Bolsonaro realmente se preocupa com a soberania brasileira na Amazônia?

Desde as eleições de 2018, Bolsonaro reuniu em torno de si, como um dos principais grupos de apoio, aqueles ligados ao agronegócio e lideranças e políticos ligados à exploração de madeira e ao garimpo na região amazônica. Sua defesa contra a imposição de nações estrangeiras é importante, mas no fundo, sabemos que seu “nacionalismo” é uma mentira.

A Floresta Amazônica é considerada a maior floresta tropical do mundo, ocupando o território do Brasil, Bolívia, Brasil, Colômbia, Equador, Guiana, Peru, Venezuela, Suriname e mais o território da Guiana Francesa. Sua região é caracterizada pela grande biodiversidade, seja da fauna e flora (com forte presença de espécies nativas); recursos minerais (com reservas de ouro, nióbio, ferro etc.) e hídricos (como, por exemplo, a Bacia do Amazonas, considerada a maior bacia hidrográfica do mundo). No Brasil, a Amazônia ocupa cerca de 59% do território, abrangendo os estados do Acre, Amapá, Amazonas, Maranhão, Mato Grosso, Pará, Rondônia, Roraima e Tocantins.

Algumas iniciativas de cunho econômico foram implementadas na região, como a Zona Franca de Manaus, que é um importante polo localizado na capital do estado do Amazonas. Destacam-se também as de viés militar, como o Projeto Calha Norte, caracterizado como um programa de desenvolvimento civil e militar na Região Norte do Brasil.

Todavia, como de praxe, regiões que possuem grandes reservas de recursos naturais são alvos da cobiça de grupos políticos e de potências mundiais, além da ação de Organizações não-governamentais (ONGs) das quais, se não grande parte, uma parcela considerável delas encontra-se amparada com suporte financeiro e midiático estrangeiro. Tais acontecimentos na região amazônica não são de hoje, vão desde a questão do Rio Pirara1 até discursos mais inflamados incentivando a internacionalização da Floresta, como o do atual presidente francês Emmanuel Macron2. Atualmente, o modus operandi de potências e grupos estrangeiros para desestabilizar e interferir nas questões internas da Amazônia tem sido por meio de ONGs, que instrumentalizam a opinião pública (pelo fato de receberem grande suporte midiático) em prol de políticas que buscam enfraquecer a soberania brasileira da região.

Cabe destacar que existem ONGs que trabalham com seriedade e que de fato defendem a preservação da floresta em prol das populações locais tradicionais (povos indígenas, ribeirinhos, quilombolas etc.) e da manutenção da biota nativa. E cabe ressaltar também que a defesa de tais pautas é de suma importância não só por conta dos fatores citados anteriormente, mas também por um contexto nacional, pois as demais regiões do Brasil (em especial as que têm grande produção agrícola) dependem das chuvas oriundas da Amazônia, fenômeno conhecido como os “rios voadores”3. Todavia, muitas ONGs (que atendem a interesses “alienígenas” aos brasileiros) instrumentalizam tais pautas a fim de passar uma imagem de ineficácia do Estado ao tratar dessas questões, viabilizando pressões internacionais e até mesmo interferência nas decisões do governo brasileiro, tornando a região mais vulnerável a interferências que visam não a manutenção da floresta, mas o seu controle por atores externos.

O Presidente Jair Bolsonaro, desde o início de seu governo, tem sido um crítico ferrenho da presença de ONGs e dos comentários de lideranças estrangeiras acerca da questão Amazônica4. Outro que não poupou críticas a tais atores durante sua gestão foi o ex-ministro do Meio Ambiente Ricardo Salles que, apesar de ter sido um desastre na pasta, levou ao conhecimento do público a presença de tais atores na região. Ambos fizeram questão de ressaltar que cabe ao Brasil a soberania das decisões acerca da Amazônia no seu território, e não a atores externos. Todavia, o que o Governo Bolsonaro tem feito em prol da questão ambiental, política e social da região? E por qual razão o Brasil vem sofrendo fortes pressões internacionais na região nunca vistas antes?

Desde as eleições de 2018, Bolsonaro reuniu em torno de si, como um dos principais grupos de apoio, aqueles ligados ao agronegócio e lideranças e políticos ligados à exploração de madeira e ao garimpo na região amazônica. Outro fator relevante é que Bolsonaro conseguiu votação majoritária em boa parte dos estados que têm forte presença das atividades supracitadas5. Com isso, grupos que antes não se sentiam “encorajados” para desempenharem as atividades de forma explícita (seja por “pressões sociais” ou por questões institucionais), agora têm uma liderança que apoia explicitamente tais atividades6. E o discurso do governo Bolsonaro em prol de tais atividades tem gerado graves consequências para a região, em especial com o aumento do desmatamento (queimadas para abertura de terras cultiváveis, exploração de madeira, avanço das monoculturas de soja etc.), poluição dos cursos hídricos (consequente das atividades garimpeiras) e dos conflitos na região (envolvendo moradores locais que atuam nessas atividades contra servidores que atuam em prol da preservação ambiental, em especial os do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Ambientais Renováveis (IBAMA), Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio) e da Fundação Nacional do Índio (FUNAI)).

