“Precisamos elevar os olhos além dos horizontes de cada país, para abranger o Continente americano”
Discurso pronunciado em Porto Alegre em 24 de setembro de 1935 em ocasião do centenário da Revolução Farroupilha.
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Meus Senhores: Na qualidade de riograndense e
como Presidente da República, levanto-me junto ao fogão gaúcho para dirigir algumas palavras de amizade e de cumprimento às brilhantes delegações estrangeiras que, com a sua presença, vieram abrilhantar as festividades comemorativas do Centenário Farroupilha. Não devemos esquecer o caráter excepcional que essas delegações emprestam a este ato, revestindo-o de significação toda especial.
Temos uma embaixada da República Argentina, um dos países mais ricos e bem organizados da América, que para aqui enviou, além de um dos seus vasos de guerra, uma esquadrilha de aviões, e, como Embaixador, o Contra-Almirante Leon Scasso, figura de grande destaque no seio da gloriosa Marinha da República irmã. Temos a representação da República do Uruguai, não menos brilhante, chefiada por um Ministro de Estado, o Sr. Augusto César Bado, espírito jovem e culto, pertencente à nova geração intelectual uruguaia. Temos, enfim, a representação da República do Paraguai, chefiada pelo ilustre Ministro da Justiça e Educação desse país amigo, homem culto e de elevada projeção nos meios educacionais, enviado em visita especial ao Brasil, no desempenho de uma missão cultural, que tanta simpatia tem por nós, — o Paraguai, que ainda utiliza como linguagem nacional o idioma nativo de seus filhos.
Todas as vozes que se fizeram ouvir nas celebrações a
que temos assistido timbram em acentuar, confirmadas
pelos aplausos gerais, o caráter de brasilidade, não só do grande acontecimento histórico que se comemora, como também dos sentimentos externados nas manifestações oficiais e populares promovidas em homenagem aos heróis da epopéia de 1835. Esses sentimentos e afirmações da unidade pátria, tão vivos no povo riograndense, são os mesmos que dominam os povos argentino, uruguaio e paraguaio, como o Brasil, nações soberanas e perfeitamente concientes dos seus altos destinos.
Precisamos elevar os olhos além dos horizontes de cada país, para abranger o Continente americano, numa confraternização afetiva e duradoura. No momento em que as velhas nações, de civilização exausta, procuram limitar-se aos seus domínios coloniais para abastecimento de matérias-primas dos produtos lançados ao consumo mundial pelos países americanos, nada mais natural que estes se unam e congreguem, na legítima defesa dos seus interesses. Defrontando as barreiras levantadas sobre o nacionalismo econômico, na preocupação de fechar ainda mais o círculo da economia mundial, as nações do nosso Continente precisam abater os obstáculos que as separam, sejam fiscais ou sejam de simples distanciamento político, guardando, embora, intacta a sua soberania. Constituirão, assim, um resistente bloco econômico, político e financeiro, capaz de reagir contra a depressão geral e de salvaguardar os interesses comuns dentro das atividades pacíficas e construtivas e sem espírito de hostilidade. O exemplo desta comemoração é sugestivo e animanos a não considerar uma utopia a possibilidade de nos unirmos, formando uma só família e transformando, dessa forma, o Continente americano em Continente da Paz.
Ergo o meu copo à fraternidade dos países americanos, exultando pela feliz oportunidade, que se me oferece, para este apelo, que me permite entrever o novo rumo das nossas relações continentais e de cujo fortalecimento há de resultar, sem dúvida, maior garantia para o bem e a paz da humanidade.