ApĂłs 54 anos do golpe militar ainda hĂĄ brasileiros saudosistas que acham que o golpe “salvou” o Brasil de uma imaginĂĄria ameaça comunista e de que tudo era bom Ă Ă©poca. Deixando de lado certos lugares comuns esquerdistas, nĂŁo obstante uma avaliação fria do golpe e dos 20 anos de ditadura sĂł podem ser negativas.
AlĂ©m de nĂŁo haver qualquer ameaça comunista na Ă©poca, jĂĄ estĂĄ mais que comprovado que o golpe de 64 foi resultado de uma coordenação entre a inteligĂȘncia americana, sob ordens do prĂłprio presidente Kennedy, e a casta parasitĂĄria brasileira, envolvendo generais, empresĂĄrios, latifundiĂĄrios e jornalistas.
Essa coordenação nĂŁo veio como evento isolado, mas em um contexto internacional de golpes contra governos que pudessem estar tentando empreender estratĂ©gias nĂŁo-alinhadas de desenvolvimento. Da Argentina de PerĂłn Ă IndonĂ©sia de Sukarno, os Ășnicos paĂses que nĂŁo passaram por isso foram aqueles que correram para se alinhar de forma completa com um dos dois lados na Guerra Fria.
Para o Brasil isso significou, em essĂȘncia, um freio no trabalhismo, que visava promover um desenvolvimentismo cujas benesses nĂŁo beneficiassem apenas o 1%, mas o povo como um todo. Foi o sepultamento dos projetos de reforma agrĂĄria e de limitação das remessas de capital, e a abertura do Brasil para a especulação usurĂĄria do capital financeiro.
Ă fato que a elite militar nĂŁo era ideologicamente monolĂtica e que havia vĂĄrias facçÔes em conflito nos setores militares. NĂŁo obstante, mesmo o desenvolvimentismo aplicado pelos militares foi um arremedo, uma estratĂ©gia deficiente baseada em um endividamento frenĂ©tico cujos juros ainda estamos pagando meio sĂ©culo depois. Os resultados positivos desse desenvolvimentismo, portanto, acabaram sendo insustentĂĄveis.
Ainda que nada se comparasse Ă rapina demoliberal instaurada a partir de Sarney e ao “bananismo cultural” papagaiado pela RepĂșblica Velha, as sementes da maioria dos males e problemas brasileiros contemporĂąneos foram plantadas durante o regime militar.
Crime organizado, violĂȘncia urbana, especulação imobiliĂĄria e financeira, perpĂ©tua escravidĂŁo aos juros da dĂvida pĂșblica, concentração de renda, inchaço e multiplicação dos latifĂșndios. EstĂĄ tudo aĂ.
Ă necessĂĄrio sepultar os mitos de 64.
Parei de ler quando o texto alegou que “nĂŁo haver qualquer ameaça comunista na Ă©poca”. Olha, nĂŁo sĂł havia como ainda hĂĄ, travestida dessa nova ideia hodierna teleolĂłgica apresentada aqui e forjada pelo russo Dugin. Pra começar, o prĂłprio nome da capital, BrasĂlia, Ă© nada mais nada menos que Brasil no idioma russo, e toda a arquitetura da cidade Ă© comunista.