Escrito por Giuseppe Gagliano
Já virou um truísmo a associação entre petróleo e guerra, mas é fundamental conhecer detalhes da história desse papel do petróleo como motivador de guerras imperialistas, cujas vítimas principais são sempre os cidadãos do Terceiro Mundo.
Nosso objetivo não é resumir pontualmente o interessantíssimo relatório publicado pela Escola de Guerra Econômica de Paris sobre a ligação entre os serviços de segurança e a luta pelos recursos petrolíferos.
Nosso objetivo será muito mais simples: limitar-nos-emos a apresentar ao leitor italiano alguns aspectos deste relatório. Fazendo referência ao papel que a luta pelo petróleo tem desempenhado em países considerados arautos e defensores da liberdade, da igualdade, da democracia e dos direitos, ou seja, a Inglaterra, a França e os Estados Unidos.
Como os autores do relatório ressaltam corretamente:
“desde o final do século XIX, a corrida pelo petróleo tem acompanhado o desenvolvimento do mundo e seu crescimento. Ela contribuiu tanto para melhorar drasticamente as condições de vida quanto para destruí-las com velocidade impressionante. Esta dicotomia explica em grande parte a importância estratégica atribuída a ele. Ainda hoje, o acesso ao ouro negro proporciona esta alavanca essencial para o domínio econômico e militar. Sua conquista levou a muitos conflitos, também redesenhou algumas fronteiras e mudou o equilíbrio internacional de poder. Os Estados são, naturalmente, os atores ostensivos nestas lutas amargas. Mas algumas grandes companhias petrolíferas desempenham um papel igualmente importante no teatro de operações.”
No entanto, como disse Sun Tzu, “Todo o sucesso de uma operação está em sua preparação”. “Assim, a conquista bem sucedida do petróleo não é uma exceção a esta regra e requer um trabalho de inteligência eficaz. Consequentemente, os métodos utilizados serão moralmente ambíguos e muitas vezes fora da estrutura da legalidade. Os serviços de inteligência, portanto, utilizarão os meios à sua disposição espionando, rastreando e até mesmo instigando revoluções nos países visados. Eles também forjarão laços estreitos com políticos e empresas a fim de cooperar melhor e defender os interesses nacionais. O seu uso será então às vezes defensivo, às vezes ofensivo, dependendo das manobras a serem executadas”.
Se o que é dito no prefácio corresponde à verdade histórica – e não temos razões racionalmente válidas para duvidar disso – não há dúvida de que as nações que foram inspiradas – pelo menos em nível formal – pela democracia e pelos direitos humanos – como a Inglaterra, a França e os Estados Unidos – violaram constante e repetidamente estes valores “sagrados” a fim de salvaguardar seus interesses nacionais e, sobretudo, os imensos lucros obtidos pelas multinacionais petrolíferas à custa de desestabilização política, guerras civis, golpes de Estado, governos fantoches, corrupção generalizada dentro da classe política e empresarial africana, etc.
O papel dos serviços de segurança e das operações secretas tem sido decisivo para alcançar estes objetivos. Uma consideração final: que os aparatos estatais e os da inteligência operaram desafiando tanto os valores da democracia quanto os valores da moralidade é um fato histórico estabelecido. Ontem como hoje. Precisamente por esta razão, seria oportuno que as reflexões abstratas e auto-referenciais – por mais vazias que sejam – da filosofia da política e da filosofia do direito – fossem confrontadas com a dinâmica efetiva da realidade histórica. Ao mesmo tempo, seria igualmente oportuno lembrar aos numerosos defensores do politicamente correto – e entre esses inúmeros jornalistas e intelectuais – que a dinâmica conflituosa do poder nunca respeitou os princípios sagrados da democracia e muito menos a moral evangélica ou kantiana. Mas apenas a da razão de Estado e dos arcana imperi.
