Os capitalistas e o Quinto Estado, o domínio dos párias

Com base nos textos do Julius Evola tardio, em particular os que atualizaram a narrativa da Regressão das Castas, Raphael Machado aponta que o filósofo italiano considerava a existência de um Quinto Estado, isto é, o domínio dos párias (chandalas/dalits), que assumiram funções típicas do capitalismo financeiro.

Banqueiros, especuladores e empresários capitalistas são vaishyas segundo o entendimento tradicional dessa casta? Os regimes burgueses capitalistas correspondem ao domínio do Terceiro Estado?

Julius Evola é um autor do qual muito se fala, mas pouco se lê. Em geral, quando muito, se lê seus três principais livros (Revolta, Ruínas e Cavalgar), mas raramente se lê as compilações de artigos de revistas, seus outros livros, seus principais intérpretes, etc.

O que isso acarreta é que a maioria das pessoas não está inteirada das correções feitas por outros evolianos a elementos de sua obra, das suas mudanças de perspectiva sobre vários assuntos (afinal, ele escreveu dos anos 20 aos anos 70), e por aí vai.

O primeiro ponto é que não há base para afirmar que banqueiros, especuladores e empresários capitalistas seriam ocupações correspondentes à terceira casta, a casta dos vaishyas.
As ocupações clássicas dos vaishyas são agricultura, pastoreio e comércio. Não raro se inclui aí também o que seriam os “artesanatos”. Ou seja, a casta dos vaishyas seria uma casta de trabalhadores produtivos. É parte da sua função “colher os frutos da terra”.

O que seriam, então, as figuras típicas do sistema capitalista, como banqueiros, especuladores, rentistas, acionistas, empresários não-trabalhadores, etc? Se não são vaishyas, nem shudras (já que os shudras seriam a casta dos servos), essas figuras só podem ser chandalas/dalits, ou seja, párias, gente sem casta.

Talvez não por coincidência, no Ocidente, essas ocupações foram abraçadas com gosto por gente que não fazia parte do sistema de divisão social tradicional dos indo-europeus, ou seja, por “forasteiros”, “nômades parasitas”, gente sem raízes, desvinculada das relações sociais tradicionais. Párias.

Mas considerando que em “Gli Uomini e le Rovine” Evola diz que o conflito entre EUA e URSS corresponderiam entre um conflito entre Terceiro e Quarto Estado, isso significa que ele estava equivocado? Não necessariamente.

Em verdade, em uma publicação chamada Civiltà Americana, que apresentava uma compilação de vários textos escritos sobre os EUA, incluindo aí textos bem tardios, do fim de sua vida, Evola aponta que os EUA seriam, de fato, uma sociedade dos sem casta, uma sociedade de párias.

Isso é confirmado pela atualização, também em seus últimos anos de vida, da narrativa da Regressão das Castas (com suas correspondentes consequências políticas) para incluir aí um Quinto Estado, após o fim do Quarto Estado. Afinal, apesar de Evola ter se olvidado disso ao longo da maior parte de sua vida, de fato há gente abaixo dos chudras. Os párias/chandalas/dalits.

Mas como fica, então, a questão do Terceiro e do Quarto Estados ao longo da história?

A ascensão do Terceiro Estado veio por meio de revoluções organizadas por comerciantes e artesãos dos burgos europeus. Ocorre, porém, que a aceleração da modernidade confunde as castas de modo quase incontornável.

A Revolução Industrial, com o cercamento dos campos, levou agricultores e pastores a abandonarem o campo e irem procurar trabalho nas cidades. Isso quer dizer que, originalmente, o proletariado é formado, em boa parte, por representantes do equivalente dos vaishyas europeus.

Não por acaso, o século XIX todo é pautado não só pelas revoluções burguesas, mas também por tentativas de reorganização de equivalentes modernos das antigas corporações de ofício, atualizados como sindicatos, uma iniciativa tipicamente vaishya.

Em que consistiria, então, o Quarto Estado, cujo marco inicial seria a Revolução Russa? Primeiramente, os elementos fundamentais do Quarto Estado já vinham se construindo no final do século XIX. O que é inaugurado com o Quarto Estado é o materialismo crasso das relações sociais e pessoais humanas, convertendo o homem em engrenagem.

Observe-se, porém, que as características fundamentais do Quarto Estado passam a se aplicar a praticamente todas as sociedades da época, por diferentes meios.

Mas os elementos do Quinto Estado já não existiam ali antes mesmo do surgimento do Quarto Estado? Ou seja, banqueiros, especuladores, grandes empresários, etc? De fato, eles já existiam e já exerciam forte influência desde o início do século XIX.

Ocorre, porém, que seu domínio direto do mundo, a um nível praticamente totalitário, sem rivais e sem necessitar de testas-de-ferro já vai se iniciando no Ocidente nos anos 60 e se realiza plenamente com o fim da Guerra Fria, inaugurando o Quinto Estado, o domínio dos párias, em todo o mundo.

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Raphael Machado

Advogado, ativista, tradutor, membro fundador e presidente da Nova Resistência. Um dos principais divulgadores do pensamento e obra de Alexander Dugin e de temas relacionados a Quarta Teoria Política no Brasil.

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