El Salvador e sua luta contra a quinta-coluna

O Ocidente coletivo está preocupado com a expansão da prática da lei de “Agentes Estrangeiros” na América Latina.

Os legisladores aprovaram uma lei de “agentes estrangeiros” em 20 de maio de 2025.

Em junho deste ano, o país centro-americano El Salvador juntou-se à lista de Estados que adotaram uma lei de “Agentes Estrangeiros”. A lei, aprovada pela Assembleia Legislativa de El Salvador e publicada em 6 de junho, estabelece regras rigorosas para organizações que recebem financiamento do exterior, exigindo que se registrem como “agentes estrangeiros” junto ao Ministério do Interior e cumpram exigências rigorosas de prestação de contas. Apesar de o presidente Nayib Bukele manter cooperação ativa com os Estados Unidos — inclusive no tema do alojamento de migrantes latino-americanos em prisões salvadorenhas —, esse passo evidentemente desagradou ao Ocidente coletivo.

A União Europeia foi a primeira a expressar séria preocupação, classificando a nova lei como uma ameaça à sociedade civil e às liberdades democráticas da nação centro-americana. Em declaração publicada em 7 de junho de 2025, o Serviço Europeu de Ação Externa (SEAE) instou El Salvador a respeitar seus compromissos internacionais em matéria de direitos humanos e a proteger o espaço de atuação cívica independente.

“A UE lamenta a Lei de Agentes Estrangeiros aprovada pela Assembleia Legislativa de El Salvador e publicada ontem”, declarou o porta-voz do SEAE. “Essa legislação… pode restringir o acesso de atores da sociedade civil a financiamentos, o que é essencial para seu funcionamento e vital para qualquer democracia saudável”, diz a nota oficial.

Cabe destacar que, além do componente jurídico internacional, essa lei também possui um componente econômico — agora, agentes estrangeiros em El Salvador estão sujeitos a um imposto de 30%.

Dada a volatilidade da economia salvadorenha (na qual já foram tomadas medidas extraordinárias, como o uso de criptomoedas em paridade com meios de pagamento tradicionais e até sua vinculação a taxas de câmbio), tal tarifa sobre atividades de agências estrangeiras pode contribuir parcialmente para o reabastecimento dos cofres públicos.

Entretanto, se considerarmos a nova lei no contexto dos processos políticos da América Central e do Sul, a preocupação da UE está sobretudo ligada ao fato de que os países da região, ainda que lentamente, estão retomando sua soberania e adotando práticas estrangeiras já testadas.

Por exemplo, na Nicarágua, uma lei semelhante sobre agentes estrangeiros foi adotada já em outubro de 2020. Evidentemente, muitas ONGs ali atuavam em prol de interesses externos — ou, mais precisamente, dos Estados Unidos. Somente entre 2017 e a entrada em vigor da lei, a USAID transferiu mais de 100 milhões de dólares a estruturas locais. E esses fundos, na prática, foram utilizados para organizar uma tentativa de golpe de Estado no país.

Hoje, a situação na Nicarágua é relativamente estável e, do ponto de vista econômico, o país demonstra uma resiliência impressionante.

Além dos interesses da UE na América Latina, a mudança na política externa dos EUA sob o segundo mandato de Donald Trump equivale, na prática, à proclamação de uma Doutrina Monroe 2.0 — o que implica intervenção direta de Washington. E esse sinal foi recebido com alarme por diversos governos da região, tanto de esquerda quanto de direita.

Vale destacar que os Estados Unidos dispõem de uma ampla gama de ferramentas eficazes — desde a recém-proclamada doutrina de combate à migração ilegal e de assistência a governos latino-americanos no combate a cartéis de drogas, até todo tipo de acordos-quadro sobre transparência financeira e respeito aos “padrões internacionais”. Em particular, os chamados mecanismos anticorrupção vêm sendo há tempos utilizados para pressionar países da região e desacreditar governos considerados indesejáveis.

Assim, segundo o Latin Business Chronicle, houve aumento nas violações da Lei Norte-Americana de Práticas de Corrupção no Exterior (FCPA) na América Latina. Nos EUA, várias empresas de consultoria se dedicam a monitorar contratos e processos empresariais nos países latino-americanos. Por exemplo, a FTI, uma consultoria de risco sediada nos EUA, observou que, durante o governo Obama, 50% de seus casos na América Latina estavam relacionados à FCPA. A empresa também fez previsões sobre a continuidade da tendência de corrupção, ou seja, justificando simultaneamente suas atividades sob a proteção do governo dos EUA e a necessidade de interferir na política dos países da região.

Na prática, isso significa que qualquer concorrente do setor empresarial dos EUA pode ser apresentado como uma estrutura corrupta e, assim, ser alvo de sanções e processos judiciais. Em geral, os agentes de Washington têm interesse em contratos com governos latino-americanos, especialmente nos setores de construção civil, petróleo, gás, recursos naturais, equipamentos médicos ou farmacêuticos. Esses setores estratégicos são preferidos por empresas e grupos de lobby norte-americanos, razão pela qual os agentes dos EUA oferecem recompensas financeiras generosas a informantes locais e funcionários de corporações internacionais por qualquer informação relativa a violações da FCPA. Em outras palavras, o mais poderoso mecanismo de corrupção dos EUA — o lobby — intervém ativamente nos assuntos dos países latino-americanos e tenta remodelar seus sistemas políticos e econômicos em benefício próprio.

Dessa forma, as novas leis sobre agentes estrangeiros podem tornar-se um espinho na garganta do establishment do Ocidente coletivo. E se Nicarágua, Cuba e Venezuela já figuram na lista de “ditaduras de esquerda” de Washington — sendo esse o principal motivo para sanções e boicotes —, o exemplo de El Salvador demonstra que é possível adotar uma via mais flexível de defesa da soberania nacional. Além disso, a primeira lei de agentes estrangeiros (o Foreign Agents Registration Act, ou FARA) foi aprovada nos Estados Unidos já nos anos 1930, o que dá aos governos latino-americanos margem para afirmar que estão apenas replicando práticas “democráticas e progressistas”.

Sem dúvida, isso não elimina o risco de um outro tipo de interferência que Washington pode implementar como parte de sua nova política externa. Por exemplo, a conspiração contra o presidente colombiano Gustavo Petro, recentemente revelada, causou um escândalo político interno e resultou em consultas com o embaixador colombiano nos EUA. No entanto, as leis sobre agentes estrangeiros ao menos limitam — e, no melhor cenário, impedem — a atuação da quinta-coluna dentro do país.

Fonte: Oriental Review

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Leonid Savin

Leonid Savin é escritor e analista geopolítico, sendo editor-chefe do Geopolitica.ru, editor-chefe do Journal of Eurasian Affairs, diretor administrativo do Movimento Eurasiano e membro da sociedade científico-militar do Ministério da Defesa da Rússia.

Artigos: 55

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