Petróleo e Guerra Econômica na Estratégia Estadunidense
De um ponto de vista histórico não há dúvida de que durante a Guerra Fria os Estados Unidos usaram golpes e cover action não apenas para limitar e conter a projeção do poder russo, mas sobretudo para proteger e garantir o acesso ao petróleo, utilizando uma estratégia já experimentada com sucesso pelos britânicos.
O golpe no Irã em nome do petróleo
Emblemática deste ponto de vista foi a operação Ajax posta em prática pelos Estados Unidos para desestabilizar o Irã. Quando Mossadegh em 1951, junto com a Frente Nacional e o partido marxista Tudeh, aprovou o projeto de nacionalização da indústria petrolífera, a reação britânica foi extremamente dura. De fato, a indústria petrolífera iraniana estava então sob domínio britânico, com Winston Churchill que tinha desempenhado um papel fundamental na obtenção dos direitos petrolíferos no Irã junto com a Anglo-Iranian Oil Company, considerada vital para a recuperação da economia britânica após a Segunda Guerra Mundial e para garantir a independência energética da Marinha Real.
Primeiro, a Grã-Bretanha reagiu organizando um embargo geral ao petróleo iraniano e, em segundo lugar, preparou um golpe de Estado para derrubar Mossadegh. Os Estados Unidos, inicialmente desejando permanecer neutros, encorajaram os britânicos a aceitar a nacionalização e negociar um acordo amigável; esta neutralidade continuou até o final da administração Truman em 1953. Entretanto, quando Eisenhower chegou ao poder, o presidente americano se mostrou mais solidário com as reivindicações britânicas.
Para os Estados Unidos, esta operação secreta foi uma tentativa de impedir a expansão soviética e de ganhar uma parte das reservas de petróleo do Irã em benefício das empresas americanas. Como resultado, o império colonial britânico, agora em evidente declínio, dará lugar ao herdeiro do imperialismo, ou seja, aos EUA.
De acordo com documentos desclassificados em 2000 e presentes nos Arquivos de Segurança Nacional da Universidade George Washington (obtidos sob o Ato de Liberdade de Informação n. 40), a CIA admitiu ter orquestrado esta operação, chamada exatamente TPAJAX, com o objetivo de derrubar Mossadegh e colocar o xá Mohammad Reza Pahlavi, um aliado próximo dos americanos (até sua derrubada durante a revolução islâmica de 1979), no poder. Após atingir este objetivo, os recursos petrolíferos iranianos foram substancialmente administrados por duas multinacionais, a British Petroleum e a National Iranian Oil Company.
A guerra Irã-Iraque
Quanto ao Iraque e suas preciosas reservas de petróleo, em 1963 Saddam Hussein chegou ao poder graças a um golpe de Estado orquestrado pela CIA que desestabilizou o poder político de Kassam que – entre outras coisas – havia confiscado as reservas de petróleo da Iraq Petroleum Company em dezembro de 1961, privando assim as majors ocidentais de seus lucros. Consequentemente, a partir do início dos anos 60, a Agência, então sediada no Kuwait, mobilizou os opositores do regime de Kassem e transmitiu as ordens aos rebeldes por rádio. A CIA tentou repetidamente assassinar Kassem, mas sem sucesso, o que só viria em 8 de fevereiro de 1963, quando o partido Ba’ath, guiado por Hussein, tomou o poder em um golpe de estado. Kassem foi fuzilado e a CIA conseguiu conduzir a mudança de regime em Bagdá. O presidente dos Estados Unidos, Reagan, e a Grã-Bretanha apoiaram Hussein nos anos 80 contra seu inimigo comum, o Irã na guerra Iraque-Irã (1980-88).
O eixo com os sauditas: um pacto com o diabo em nome do petróleo
Os Estados Unidos utilizaram o Banco Internacional de Comércio e Crédito, fundado em 1972, para suas operações secretas da CIA com os sauditas. Este banco ajudou a lavar dinheiro e financiar grupos armados como os mujahideen no Afeganistão. De acordo com um relatório da CIA de 1977, as funções da agência sempre incluíram o monitoramento do estado das reservas mundiais de petróleo.
