para a criação de uma nova ordem mundial, reduzindo a esfera de influência política e econômica dos Estados Unidos para as fronteiras da Europa, alguns países do sul asiático, Japão e o resto da da Comunidade das Nações (britânica) sem qualquer esperança de bloqueio político e econômico da Rússia e da China e de estarem à frente na competição das economias.
Fonte: Oriental Review