O carro-chefe da ideologia hegemônica é o transumanismo, uma nova forma de eugenia que visa não simplesmente “aprimorar” a espécie humana, mas fazê-la se desenvolver em uma direção que seria impossível para os próprios genes.
O eugenismo foi uma prática frequente e abertamente adotada na maioria das civilizações. A Europa católica – mais do que a protestante – foi uma notável exceção. Por isso, não é surpreendente que a modernidade secularizada tenha provocado um retorno do eugenismo. No entanto, este eugenismo moderno é muito diferente dos eugenismos antigos. Úteros artificiais, bebês geneticamente modificados, implantes neurais, exoesqueletos… O futuro já chegou.
A partir do século XVIII, reaparecem na Europa reivindicações eugenistas. Condorcet, por exemplo, propõe aperfeiçoar a espécie humana como se melhora o gado. O próprio termo só aparece em 1883, cunhado por Francis Galton, primo de Darwin, do grego eu (“bem”) e gennaô (“gerar”). A ideologia eugênica se espalha rapidamente, e são incontáveis os cientistas, ganhadores de prêmios Nobel, estadistas e instituições que a defendem e, em alguns casos, a colocam em prática, como em campanhas de esterilizações forçadas.
Tudo muda quando os nazistas aplicam brutalmente esse programa. O eugenismo passou a ser muito mal visto pela opinião pública. Para sair desse impasse, Julian Huxley e Pierre Teilhard de Chardin propuseram em 1957 substituir o termo “eugenismo” por “transumanismo”. Desde então, o que chamamos de transumanismo é, na realidade, o eugenismo moderno.
O eugenismo negativo
O eugenismo é primeiramente negativo. Antigamente, eliminavam-se as crianças indesejadas após o nascimento: isso era a exposição. Hoje, também se eliminam crianças indesejadas, mas antes do nascimento. Os avanços das ultrassonografias permitiram eliminar 97% dos casos de síndrome de Down. A reprodução assistida (PMA) está no centro do eugenismo. Para realizar uma fertilização in vitro (FIV), criam-se vários embriões, geralmente cinco, mas às vezes até trinta. Antes da implantação no útero da mãe, todos esses embriões são examinados por meio do diagnóstico genético pré-implantacional, que permite escolher o embrião com o perfil genético mais desejável. Os embriões excedentes, os filhos potenciais indesejados, são eliminados. Alguns são usados para experimentos. Outros servem como matéria-prima para as células-tronco tão cobiçadas por bioengenheiros e pela indústria cosmética.
As FIVs representam 3% dos nascimentos na França, o que é pouco. No entanto, esse número cresce 10% ao ano, o que é muito. Especialistas preveem que o ponto de virada será em 2045, quando a maioria dos nascimentos ocorrerá por PMA. A reprodução artificial e, consequentemente, a seleção de embriões rapidamente se tornarão a norma.
Humanos sob medida
O próximo grande avanço será a ectogênese, o útero artificial. Os embriões fabricados in vitro não serão mais implantados no ventre de uma mulher, mas em uma espécie de cápsula onde o feto se desenvolverá. A procriação não implicará mais a gravidez. Em breve começará o mundo sem mães, dos filhos das máquinas. A ectogênese está quase pronta, tornando a gestação por substituição (GPA) obsoleta. Além disso, já é possível fabricar os gametas masculinos e femininos necessários para a FIV a partir de células da pele, permitindo a procriação por casais homossexuais ou pessoas solteiras. Gerar filhos não será mais o monopólio de casais heterossexuais. O wokismo é uma das faces do eugenismo moderno.
O eugenismo não é apenas negativo (eliminação), mas também positivo. Antigamente, tentava-se reservar as fêmeas para os melhores reprodutores, por exemplo, por meio da poligamia, que privava muitos homens de mulheres em benefício do harém dos machos dominantes. Agora, a tecnologia permite ir muito além. É possível intervir no processo de procriação para otimizar bebês por meio de manipulações genéticas. A invenção revolucionária das ferramentas CRISPR-Cas9 permite cortar, copiar e colar sequências de DNA conforme desejado. Não se trata mais apenas de escolher a cor dos olhos, o sexo ou a altura do bebê, mas de determinar todas as suas características, incluindo seu QI. A lei de bioética de 2021 na França até mesmo autoriza pesquisas sobre quimeras, as hibridizações entre humanos e animais.
Bebês geneticamente modificados (BGM) já não são ficção científica. Os primeiros foram criados na China em 2018, modificados para serem imunes ao HIV. Após uma indignação inicial, outros países rapidamente se mobilizaram para não ficarem para trás. Quimeras também já existem. Entre outros monstros, há uma flor de Kac com sangue humano em vez de seiva, um coelho cruzado com uma água-viva para ser fluorescente, e um rato com uma orelha humana nas costas.
Teleguiar o vivo
O eugenismo tecnológico moderno não é apenas negativo (a seleção de embriões) e positivo (os BGM – Bebês Geneticamente Modificados), mas também contínuo. Não se trata apenas da concepção, mas de todo o decorrer da existência, que pode ser aprimorada. Para isso, o ser humano é hibridizado com a máquina. Isso já é possível graças à convergência das tecnologias NBIC, que combinam os avanços de quatro áreas revolucionárias: nanotecnologias, biotecnologias, informática e ciências cognitivas.