Em 1974, a Arábia Saudita e os Estados Unidos ocultaram os volumes das reservas de petróleo da ARAMCO, antes de sua nacionalização, com o objetivo de subestimar as reservas em tempos de abundância e depois anunciar o “volume real” em tempos de crescimento baseado na demanda mundial e nas necessidades americanas.
Enquanto o solo americano foi atacado pela primeira vez em 11 de setembro de 2001, os sauditas não receberam sanções significativas, apesar das advertências da CIA. Exatamente em 2001, uma série de contratos de petróleo estava sendo finalizada com a Arábia Saudita. Na verdade, um memorando da CIA foi enviado ao Presidente Bush, intitulado “Bin Laden Determinado a Atacar nos Estados Unidos”. De acordo com Ahmed Zaki Yamani, ex-ministro da OPEP, apesar da crescente independência petrolífera dos Estados Unidos, este último precisa da Arábia Saudita por causa de suas enormes reservas de petróleo. Devido ao papel da Arábia Saudita na OPEP e à influência no Oriente Médio e nos países muçulmanos, os Estados Unidos não têm outros parceiros comprometidos no Oriente Médio (exceto Israel, que está cercado por vizinhos antagônicos); pode-se notar que em 2013, por exemplo, as exportações dos EUA para a Arábia Saudita excederam US$ 35 bilhões (US$ 19 bilhões são exportações diretas, um aumento de 76% desde 2009).
O petróleo e a estratégia imperial britânica
Não há dúvida de que as escolhas postas em prática a nível de política externa pela Grã-Bretanha têm sido profundamente influenciadas pela sua dimensão insular. Isso explica a supremacia marítima do Império Britânico, cujas dinâmicas de poder se refletem em uma projeção para as terras estrangeiras. Começando pela Ásia. Além de ser o ponto fulctral do mundo, o centro nevrálgico do planeta, a Ásia Central é tabém uma terra de riquezas, riquezas imensas. Sedas, jade, especiarias, tapetes persas ou caviar foram substituídos por hidrocarbonetos, petróleo e gás.
Iniciada já na Revolução Industrial Inglesa, a capacidade de construir cenários antecipando as necessidades energéticas contribuiu muito para aumentar o poder econômico do Império Britânico, já com o carvão.
Desde 1919, a Marinha Real e Winston Churchill, então Primeiro Senhor do Almirantado, entenderam a centralidade geopolítica do petróleo e, neste contexto, a inteligência econômica desempenhou um papel decisivo na fase de apropriação dos campos petrolíferos. Por trás do avanço das empresas britânicas no mercado do ouro negro, de fato, estão as ações dos serviços secretos britânicos com a colaboração da aristocracia e do mundo acadêmico.
De fato, a Grã-Bretanha, como já havia feito anteriormente para o algodão, mobilizou todas as elites públicas e privadas interessadas em defender os interesses de seu império colonial, mesmo que o papel do SIS fosse preponderante. Ontem como hoje. Sir John Sawers, ex-diplomata e diretor do SIS de 2009 a 2014, está no conselho da empresa petrolífera britânica BP desde 2015, cujo ancestral é nada menos que a Anglo-Persian Oil Company. Como ex-funcionário do governo e da inteligência, Sir John Sawers é encarregado de compartilhar seus valiosos conhecimentos na análise geopolítica de classe mundial.
No final da Grande Guerra, a batalha entre os serviços de inteligência britânicos e alemães pelo controle dos campos de petróleo de Baku foi intensa. Um ex-agente do Raj britânico e afiliado do MI5, também conhecido como Ronald Sinclair, foi decisivo na busca do Grande Jogo contra seu homólogo alemão Wilhelm Wassmuss. Em resumo, o petróleo provou estar no centro da geopolítica.
