Metafisicamente, o tempo pode ser concebido em uma perspectiva linear, mas isso não passa de uma ilusão ótica.
Desde nossos primeiros aprendizados, estamos acostumados com a ideia do tempo como uma linha, como um lançar de uma flecha. Neste sentido, uma vez que estamos diante apenas de mera duração e irreversibilidade, o Ano Novo torna-se algo despido de significado. Mas se situarmos o Ano Novo dentro da lógica do templo cíclico, da temporalidade das estações, o resultado é inverso – neste caso, a morte pode dar lugar a vida, e a serpente morde sua própria cauda, no eixo de um fenômeno anti-monotômico, anti-físico, que reflete as demais camadas de nossa consciência.
O conceito de temporalidade linear gera um espinhoso problema para a física. Na física, existe o fenômeno da bifurcação, que ocorre quando uma partícula encontra-se diante de uma seleção, ou seja, diante de uma possibilidade de orbitação. Os físicos entendem a bifurcação da seguinte forma: a partícula realmente não sabe para onde vai se locomover, sendo a probabilidade de orbitar para a direita ou para a esquerda a mesma. Geralmente, pensamos que, quando a partícula se move, houve um fluxo irreversível de tempo, mas, na verdade, a linha do tempo colapsa, porque o tempo, em si, é dividido, bifurcado: o que exige de nós um modelo diferenciado de tempo. Se a partícula puder se mover com a mesma probabilidade para qualquer direção, então o tempo não tem apenas comprimento, mas também área.
Gaston Bachelard falou sobre a relevância da imaginação para uma ciência rigorosa. Assim, se admitirmos este plano temporal, então a partícula, em algum sentido, obtém liberdade de escolha. Se reconhecermos a espacialidade do tempo, estamos diante de um futuro em aberto: emergimos do domínio da linearidade do tempo e o Ano Novo torna-se possível: talvez algo novo aconteça, uma história alternativa (como em The Man in the High Castle), uma escolha que ainda não fizemos, algo não fugaz e que possui um caráter ontológico, que não existe como possibilidade, mas como ato.
Se alterarmos a representação geométrica do tempo, chegamos a conclusões muito interessantes.
O Ano novo é um feriado de liberdade, é sobre o fato de que o próximo ano não será tão linear e repulsivo como o anterior. Nossa tarefa, como Pessoas, é encontrar a ponte para um Ano Novo em nós mesmos, para que possamos permitir que o novo começo se torne realidade. Nós construímos fatalidades lineares por nós mesmos, mas existem outras vias: o ponto de bifurcação, quando a linha do tempo se transforma numa cobra que captura sua própria cauda, pode ser uma ocasião para pensar sobre o que é a verdadeira liberdade, e que não é muito tarde para alterar o curso das coisas.
Para onde quer que formos, sempre iremos errar, mas isso não significa que o atual curso das coisas seja correto: continuar nele é que será um erro. Há uma ocasião para a liberdade, no Ano Novo, que é o fracasso das ideias deterministas, quando um horizonte de possibilidades se abre para nós, situado-nos noutro espaço existencial, cuja abertura se inicia em nós [antropologicamente]. O Ano Novo é uma excelente ocasião para pensar sobre isso.