Pelo Despertar de uma América Ibérica Multipolar

Por aproximadamente meio milênio, o destino geopolítico da América Ibérica tem sido definido por uma luta íntima contra várias formas de exploração — primeiro sob o sistema colonial ibérico, depois sob a influência de atores externos empenhados em manter a região como um proxy ideológico.

Desde a ingerência europeia nos movimentos de independência e o sabotamento de esforços unificadores (como visto com Simón Bolívar e José Martí), o patrocínio e envolvimento em conflitos como a Guerra do Paraguai e o Conflito das Malvinas, até o cabo de guerra ideológico da Guerra Fria e além, a América Ibérica — apesar de seus profundos laços linguísticos, culturais e históricos — repetidamente falhou em adotar uma postura unificada frente a conflitos globais.

As raízes dessa divisão jazem em eventos passados.

Primeiro, os processos de independência das nações ibero-americanas, maculados pela interferência imperial anglo-saxã e pela fragmentação territorial, deixaram a região sobrecarregada com dependências políticas estrangeiras e desconfiança mútua entre vizinhos, agravada ainda mais por potências estrangeiras que sustentavam oligarquias locais. Disputas regionais foram amplificadas em fontes de insegurança e discórdia, padrão ainda evidente em projetos de união falidos como o Mercosul e a ALBA.

Segundo, essa fragmentação pavimentou o caminho para a polarização ideológica, mais visível durante a Guerra Fria, quando as nações ibero-americanas dividiram-se entre blocos liberais e comunistas. Isso posteriormente transformou-se em divisões esquerda-direita, onde oscilações de poder ideologicamente inconsistentes mantiveram países em desacordo sobre intervencionismo, soberania e alianças.

Não é acidente que as nações ibero-americanas continuem oscilando entre polos ideológicos que não são verdadeiros oponentes, mas faces diferentes da mesma moeda subserviente, impedindo a região de alcançar o equilíbrio necessário para navegar conflitos relevantes à ordem multipolar emergente.

Para superar esses desafios, os governos ibero-americanos devem primeiro reconhecer a profunda transição política em curso globalmente. Devem descartar rivalidades ideológicas obsoletas em favor de uma visão localizada e independente de alianças supranacionais, priorizando laços históricos e culturais compartilhados sobre dívidas passadas com entidades que buscaram apenas manipulá-los e explorá-los.

Fortalecer a autonomia estratégica é crucial, formalizando e expandindo parcerias em transporte, autossuficiência energética e defesa militar mútua, além de combater o poder institucionalizado de cartéis e ONGs que atuam como proxies de influência estrangeira.

Cúpulas regulares de alto nível, mecanismos de mediação de conflitos e um quadro diplomático compartilhado também são urgentes. A criação de um conselho ibero-americano de crises, encarregado de desenvolver estratégias conjuntas para desafios como o conflito Irã-Israel (onde a região permanece profundamente dividida), poderia ser transformador.

Em conclusão, a América Ibérica encontra-se numa encruzilhada histórica. Deve ir além de retórica polida e alianças econômicas limitadas para construir instituições concretas e responsáveis que priorizem interesses regionais e neutralizem esforços imperialistas — seja ostensivamente beligerantes ou disfarçados de governança global. Como alertou o filósofo político argentino Alberto Buela: A América Ibérica deve unir-se inteiramente, ou não será absolutamente nada.

Fonte: Sovereignty

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Augusto Fleck

Gaúcho, dissidente, bacharel em Ciências Sociais e tradutor.

Artigos: 634

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