Seguindo a teoria de sir Mackinder, foi em torno do Golfo Pérsico e do Golfo Arábico que se estabeleceu o pivô da estratégia do Império Britânico, que começou a traçar os contornos dos futuros acordos Sykes-Picot. No final da Grande Guerra, a Grã-Bretanha não retirou suas tropas do Golfo Pérsico, muito pelo contrário. Esta área se tornou um “lago britânico” diante da profunda diminuição do império turco.
Bem, a expansão do Império Britânico na Mesopotâmia para controlar a região e defender seus interesses petrolíferos estratégicos foi amplamente possibilitada por Gertrude Bell, que não só foi a primeira mulher a se formar em Oxford com honras, mas também a primeira mulher oficial da inteligência britânica. Gertrude Bell foi considerada a “Mãe do Iraque” por seus contemporâneos quando os acordos foram assinados. Com os Acordos Sykes-Picot de 1916, o Império Otomano foi então dividido em duas zonas: a França recuperou a tutela da Síria e do Irã, enquanto o Império Britânico assumiu a tutela da Palestina e da Mesopotâmia.
Mais uma vez, os serviços secretos britânicos manobraram inteligentemente para apropriar-se dos recursos petrolíferos persas inicialmente prometidos aos árabes e depois aos franceses. A ascensão do nacionalismo e a independência das colônias marcaram o fim gradual do imperialismo britânico.
No final da Segunda Guerra Mundial, a libra foi ultrapassada pelo dólar, que se tornou o novo sistema internacional de referência monetária, materializado pelos acordos de Bretton Woods. A ascensão dos Estados Unidos e da URSS em torno de dois blocos bipolares obrigou os ocidentais, por um lado, a forjar alianças, mas, por outro lado, a fazer tudo para salvaguardar seus interesses nacionais.
Como Lawrence da Arábia antes dele, Harry Saint-John Philby, conhecido como “Jack”, foi enviado à Arábia Saudita por Gertrude Bell, então representante do escritório árabe sediado no Cairo. Filho de um agricultor de chá, Philby não era um membro da aristocracia britânica. Ex-agente secreto da Primeira Guerra Mundial e formado em Cambridge, Philby era um arabista amante do deserto, fascinado pelo mundo árabe (ele se converteu ao Islã em 1930) mas discordava fortemente da política externa britânica no Oriente Médio. Em 1924, Philby deixou o serviço de Sua Majestade da Inglaterra para se tornar o conselheiro pessoal de Ibn Saud, rei da Arábia Saudita. A duplicidade da Grã-Bretanha em relação aos árabes, misturada com seus sentimentos de ódio que ele nutria contra seu próprio país, o levou a cometer uma formidável traição ao Império, cujas conseqüências afetaram as relações internacionais no Oriente Médio.
De fato, em 1933, o renegado Saint-John deu um duro golpe a esta odiada aristocracia, aconselhando com sucesso Ibn Saud a preferir, para a exploração de seus recursos, a Standard Oil of California à Anglo-Persian Oil Company.
No final da década de 1940, o controle mortal exercido pelas companhias petrolíferas britânicas da Anglo-Persian Oil Company (agora Anglo-Iranian Oil Company) sobre o Irã – o Império Britânico era então o 3º maior produtor do mundo e o 1º produtor do Oriente Médio – Mohammad Mossadegh queria empreender grandes mudanças políticas e econômicas para seu país, reduzir a influência estrangeira e retirar o xá do cargo. Em 1951 ele conseguiu ser nomeado primeiro-ministro com a ajuda do Majlis, o Parlamento iraniano, e implementou a nacionalização da Anglo-Iranian Oil Company, provocando uma reação imediata de Londres com um bloqueio internacional de hidrocarbonetos. Com a Anglo-Iranian Oil Company garantindo a independência energética da Marinha Real, Winston Churchill seguiu o caso “muito de perto”.
Em 1952, o chefe do SIS em Teerã, Christophe Woodhouse, reuniu-se em Washington com seus dois colegas americanos, Bedel Smith e Frank Wisner. O SIS se prepararia para o “golpe de Teerã” chamado Operação BOOT que seria auxiliado pela CIA através da Operação AJAX.
