Lula diante da escada do caos

Como bom “tubarão do mercado”, Trump sentiu o sangue na água e lançou uma ofensiva político-econômica contra o Brasil. Agora Lula está diante da encruzilhada: ceder e estender o pacto de vassalagem com os demônios ianques, ou agarrar a escada do caos e assumir nossa vocação regional na multipolaridade.

O empresariado tem um certo apreço pela analogia do “tubarão” para designar grandes investidores com a capacidade de movimentar o mercado e tendências políticas, internas e externas. Os dois períodos da presidência de Donald Trump são marcados por uma prevalência do seu comportamento como empresário para ditar o comportamento geopolítico e as idas e vindas de ameaças, taxações e embargos.

Como um bom “tubarão”, Trump sentiu o sangue na água pelo clima um tanto dissonante entre os BRICS, como na ausência de Putin e Xi no Brasil, seus dois maiores representantes, e certas indisposições discursivas entre Lula e seus aliados. Somando aqui acenos positivos aos EUA e UE em negociações econômicas, temos um campo propício para uma tentativa de forçar a mão de um Lula cujo mandato atual é de longe o seu pior.

Apostando ainda fortemente na tendência de neutralidade do governo Lula em relação aos grandes reorientações multipolares, Trump aproveitou o desserviço apátrida de Eduardo Bolsonaro para iniciar uma campanha de pressão política sobre o Brasil, que culmina hoje na taxação de 50% sobre as importações brasileiras.

A lógica de Trump é simples: Se Lula comprar a briga, ele está no meio de uma indisposição com aliados chineses e russos para garantir qualquer substituição de exportações e realocar potenciais perdas comerciais do empresariado brasileiro sem perdas excessivas ou concessões desiguais. Se Lula ceder, os EUA ganham mais terreno no desejo de nos manter como quintal político e econômico, aumentando a cisão e desconfiança de outros agentes globais com o governo brasileiro, além de fortalecer a já predominante teoria de que Lula é incapaz de pensar com realismo sobre soberania.

Ao mesmo tempo, ele sugere manter a cartada bolsonarista para culpar Lula pelo fracasso na política internacional e alavancar a própria coalizão política para 2026.

Para Lula, esse é um momento de decisão, um dos mais oportunos momentos para agarrar aquela disposição metafísica e sebastianista de seus seguidores mais ardentes. Se comprar a briga com Trump e fizer os movimentos certos de adequação econômica, mesmo com os trancos e barrancos previsíveis em circunstâncias como essa, ele nos coloca finalmente na posição de agente central para uma guinada multipolar da América Ibérica.

Lula precisará peitar as pressões do Itamaraty, do Banco Central, da Embaixada ianque e colocar os políticos, banqueiros e demais elites acomodadas nos seus devidos lugares, algo que nunca fez e nunca mostrou ter a disposição pra fazer.

Trump quer semear o caos, e está na hora de Lula compreender que o caos é uma escada. Ele já teve a oportunidade de subir, cair, e retornar… Mas uma hora é preciso ou escalá-la de vez, ou ela quebrará seu espírito.

Lula precisará ser o “pai” que boa parte do povo brasileiro sempre ansiou que ele fosse, mas cuja vocação, se a teve, nunca abraçou de todo.

Insistimos diariamente que os ventos da história urgem por uma posição firme e derradeira, uma demonstração de soberania e hegemonia regional. As cadeiras estão sendo dispostas e o cosmos pede que Lula dê sua resposta sobre onde o Brasil se sentará… Na mesa que discutirá os destinos das nações, ou nos bancos escuros de quem se senta atrás dos verdadeiros jogadores.

É agora ou nunca.

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Augusto Fleck

Gaúcho, dissidente, bacharel em Ciências Sociais e tradutor.

Artigos: 634

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