O desmatamento na Amazônia sob o governo Bolsonaro aumentou consideravelmente. De acordo com os dados do Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia (IPAM), no período de agosto de 2018 a julho de 2021, o desmatamento no bioma teve um aumento de 56,6% em relação ao mesmo período em anos anteriores (2015 a 2018). Em relação às terras indígenas, essas tiveram uma alta de 153% em comparação com o triênio anterior. Nas Unidades de Conservação, o aumento foi de 63,7%7. Além disso, destaca-se também o fortalecimento das atividades ligadas ao garimpo ilegal, que tem causado inúmeros impactos sociais e ambientais na região. Um dos episódios mais recentes foi a invasão de garimpeiros nas terras Yanomami, onde há estimativas de que existam mais de 40 mil garimpeiros na terra indígena8, localizada no estado de Roraima, resultando em conflitos entre os indígenas e os garimpeiros. Ressalta-se também que um dos principais impactos da atividade garimpeira é a poluição dos corpos hídricos consequente do despejo do mercúrio, que é utilizado para a obtenção do ouro. Um estudo recente apontou que o nível de mercúrio de moradores do Rio Madeira (outro local caracterizado pela forte atividade garimpeira) é 3 vezes maior que o limite admissível9.

O crescimento dessas ações na região não foi por acaso. Além de uma política de estímulo a tais atividades (seja por meio de discursos ou políticas a nível institucional), o Governo Bolsonaro promoveu um forte sucateamento dos órgãos ambientais, em especial do IBAMA, ICMBio e FUNAI; tanto no corte de verba quanto na perda de seus efetivos no quadro de servidores10. Somando-se a isso, há também uma forte perseguição contra os servidores que cumprem fielmente seu trabalho, sendo alguns exemplos:

  • O servidor do IBAMA Roberto Cabral, considerado um dos agentes de fiscalização mais atuantes do IBAMA, foi transferido do setor de operações para a área administrativa. Segundo alguns relatos, posições políticas podem ter motivado tal decisão;
  • O Delegado da Polícia Federal (PF) Alexandre Saraiva, que foi coordenador da Operação Handroanthus GLO que resultou na apreensão recorde de madeira ilegal na Amazônia, realizada em 2021, foi afastado de sua função após apresentar queixa-crime no Supremo Tribunal Federal (STF) contra o ex-ministro do Meio Ambiente Ricardo Salles que agiu em prol das madeireiras11; e
  • Em 2019, o agente indigenista da FUNAI, Bruno Araújo Pereira, coordenou uma megaoperação contra o garimpo no Sudoeste do Amazonas (reunindo agentes da FUNAI, PF e IBAMA), resultando na destruição de 60 balsas que atuavam de forma ilegal no rio Jadiatuba, área onde se localiza 19 povos indígenas isolados. Após quinze dias, Bruno foi demitido do cargo de coordenador geral12;

Além das ações citadas anteriormente, há inúmeras denúncias de assédio contra os servidores de tais órgãos13. Tais ações, além de prejudicarem o trabalho dos servidores em prol da fiscalização ambiental, dão “carta branca” para a ação de criminosos em prol da destruição da floresta. Além disso, outro fator que serve de estímulo para a ação de tais grupos é a cumplicidade das autoridades com aqueles, como foi a de Ricardo Salles em defesa de madeireiros após a operação do Delegado Alexandre Saraiva13.

O Governo Bolsonaro implementou algumas medidas, como a reativação e reestruturação do Conselho da Amazônia, presidido pelo vice-presidente Hamilton Mourão. Apesar do Conselho reunir ministros de várias pastas, ele não inclui a participação dos servidores dos órgãos de fiscalização, que teriam grande contribuição no combate ao desmatamento e implementação de ações de preservação na região. Além disso, destaca-se também o uso das Forças Armadas na Amazônia, que apesar de terem um papel fundamental na defesa e soberania da região, não têm impedido o avanço do desmatamento. Outra medida também adotada por Bolsonaro foi a parceria com o bilionário Elon Musk para auxiliar no monitoramento da Amazônia; entretanto, o Brasil já dispõe de uma forte rede de satélites (em especial os utilizados pelo INPE) para auxiliar no combate ao desmatamento, além do fato de Elon Musk ter ficado conhecido por ser um dos incentivadores do Golpe de Estado na Bolívia em 2019, que ocasionou a derrubada do então presidente Evo Morales, sendo a questão do lítio fundamental para isso, pois a Bolívia é a maior detentora de reservas do material no mundo. E a região Amazônica brasileira possui grandes reservas de vários materiais. Então, certamente, interesses econômicos estão envoltos em tal acordo, até mesmo acima de qualquer “filantropia”.

