Dugin, também alvo do atentado, é chamado no Ocidente de “ideólogo do Kremlin” e “assessor de Putin”, o que é um absurdo – Dugin afirma algo muito maior: ele pretende estabelecer uma Ideia alternativa à globalização liberal enquanto tal, que seja capaz de renovar o espírito humano.
Por Petr Akopov
No início do verão, Daria Dugina foi a primeira a me parabenizar pelas sanções da UE – na verdade, foi através dela que eu soube que havia efetivamente recebido restrições pessoais e entrei na lista de sanções, na qual ela ocupava o topo.
Daria atuava e escrevia artigos como Daria Platonova. Nós nos encontramos no início do ano em uma das transmissões de TV e nos vimos/conversamos apenas entre as filmagens. Ela tinha apenas 29 anos, mas já era conhecida como cientista política e jornalista, não só na Rússia, mas também na Europa (especialmente na França ) e na Turquia. (Ela inclusive estudou a África francófona). Em linhas gerais, Daria lutou pela Rússia – e foi para o Donbass sem ter medo de nada.
E na sexta-feira, ela foi morta – eles explodiram o carro no qual ela voltava do festival “Tradição”, realizado na região de Moscou. Aparentemente, a mira estava sobre seu pai, o filósofo russo Alexander Dugin, mas Daria é que foi atingida. Não há palavras para expressar condolências a Alexander Gelevich – ele milagrosamente sobreviveu, mas perdeu sua filha amada. E aqui é importante dizer: aqueles que queriam matar Dugin o odeiam tão somente devido ao Ideal Russo, isto é, por sua lealdade à Tradição e compreensão do Império e pelo fato de ter formulado os sentidos da era vindoura – não apenas para a Rússia, mas para o mundo inteiro. No Ocidente, ele é chamado de “ideólogo do Kremlin” e “assessor de Putin”, mas tais afirmações são um completo absurdo – Dugin afirma algo muito maior: ele pretende estabelecer uma Ideia alternativa à globalização liberal enquanto tal; uma Ideia que seja capaz de renovar o espírito humano.
Depois de 24 de Fevereiro [data do início da Operação Militar Especial], uma nova era começou – não a era de Dugin ou de Putin, mas apenas o momento que Dugin previu. É por isso que, aparentemente, eles decidiram matá-lo: quando não conseguem derrotar a Ideia, o ódio se volta contra os que ousam pensar fora dos consensos estabelecidos.
Quem queria matar Dugin? Aqueles a quem ele chamou diretamente de “servos do Diabo”, ou seja, a elite globalista anglo-saxã que trabalha para impor a ideologia anti-humana do Transumanismo (que a Rússia ameaça).
Em si mesmo, o atentado foi quase que certamente organizado pelos serviços especiais ucranianos – mas não há dúvidas de que eles agiram sob instruções e a partir do interesse das agências anglo-saxãs. E tendo falhado em matar Dugin, imediatamente começaram a dança da morte sobre o corpo de sua filha: zombando e se divertindo. E infelizmente, a eles se juntaram “nossos” compatriotas que combatem contra o “fascismo russo” – que na verdade são ucranianos na própria Rússia e no Exílio –, não apenas justificando o ataque terrorista e o assassinato, mas também regozijando-se com isso. Sim, regozijando-se com o assassinato; zombando do pai de coração partido; amaldiçoando a falecida e caracterizando o ataque como uma “justa retribuição” ou “vingança pelos ucranianos assassinados”.
Considerando tudo que passou, tal conduta já era de se esperar. Mas ainda é impossível ler esses comentários sem espanto. Embora você tente raciocinar com calma, de maneiora lógica, salta aos olhos uma desumanização altamente normalizada, que, no fim, é o objetivo final do transumanismo que, sob o pretexto de construir a super-humanidade (com vida eterna e “novos valores”), deve antes chegar à desumanização do homem. O problema é que alguns russófobos já chegaram lá, já cancelaram tudo o que há de humano em si próprios (incluindo ética e moralidade) e agora estão por aí demonstrando isso alegremente para os outros. Assim, a “cultura do cancelamento” de tudo que é russo se transforma, organicamente, em uma política de terror, no assassinato exemplar daqueles que simbolizam a resistência russa e o espírito russo.
E então, o que podemos dizer ou fazer em resposta? Cancelá-los também? Mas então nos tornaremos como eles. Não, não devemos cancelar – devemos distinguir. Nos apartarmos daqueles que zombam de nós enquanto afirmam pertencer ao nosso mundo, à nossa civilização. Sim: eles são estranhos para nós; sim: são nossos inimigos – e se nos lembrarmos constantemente disso, gradualmente deixaremos de ficar surpresos e indignados com as reações que estamos vendo.
Nossos interesses e os deles não têm nada em comum. Não podemos e não devemos tentar convencê-los e reeduca-los – porque no final eles irão nos subjugar e destruir aqueles dentre nós que denunciam seus planos, que não permitem que eles voltem ao tempo quando poderiam parasitar nosso povo. Eles já perderam em nosso país e perderão ainda mais em escala global, porque o processo de retorno da Rússia a Si Mesma em curso é imparável e está diretamente relacionado às mudanças globais. Nenhum assassinato, nenhum terror interromperá o curso da história russa; não derrotará as ideias que a impulsionam.
“Não se intimidem!”, disse o primeiro-ministro Stolypin, em 1907, no ano anterior ao que quase perdeu sua filha após a explosão de sua casa. Alguns anos depois, Stolypin foi morto, abrindo assim o caminho para a catástrofe de fevereiro de 1917 e a guerra civil. Mas os russos aprenderam as lições sangrentas de sua história e não permitirão que se repitam. E a memória do assassinato de Daria Dugina nos ajudará nisso