O nacionalismo é uma forma comunitária de amor platônico

Nem os nacional-progressistas ou neotrabalhistas, nem os antinacionalistas ou separatistas entendem que não se trata de uma relação com o “Brasil que é”, mas com o “Brasil que poderia ser”.

O nacionalismo autêntico só pode ser revolucionário porque ele nasce no espírito daqueles que sentem repulsa pelo “meio” tal como ele se encontra. Nasce do vazio da negação de toda a propaganda ufanista dos governos de ocasião que sempre dizem que “tudo está bem”, “a vida é bela”, “somos soberanos”, etc.

É por isso que trata-se do tipo de disposição das almas sensíveis dos países que estão no fundo do poço – aqueles homens desajustados que funcionam como as “antenas da raça”, nos termos de Ezra Pound. Limonov diz especificamente que toda revolução é conduzida pela minoria vanguardista de desajustados: artistas, boêmios, aventureiros, vagabundos, esquizofrênicos, ocultistas, autistas, ganguistas, etc. São os tipos que sem cair no lumpemproletariado, também não se submetem à arregimentação social burguesa.

A massa se “nacionaliza” apenas tardiamente, quando todos os riscos e perigos da militância revolucionária já passaram. Aliás, não raro, a mesma massa que crucificará o arauto do nacionalismo tornar-se-á uma adepta fanática dele, por instinto de rebanho, quando sua vitória for inevitável.

Voltando ao início, porém, o nacionalismo é sempre dual, como a face de Jano. Ele é na mesma medida amor e ódio.

Ódio pelo país como ele é, amor pelo país como ele poderia ser.

Ele é, por isso mesmo, motor de uma operação mágica de destruição e criação.

É necessário destruir o Brasil, para então reconstruí-lo. É necessário odiar o Brasil para que então possamos torná-lo digno de ser amado.

O nacionalista europeu deve conhecer a história, mitos, valores e símbolos europeus, tal como o nacionalista africano e o identitário indígena devem conhecer os seus, na medida das possibilidades.

O desafio para nós é mais abrangente.

O Brasil surge em 1500, mas suas raízes afundam na Antiguidade de três diferentes continentes. O Brasil é ensinado como “tábula rasa”, país sem raízes que aparece repentinamente e vai se desenvolvendo a partir do nada e sem qualquer padrão.

Sabemos “de onde” e “como” veio o Brasil – mais ou menos a partir das “Grandes Navegações” – mas o que o brasileiro sabe sobre Portugal – sobre Ofir, sobre a Lusitânia romana, sobre as raízes celtas da Galícia, sobre os suevos e visigodos assentados na Ibéria, sobre a Reconquista? O que o brasileiro sabe sobre os bantos e iorubás e seus reinos e impérios? E o que ele realmente sobre sobre os tupis e sua conquista do continente?

O nacionalista brasileiro, portanto, precisa necessariamente estar conectado com tudo isso, bem como com as expressões contemporâneas desses nacionalismos e identitarismos dos povos-raízes.

Sem isso ele não entenderá a si mesmo. Permanecerá com uma consciência infantil.

E o brasileiro precisa entender as várias maneiras pelas quais cada uma dessas influências se misturou e se enraizou no Brasil. Porque a confluência dessas várias raízes não resultou em uma mistureba nivelada genérica. Ao contrário, existem fenômenos que possuem feições fundamentalmente europeias, mas com contornos indígenas, outras são fortemente africanas, mas adaptadas ao modo europeu e com elementos indígenas, em outros se sobressai a contribuição indígena, e por aí vai.

Tal como no âmbito etnorracial não existe o “mestiço”, mas o caboclo (como figura euro-indígena), o mulato (como figura euro-africana), o cafuzo (como figura afro-indígena) e a figura específica do pardo (como figura euro-afro-indígena), e o enraizamento de cada um desses tipos em diferentes partes do país e seu desenvolvimento ao longo de alguns séculos gerou diferentes etnias – irredutíveis umas às outras ou a qualquer categoria genérica como o “pardo” ou o “mestiço”. O mesmo se dá no âmbito cultural, simbólico, folclórico, etc.

É uma tarefa muito mais ampla e mais desafiadora do que estudar sobre as relações de produção da indústria cafeeira do século XIX ou a formação de uma classe média no auge extrativista mineral das Minas Gerais, ou essas outras bagatelas materiais que se costuma privilegiar no estudo do Brasil.

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Raphael Machado

Advogado, ativista, tradutor, membro fundador e presidente da Nova Resistência. Um dos principais divulgadores do pensamento e obra de Alexander Dugin e de temas relacionados a Quarta Teoria Política no Brasil.

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