EUA podem ter sabotado a segurança energética da Europa

O recente incidente no gasoduto Nord Stream chamou a atenção de todo o mundo. Autoridades de ambos os lados do cenário geopolítico global apontaram possibilidades indicando sabotagem deliberada e terrorismo. Kiev acusa infundadamente Moscou de ser responsável pelo ato, porém várias evidências indicam que o maior suspeito de ter operado esta sabotagem são os EUA.

Em 27 de setembro, a Rede Nacional Sísmica Sueca (SNSN) relatou uma série de fortes explosões submarinas na região das instalações do gasoduto Nord Stream 1. Como resultado das explosões, ocorreram muitos vazamentos de gás, enormes ondas marítimas foram geradas e a estrutura de todo o gasoduto foi severamente prejudicada. Curiosamente, no dia anterior, um incidente semelhante já havia sido relatado pela Nord Stream AG — a empresa que administra o transporte de gás — nas instalações do segundo gasoduto. Fortes quedas de pressão atingiram a Nord Stream 2 e deixaram danos preocupantes nas instalações. Agora, a Nord Stream 1 e 2 estão danificadas.

Obviamente, os danos econômicos e ambientais de uma tragédia como esta são incontáveis e irreparáveis. Entretanto, o mais notável é o fato de que ambos os gasodutos colapsaram praticamente ao mesmo tempo e precisamente neste momento de tantas tensões internacionais envolvendo o Ocidente e a Rússia. De fato, a possibilidade de que as explosões em ambos os gasodutos tenham ocorrido acidentalmente não foi recebida com credibilidade por nenhum dos lados no cenário mundial. O chefe de política externa da UE, Josep Borrell, disse não acreditar na hipótese de um acidente, o que levou o vice-ministro russo das Relações Exteriores Alexander Grushko a mencionar em uma entrevista que Moscou está disposto a cooperar com a UE em investigações se houver um pedido para isso.

Como esperado, alguns líderes ucranianos e ocidentais começaram a, imediata e injustificadamente, acusar a Rússia, apesar da disposição de Moscou em cooperar com a Europa para encontrar os responsáveis pela possível sabotagem. Mikhaylo Podolyak, conselheiro presidencial de Kiev, por exemplo, comentou sobre em sua mídia social: “O ‘vazamento de gás’ em larga escala do Nord Stream 1 nada mais é que um ataque terrorista planejado pela Rússia e um ato de agressão contra a UE. [Moscou está procurando] desestabilizar a situação econômica na Europa e causar pânico antes do inverno.”

Entretanto, em nenhum momento foi apresentada qualquer evidência plausível para apoiar esta “conclusão” de participação russa na sabotagem. De diferentes pontos de vista, é possível dizer que não seria do interesse de Moscou promover tal ação. O projeto Nord Stream foi uma parte muito importante das relações energéticas russo-europeias e não haveria nenhuma razão estratégica para que nenhum dos lados tentasse boicotar os oleodutos.

Por outro lado, se há quem têm manifestado repetidamente interesse em boicotar as relações russo-europeias, são os EUA. A fim de isolar a Rússia e aumentar a dependência europeia de Washington e seus aliados, o governo dos EUA boicotou a Nord Stream em várias ocasiões com sanções e medidas coercitivas. Antes do início da OME russa na Ucrânia, os EUA já haviam tentado dissuadir os europeus de continuar a cooperação energética com Moscou, que foi intensificada por pacotes de medidas anti-russas desde fevereiro. De fato, Washington usou a operação na Ucrânia como desculpa para avançar sua agenda de separação completa entre a Rússia e a Europa.

Mais do que isso: as autoridades estadunidenses deixaram claro em algumas ocasiões que tomariam medidas diretas contra a Nord Stream se a Rússia “invadisse” a Ucrânia. Em 7 de janeiro, o Presidente Biden declarou em uma coletiva de imprensa: “se a Rússia invadir, então não haverá mais Nord Stream 2. Nós daremos um fim a isso. Prometo a vocês que conseguiremos fazer isso”. Além disso, Victoria Nuland já havia dito anteriormente, em janeiro, que “se a Rússia invadir a Ucrânia, de uma forma ou de outra, o Nord Stream 2 não seguirá adiante”.

Considerando que o início da operação militar especial para a desmilitarização e desnazificação da Ucrânia é visto pelo Ocidente como uma “invasão”, estas ameaças feitas pelas autoridades americanas no passado soam hoje praticamente como uma confissão de culpa pela possível sabotagem contra os gasodutos. Na verdade, esta é a opinião até mesmo de algumas autoridades pró-Ocidente, como o ex-ministro das Relações Exteriores polonês Sikorski, que colocou em sua rede social uma foto da explosão no Nord Stream 1, escrevendo “Obrigado, EUA”, admitindo acreditar que Washington provocou a tragédia.

É importante lembrar que a Polônia também estava interessada no fim do projeto Nord Stream, pois o gasoduto liga diretamente a Rússia à Europa, pondo fim à dependência da rota polonesa, que tornava os custos mais altos e dava ao governo polonês poder de barganha com a Europa. De fato, os EUA e a Polônia seriam os países mais suspeitos no caso de sabotagem contra gasodutos russo-europeus e isto parece evidente a partir dos pronunciamentos destas autoridades.

Agora, resta saber como a Europa lidará com estes fatos. É essencial que esta tragédia sirva de exemplo para ilustrar o aspecto anti-estratégico desta relação subserviente que a UE vem mantendo com os EUA nas últimas décadas. Washington apresenta um comportamento autoritário e agressivo e possivelmente está envolvida em uma operação de sabotagem que agravará a crise energética europeia durante este próximo inverno. Esta é razão mais do que suficiente para que os Estados europeus comecem a adotar uma política externa soberana.

Fonte: Infobrics

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Lucas Leiroz

Ativista da NR, analista geopolítico e colunista da InfoBrics.

Artigos: 596

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