O Bloqueio de Berlim de 1948 deixou marcas profundas e duradouras na memória: o medo de que as forças armadas não fossem capazes de deter o avanço da URSS e o medo da perda das companhias petrolíferas do Irã, Iraque e Golfo Pérsico induziram a CIA e o SIS britânico a colaborar novamente em 1948. Esta sinergia tomou a forma de um documento conhecido como NSC 26, sob o qual foi prevista a possibilidade de demolir instalações, equipamentos e suprimentos de petróleo no Oriente Médio. O objetivo deste projeto era destruir os suprimentos de combustível e desmantelar as instalações através de demolições seletivas temporárias para que pudessem ser reutilizadas depois que a URSS fosse derrotada. Para ter sucesso, as operações do NSC envolveram tanto as empresas petrolíferas quanto as militares. Entretanto, o Ministério das Relações Exteriores escondeu dos americanos o fato de que as companhias petrolíferas britânicas haviam concordado com esta cooperação confiando exclusivamente nos militares.
De fato, os britânicos temiam não apenas as conseqüências econômicas, mas também que as companhias petrolíferas americanas pudessem reduzir o petróleo no Oriente Médio. No entanto, este plano foi sujeito a numerosas modificações por vários motivos. Em primeiro lugar, devido às deficiências identificadas em termos de implementação de demolições seletivas, algumas das quais poderiam ter se mostrado irreversíveis, e devido à presença de instalações petrolíferas iranianas que não estavam sob controle britânico.
Entretanto, devido à ascensão do nacionalismo, e em particular do nacionalismo iraniano, às guerras regionais e às invasões soviéticas, o NSC 26 foi modificado nos anos 50, tomando forma em um plano conhecido como NSC 5714, onde o uso de companhias petrolíferas foi abandonado, a ação das forças armadas foi reforçada, a destruição de estoques foi mantida, a destruição de terras e meios de abastecimento foi planejada e o uso de ataques aéreos com bombas convencionais e nucleares foi previsto. Felizmente, estes planos nunca foram implementados, mas estas estratégias secretas mostram como o petróleo era valioso e como não deveria cair nas mãos do adversário ou aliado.
Em 2011, a Líbia do Coronel Mouhammar Gaddafi, foi objeto de violentas revoltas populares promovidas pelo Conselho Nacional de Transição (CNT) que rapidamente se transformaram em guerra civil com uma visível intervenção britânica (exército regular) e subterrânea (SIS). Graças às recentes revelações do Wikileaks, sabemos que havia e-mails entre Hillary Clinton e Sidney Blumenthal, um de seus conselheiros próximos, revelando que altos funcionários do CNT estavam convencidos de que o Ministério das Relações Exteriores estava trabalhando para fortalecer a posição da British Petroleum. Estes e-mails destacam o fato de que até este momento a BP foi forçada a lidar com Gaddafi, mas mesmo assim o Reino Unido foi uma das primeiras grandes potências a apoiar a rebelião da CNT.
Esses e-mails também revelam a pressão exercida pelos britânicos sobre a CNT para obter uma compensação por seu apoio na forma de contratos favoráveis para as empresas petrolíferas. A CNT, recusando acordos globais, aceitou seletivamente acordos comerciais em favor de empresas britânicas. Os verdadeiros desafios da guerra não foram, portanto, apenas a transição para uma nova ordem política, mas também a gestão e a redistribuição dos lucros petrolíferos.
A França e o neocolonialismo petrolífero
Após a independência argelina, Paris perdeu o controle de uma parte significativa do petróleo. Entretanto, a independência energética tão cara à política de poder do Presidente de Gaulle exige um aumento de suas fontes de abastecimento.
A França recorreu então aos recursos petrolíferos de seu antigo império colonial na África Ocidental. Através de Jacques Foccart, a SDECE e a empresa petrolífera Elf, ela criará redes de influência para manter os líderes “amigos da França” à frente dos Estados petrolíferos no Golfo da Guiné. O objetivo assim perseguido é a estabilidade política do país produtor porque a rentabilidade de um campo petrolífero é atingida a longo prazo. De fato, desde a descoberta de um campo até sua exploração, pode-se levar de 5 a 10 anos.