Por consequência do desleixo e das políticas pouco efetivas do Governo Bolsonaro sobre a Amazônia, a pressão internacional contra o Brasil tem aumentado consideravelmente. Desde falas sobre sua “Internacionalização” (proferidas por Macron) até um possível boicote na importação de produtos agrícolas brasileiros oriundos de áreas desmatadas. Além disso, em diversos fóruns internacionais, o discurso sobre o desmatamento na região tem se fortalecido, pavimentando o caminho para futuras ingerências na soberania brasileira na região.

Apesar das críticas relevantes de Bolsonaro contra as ingerências externas, o mesmo não tem feito muitos esforços para evitá-las. O discurso e as ações do atual mandatário não visam a preservação da soberania brasileira na região, mas sim o seu saque e exploração indiscriminada por atores internos (sendo, muitos deles, grupos que apoiam seu governo). Ou seja, o discurso contra as ONGs e a cobiça internacional não têm efeito algum quando não se fortalece a presença do Estado na região.

A presença do Estado na região amazônica é fundamental, pois visa fortalecer a preservação ambiental, o combate ao crime organizado na região (seja os que envolvem os recursos naturais ou até mesmo o narcotráfico), e a proteção das comunidades locais, em especial as mais tradicionais (indígenas, ribeirinhos, quilombolas, seringueiros etc.), além de fortalecer a soberania brasileira na floresta. Tal presença se faz pelo uso das forças armadas e o fortalecimento dos órgãos ambientais responsáveis pela fiscalização e conservação da biota, além de incentivar mecanismos na região que proporcionem o desenvolvimento econômico e social, atendendo aos milhões de brasileiros que lá se encontram. Essas ações devem, acima de tudo, aproveitar os programas e projetos já implementados por governos anteriores (Zona Franca de Manaus, Projeto Calha Norte, Conselho da Amazônia etc.) e fortalecê-los, integrando-os dentro de uma visão de política soberana na região amazônica.

Com isso, até mesmo a presença de ONGs alienígenas aos nossos interesses será combatida, pois essas organizações crescem, muitas das vezes, por conta do “vácuo” resultante da ausência do Estado na região, sujeitando as populações locais à influência daquelas.

Entretanto, pouco há de se esperar de alguma ação efetiva de um governo liberal que prega o oposto de um Estado forte (como é o caso do Governo Bolsonaro), pois o que precisamos para a Amazônia é mais Estado.

Referências

1 https://www.youtube.com/watch?v=8H8Obxeu5oo

2 https://oglobo.globo.com/brasil/macron-diz-que-debate-sobre-internacionalizacao-da-amazonia-esta-em-aberto-23905759

3 https://www.nationalgeographicbrasil.com/ciencia/2021/03/posso-explicar-rios-voadores-da-amazonia-brasil-deserto

4 https://g1.globo.com/politica/noticia/2019/08/26/bolsonaro-questiona-interesse-de-macron-em-ajudar-no-esforco-contra-queimadas-na-amazonia.ghtml

5 http://especiais.g1.globo.com/politica/eleicoes/2018/mapa-da-apuracao-no-brasil-presidente/2-turno/

6 https://www.istoedinheiro.com.br/na-defesa-do-garimpo-bolsonaro-cria-programa-de-apoio-a-mineracao-artesanal/

7 https://ipam.org.br/desmatamento-na-amazonia-cresceu-566-sob-governo-bolsonaro/

8 https://www.brasildefato.com.br/2022/05/05/temos-medo-de-mais-mortes-os-yanomami-estao-desaparecendo

9 https://g1.globo.com/am/amazonas/noticia/2021/12/15/apos-garimpo-em-massa-mercurio-no-organismo-de-moradores-do-rio-madeira-e-3-vezes-maior-que-limite-admissivel.ghtml

10 https://www.dw.com/pt-br/corte-de-verba-refor%C3%A7a-desmonte-da fiscaliza%C3%A7%C3%A3o-ambiental-no-brasil/a-57327500

11 https://veja.abril.com.br/coluna/maquiavel/delegado-deixa-inquerito-sobre-apreensao-recorde-de-madeiras-na-amazonia/

12 https://noticias.uol.com.br/colunas/carlos-madeiro/2022/06/15/ultima-operacao-de-bruno-enfureceu-garimpo-e-fez-funai-travar-grandes-acoes.htm

13 https://www.metropoles.com/brasil/ricardo-salles-e-cobrado-por-deputados-apos-defender-madeireiros

Imagem padrão
Nova Resistência
Artigos: 596

Deixar uma resposta