Não é brincadeira. Entre 2014 e 2020, a Europa investiu nada menos que 79 bilhões de euros no programa de pesquisa NBIC denominado KET, investimento obviamente muito inferior aos dos americanos ou chineses. Os avanços são impressionantes. Graças a implantes cerebrais, um macaco consegue teleguiar um braço mecânico com o pensamento. A conexão cérebro-máquina também funciona no sentido inverso: já existe um rato teleguiado. Com o simples ato de digitar no teclado de um computador, é possível fazê-lo ir e vir conforme desejado. A empresa de Elon Musk, Neuralink, já começou a implantar dispositivos em seres humanos e anunciou recentemente que um de seus voluntários conseguiu manipular o cursor de um computador com a mente.
O eugenismo moderno, agora chamado de transumanismo, opera por meio da seleção de embriões, modificações genéticas e hibridização entre homem e máquina. Um discurso bem-intencionado finge visar à eliminação de doenças, mas, na realidade, trata-se de aprimoramento, não de terapia. Na França, 15% das FIVs (Fertilizações In Vitro) já são realizadas sem qualquer justificativa terapêutica, apenas para aproveitar a seleção de embriões. A artificialização da procriação também permite sua mercantilização.
Esse aprimoramento do homem não tem nada a ver com os antigos melhoramentos de árvores ou do gado, que se baseavam em seleções e cruzamentos. O cavalo e o jumento são espécies que podem cruzar, resultando em uma mula. No entanto, o coelho e a água-viva, ou o homem e a máquina, não têm essa possibilidade. A técnica força a natureza a ultrapassar os limites de seu possível, obrigando as células a produzir o que jamais fariam por conta própria. O homem é considerado uma matéria-prima mutável, líquida, sem consistência, sem essência, sem natureza e sem finalidade, que pode ser alterada à vontade. O ser humano torna-se massa de modelar, indefinidamente manipulável. Esse é o credo cibernético formulado nos anos 1940 por Norbert Wiener e aplicado à biologia desde Schrödinger.
Homo deus
O transumanista deseja criar a si mesmo, fazer de si tudo o que quiser. Ele aspira a ser causa sui e sonha em se tornar imortal, sempre jovem e belo, superinteligente e dotado de superpoderes. Utiliza a ciência para fazer de si um deus. É exatamente a mentira da serpente no Jardim do Éden: “Se comerem do fruto da árvore do conhecimento, serão como deuses.” O transumanismo é a consumação do pecado original.
O eugenismo moderno tem o mesmo objetivo que o eugenismo arcaico: melhorar o homem, mas agora com meios tecnológicos que permitem aprimorá-lo modificando-o. A consequência é imensa. O transumanismo conduz ao surgimento de uma nova espécie, um pós-humano produzido pela técnica. O transumanismo é a substituição definitiva do natural pelo artificial, do espontâneo pelo planejado, do homem pelo ciborgue. Evidentemente, os rápidos avanços técnicos implicarão para os pós-humanos atualizações frequentes. O transumanismo promete nos libertar da natureza e de suas restrições, mas ao custo de uma servidão à técnica e às multinacionais que a controlam.
Não escaparemos dessa mudança antropológica sem precedentes. Primeiro, porque os engenheiros entusiasmados com a engenharia do vivo, os banqueiros sedentos de lucros imensos, os militares e os governantes ávidos por poder fazem de tudo para impô-la. Uma pesquisa de 2016 revelou que 72% dos franceses consideram o transumanismo e o homem aumentado como algo positivo. Em segundo lugar, porque a fertilidade masculina está desmoronando devido à poluição industrial. Ela caiu 60% entre 1973 e 2011, uma queda que está se acelerando e se globalizando. Tudo indica que, em algumas décadas, será difícil conceber filhos sem reprodução assistida. Por fim, o transumanismo será obrigatório, não porque será imposto por Estados totalitários, mas porque será imposto pelo mercado. Amanhã, quem encontrará um emprego sem um dispositivo de cognição aumentada (para executivos) ou um exoesqueleto (para operários)? O transumanismo, que hoje está em seus primórdios, tende a se impor tão inevitavelmente quanto os smartphones. Não se vê o que poderia impedi-lo, a não ser talvez o colapso do sistema tecnocapitalista causado pelo colapso ecológico.
Os desprovidos ou os refratários que não se aumentarem se tornarão sub-humanos supérfluos, ameaçados de extinção se a fertilidade continuar a diminuir. Isso será conveniente para os aumentados: o pedaço restante da Terra não precisa de bocas inúteis. Ray Kurzweil, figura central do transumanismo e responsável pela IA no Google, disse claramente no jornal Libération: “Haverá pessoas implantadas, hibridizadas, e essas dominarão o mundo. […] Aqueles que decidirem permanecer humanos e se recusarem a se aprimorar terão uma séria desvantagem. Constituirão uma subespécie e formarão os chimpanzés do futuro.”
Somos os últimos dos humanos.
Fonte: Éléments