Primeiro, Jacques Foccart, foi “Secretário-Geral da Presidência da República para a Comunidade e Assuntos Africanos e Malgaxes” sob o governo de Gaulle e depois sob o governo de Pompidou de 1960 a 1974. Ele rapidamente se tornou indispensável graças à rede muito ativa que ele estava desenvolvendo para implementar a política africana da França. Por um lado, forja laços muito fortes com os presidentes francês e os africanos.
Por outro lado, com serviços de inteligência como a SDECE, mas também com empresas francesas presentes na África como a Elf e seu presidente, Pierre Guillaumat. Além disso, a Elf é “uma empresa a serviço do Estado”. Seu ex-presidente, Loïk Le Floch-Prigent, até mesmo a apelidou de “o ministério do petróleo”. Ela é também uma “agência de inteligência” privada cheia de ex-agentes e analistas de inteligência que trabalham à sombra do petróleo. Por exemplo, o dinheiro do petróleo ajuda a financiar a política externa da França.
Em particular, ela pode influenciar o voto de seus aliados africanos na ONU e assim “ampliar seu status como potência mundial mantendo seu assento permanente no Conselho de Segurança da ONU”. Ao mesmo tempo, a SDECE e a DST, têm um grande pool de fontes humanas lidar entre as fileiras dos muitos expatriados que trabalham na Elf. Além disso, o apoio da SDECE à empresa Elf ajudou a assegurar parcialmente o fornecimento de petróleo francês.
Entretanto, os vários compromissos externos da França após 1945 contribuiriam para tornar a SDECE um serviço mais orientado para a ação clandestina do que para a pesquisa de inteligência. Finalmente, um homem, a figura chave nestes interesses entrelaçados, seria Maurice Robert. Um oficial da SDECE de 1954 a 1974, ele serviu notavelmente como chefe da seção África. Ele então trabalhou para o presidente da Elf de 1974 a 1979, onde desenvolveu as capacidades de inteligência da empresa. Suas atividades consistiam principalmente em manter-se a par do que estava acontecendo política e economicamente nos países onde a Elf tinha presença ou tinha projetos, estando atento a novas oportunidades para o grupo. Ele se encontrou freqüentemente com líderes políticos africanos seniores, incluindo chefes de Estado, na África ou na França durante suas viagens. Finalmente, ele obteve o prestigioso posto de Embaixador da França no Gabão de 1979 a 1981, o que tende a demonstrar a importância política da inteligência e do petróleo nesta parte do mundo.
A intervenção francesa no Gabão
Jacques Foccart colocou o Gabão, rico em petróleo, no centro da política africana da França. Ele não hesitou, portanto, em intervir nos assuntos internos do país. Após a independência do país em 1960, o ex-colono ajudou fortemente Léon M’ba, o presidente francófilo, a organizar sua administração. A manutenção da estabilidade política de acordo com os interesses franceses foi expressa pela primeira vez durante o putsch de Jean-Hilaire Aubame em 1964. Charles de Gaulle queria então restaurar M’ba ao poder. Ele então autorizou uma intervenção militar organizada por Foccart, Guillaumat, Robert (SDECE) e Robert Ponsaillé, assessor do grupo petrolífero e presidente gabonês. M’ba recuperou assim o poder. Quando ele morreu em 1967, a rede Foccart instalou Omar Bongo, um antigo membro do serviço secreto francês, como chefe do Gabão. Ele então governou o país com apoio francês até sua morte em 2009. Em troca, ele compartilhou a riqueza do país com a França e a classe política francesa.
Nigéria e Biafra, caça ao petróleo
O caso da guerra de Biafra na Nigéria (1967-1970) destaca as capacidades subversivas da França para estabelecer um regime conducente ao fornecimento de petróleo à França. A partir dos anos 60, as reservas de petróleo da Nigéria provaram ser excepcionais.
