Ou então: quem dera!
Xadrez de Ciro Gomes, o projeto de Putin brasileiro é o título do artigo publicado na coluna de Luis Nassif no GGN da última sexta-feira. Na peça, o jornalista faz sua avaliação acerca do projeto político do presidenciável, construindo seu argumento sobre duas premissas: a carga eleitoral de direita do pedetista (38%, segundo pesquisa da ABRAPEL citada na matéria) e sua relação com o hoje candidato ao Senado Aldo Rebelo, que Nassif afirma representar uma suposta corrente “militar-conservadora” ou “ruralista-militar”.
Bom, pelo andar da carruagem já dá pra ver: a ideia é vender a figura de Ciro como uma alternativa de direita, só que “mais racional e moderada”, ao bolsonarismo; um possível nome para ocupar o vácuo de liderança deixado em um cenário onde a vitória de Lula conduz Bolsonaro à Justiça “para pagar por seus crimes” (o desfecho cinematográfico de uma historinha de Mocinho x Bandido que o PT tão bem sabe manejar em seu próprio benefício).
Seria uma simples derivação da narrativa oficial da militância petista, afinal, quem acompanha política já cansou de ouvir — e Nassif faz questão de repetir ipsis litteris – que Ciro é “linha auxiliar do Bolsonarismo” (ou “do fascismo” para os mais esquentadinhos). Só que aqui temos uma cereja do bolo como adicional: Dugin e Bennon(?!).
Num salto de lógica (ou num surto de oportunismo), Nassif alega que o Quinto Movimento de Aldo Rebelo é “derivado de uma linha nacional-autocrática que tem em Steve Bannon e no russo Alexandr Dugin os maiores expoentes”. E aí o resto vem por dedução: se (a) Aldo é um “militar-conservador” parecido com Dugin e se (b) Dugin é o guru de Putin (ambas afirmações pairando o campo das meias-verdades), logo (c) Ciro Gomes é o equivalente brasílico de Vladimir Putin, presidente da Rússia.
Pronto. Está lançada mais uma sub-trama do enredo sinistro onde Lula, pra variar, salva o Brasil dos poderes das trevas (a historinha de mocinhos e bandidos que aludi acima). Seria engraçado se, na realidade fundamental dos fatos, não fosse a ascensão de um “Putin brasileiro” uma das saídas da crise atroz em que nosso país foi jogado. E aqui faço menção a uma fala do próprio Aldo Rebelo em entrevista recente à Band.
Comentando a necessidade de harmonização entre os poderes no contexto da República, Aldo evoca a interdição da obra do Ferrogrão pelo STF como um exemplo da extrapolação de prerrogativas que parece ter virado regra nos últimos anos. Sobre a ferrovia, trata-se de um projeto de integração oeste-leste que passa por uma porção ínfima de uma reserva: o que já foi suficiente para que um recurso (de uma ONG, um partido político e do MP) paralisasse a obra por tempo indeterminado.
“Enquanto isso a China constrói três, quatro mil quilômetros de ferrovia de alta velocidade por ano. Nós paramos em 930 na nossa principal bacia de grãos”, completa o ex-ministro da Defesa.
Esse simples caso paradigmático já é suficiente para nos lembrar que, sim, o Brasil hoje carece de realizadores a altura de seu potencial histórico-civilizacional. É nessas horas que uma figura como Putin/Xi Jinping, de fato, não faria mal. Alguém com capacidade política de coordenar a marcha da nação a partir do ponto de vista do Interesse Nacional e do projeto de país, enquadrando os caciques com mão de ferro e os fazendo operar pelo bem-comum da Pátria e do Povo.
O microgerenciamento, característico de certas manifestações da democracia liberal-parlamentar, é a receita do atraso em um país com os contornos civilizacionais do Brasil. Não à toa Getúlio aniquilou o demo-liberalismo e refundou o Estado por meios revolucionários, criando as bases para a única democracia que verdadeiramente faz sentido: a que gera desenvolvimento e participa as massas nos bens materiais e culturais da Pátria.
Precisamos de um Putin? Diria que precisamos de um César e de uma democracia cesarista. Caso contrário, vamos seguir reféns de querelas inter-institucionais e da falida democracia liberal, cujos beneficiários todos sabemos quem são (e não somos nós).
Quanto ao Ciro: ele pode ocupar esse papel ou seguir agradando uma militância pós-moderna que está pouco se lixando para o país (vai depender dele).