Somente as massas trabalhadoras são as verdadeiras criadoras da História, e o verdadeiro socialismo somente pode ser construído pelo trabalho criador de milhões de trabalhadores.
O conceito de classe possui um sentido duplo. Por um lado, expressa a constatação de um fato: a sociedade se divide em dois grandes grupos – dos que possuem os meios de produção e o dos que não possuem nenhuma porção destes meios de produção e que, por isso, caem na dependência dos primeiros. O primeiro grupo é a classe dos proprietários (os burgueses), e o segunda é a classe trabalhadora (os proletários). Por outro lado, a classe é também a parte politicamente ativa da classe trabalhadora, consciente de sua situação, e que está determinada a transformá-la.
A estruturação do conceito de classe exige uma consciência determinada, do mesmo modo que, em certo momento, o exigiu a formação de uma consciência estamental (na sociedade feudal), ou da cidadania (nas democracias burguesas). Não é indubitável que o trabalhador industrial, simplesmente por sua condição social, forma automaticamente parte do coletivo politicamente ativo da classe proletária. São necessários conhecimentos e, sobretudo, a vontade resoluta de incluir-se na classe do proletariado. Somente se pertence à classe trabalhadora, em um sentido de luta, quando se quer pertencer a ela. Neste sentido, somente uma limitada porção dos proletários está capacitada e sabe o que quer: esta se eleva sobre a massa quando toma consciência de classe – torna-se, então, advogada dos interesses do proletariado e, caso seja necessário, um revolucionário profissional, funcionário ou dirigente.
Os trabalhadores com consciência de classe, deste modo, se convertem nos eleitos, na elite de uma vanguarda de combatentes da causa da classe trabalhadora. Somente eles sabem o que o proletariado necessita, suas carências, e somente eles estão em uma posição adequada para compreender e velar pelos seus interesses com sucesso e funcionalidade. É assim que a ideia de classe se converte em um princípio edificador de uma nova elite – elite que superará as elites aristocráticas da sociedade feudal e as elites burguesas das democracias capitalistas; uma nova elite de, e para a classe trabalhadora. Uma elite, no mais, fundamentada sobre a Técnica.
A perspectiva de classe contém um propósito agressivo. Para a burguesia, o sentido da ideia de Nação foi o de ocultar que as diferenças entre proprietários e despossuídos tivesse algum significado: a democracia parlamentar também caminha para um encobrimento de tipo similar. É o axioma do Estado burguês que as diferenças econômicas sejam uma questão que pertença a esfera privada, e nunca algo a ser considerada pública e politicamente.
A perspectiva de classe, não obstante, sem qualquer ilusão coloca-se contra ambas tendências enganadoras burguesas. Ela não apenas esclarece o duro significado destas diferenças, como enfatiza o seu papel decisivo e central. Enquanto foi possível esconder seu peso, o proprietário burguês, servindo-se de uma afirmação de igualdade, pôde sustentar a crença de que não existiam diferenças significativas entre eles, a classe dirigente, e os despossuídos, a classe explorada. A perspectiva de classe, porém, rompe com semelhante crença nas mentes dos despossuídos – algo que sacode os fundamentos da ordem burguesa.
A perspectiva de classe fundamenta a solidariedade entre os despossuídos frente aos possuidores. O burguês, logo, tem todos os motivos para odiá-la profundamente. É compreensível desgosto do burguês quando ouve falar da “classe burguesa” – é o discurso do “proletário incitado” que, para sua desgraça, se esclareceu sobre eles.
Existem identidades sociais de todos os tipos, fundacionais no passado. O que, para os aristocratas feudais, foi Deus, para a burguesia foi o “povo” (ou o cidadão), e são as massas para os trabalhadores com consciência de classe.
O destino das elites está tão ligado aos princípios que as legitimam que ela existe e morre com eles: isto é particularmente válido quando tal princípio é descoberto e submetido à especulação. As especulações podem ser alienantes ou desalienantes, isso depende se a mente especuladora pensa para elite ou contra ela. No primeiro caso, o princípio se transforma no portador de todos os valores positivos, sendo a promessa e a base de toda realização. No segundo, em troca, é a fonte de todas as desgraças. A mesma posição que se sustente frente à elite, na prática toma-se também fundamento teórico.
A elite da classe trabalhadora, aqueles que alcançaram a consciência de si mesmos e de sua própria situação, que se reuniram ao redor do estandarte da consciência de classe, especulam, por conseguinte, sobre a “massa”. Escuta o pulsar da massa. Se dobra ante sua vontade. O trabalhador com consciência de classe se desvanece na massa, deseja somente cumprir sua vontade, ser arrastado por ela. Não ousa dar nenhum passo por sua própria conta e risco – qualquer movimento deve ser legitimado pela massa.
A nação já não pode seguir com sua ordem estruturada em camadas sociais: esta já foi liquidada, do mesmo modo que a burguesia não teve escrúpulo algum com os aristocratas – nenhuma elite já podia existir para além da nação, e qualquer um que estivesse à margem desta noção, foi qualificado como antinatural e foi esmagado, perdendo seu direito de existir. Não menos intolerante deve ser a classe trabalhadora. Nenhuma outra elite deve existir paralelamente a ela. Somente quando se consiga liquidar os últimos restos da elite anterior, é que se poderá alcançar a sociedade sem classes. Esta carecerá de classes porque a classe trabalhadora terá abarcado a totalidade, e sua exigência, por ser o único órgão da massa, não deverá voltar a ser posta em questão por nenhum poder social.
Cada elite têm suas armas particulares para se impor. O antigo regime (feudal-estamental) confiou na espada. Com ela, derrotava todos que ousassem se levantar contra sua ordem e encontrava-se o respeito e a comodidade que lhe eram tão necessários. O Estado burguês confiou em seu dinheiro. Na possessão, que determinava o nível de privilégios e oferecia os meios de financiar uma existência melhor, assim como a compra da servidão e da submissão, com a qual os proletários acabavam por ser aqueles que carregavam todo o peso social. A classe trabalhadora, do mesmo modo, fundamenta seu futuro no poder da Técnica. Embora os Estados burgueses já houvessem compreendido e desenvolvido o poder da Técnica sobre sua tutela, isto só foi feito desde a perspectiva da rentabilidade – se não era rentável, não havia desenvolvimento. Além disso, tal interesse na Técnica centrou-se nas energias da Natureza: dominar as forças da Natureza foi a meta da técnica para eles. A sociedade poderia abandonar-se a si mesma. Somente a desgosto, e obedecendo a força das circunstâncias, começou-se a organizar ela também na Técnica.
A classe, por outro lado, quer a totalidade da capacidade da Técnica – quer mobilizar tanto as energias naturais, quanto as sociais que dele emergem. Ela calcula o imenso poder que possui a Técnica. A sociedade, em seu conjunto, será uma grande maquinaria, e aquele que tenha suas mãos nas alavancas e botões será o condutor na totalidade. A classe trabalhadora sente-se chamada pela História a manejar estas alavancas e botões elementares.