Em 1968, de Gaulle instruiu Foccart a recuperar o controle dos campos petrolíferos da Nigéria e do terminal petrolífero de Port-Harcourt (o único grande acesso ao Atlântico), então sob controle anglo-saxão. De sua base em Libreville, no Gabão, e Abidjan, na Costa do Marfim, a SDECE alimentaria o conflito fornecendo armas aos secessionistas sob o pretexto de ajuda humanitária. O Tenente-Coronel Raymond Bichelot, chefe da SDECE em Abidjan desde 1963, desempenhará um papel central na condução das operações em Biafra. Paris está assim utilizando seus serviços de inteligência para fins subversivos para ajudar sua indústria petrolífera a desenvolver suas fontes de abastecimento.
Na realidade, a guerra de Biafra é uma guerra entre as companhias petrolíferas britânicas, Shell e BP, e a francesa SAFRAP, uma subsidiária do grupo estatal francês ERAP. Paris vem então à caça nas terras das empresas britânicas já estabelecidas desde 1950. Finalmente, a revolta é reprimida ao custo de mais de um milhão de mortes causadas em parte pelo bloqueio alimentar decidido pelo exército nigeriano.
A SDECE explora o “genocídio para manipular a opinião pública (através do jornal Le Monde) e esconder seu verdadeiro papel na guerra”. Entretanto, a empresa petrolífera francesa será capaz de manter a maior parte de sua produção de petróleo. Em conclusão, observamos, por um lado, que Foccart orquestra efetivamente “as diversas estratégias de influência e manipulação contra os países produtores de petróleo”. Seu objetivo é manter um clima político propício ao bom abastecimento de petróleo para a França. Para alcançar este objetivo, ele conta com os recursos humanos dos serviços de inteligência e das redes diplomáticas, bem como com consideráveis recursos financeiros, como os da Elf e seus aliados africanos. Entretanto, este “sistema Foccart” não consegue se desenvolver fora do distrito africano, uma “visão particular sobre o papel da inteligência econômica na preservação de um interesse de poder, com exceção de algumas áreas-chave” e, em particular, a do petróleo.
O papel de Alexandre de Marenches
Alexandre de Marenches foi nomeado Diretor Geral da SDECE por Pompidou em 1970. Ele ocupou este cargo até 1981. O presidente o convidou a reformar fundamentalmente a SDECE. A escolha de Pompidou foi motivada pelo caso Marković, um escândalo envolvendo a esposa do presidente e a SDECE. No início do primeiro choque petrolífero (1973-1974), de Marenches estava preocupado com o uso que os países da OPEP fariam do ganho financeiro gerado pelo “aumento drástico das taxas devidas pelas companhias petrolíferas”. Para alcançar os interesses da França, ele trouxe quatro estratégias possíveis em jogo: primeiro, a guerra financeira; segundo, as participações árabes em empresas francesas, potencialmente desestabilizadoras para a economia; terceiro, a ajuda a organizações terroristas; e finalmente o uso da corrupção generalizada.
Convencida de que a União Soviética estava puxando os cordelinhos secretamente com o objetivo de minar o fornecimento de petróleo do Ocidente, ela constrói uma aliança de inteligência anticomunista: o Safari Club, criado em 1976, reúne a inteligência francesa, iraniana, egípcia, saudita e marroquina. O objetivo de Paris é a luta contra o comunismo na África e no Oriente Médio. A SDECE, portanto, utiliza petrodólares sauditas para financiar suas operações e aumentar sua influência.
O que está em jogo além de sua participação no Safari Club não é apenas a importância da Arábia Saudita para a indústria de armas francesa, mas também a renovação do acordo petrolífero com o reino saudita. Além disso, a França é tacitamente encarregada por seus parceiros da OTAN do papel de “policial da África”. Em troca, seu ativismo energético particularmente autoritário é tolerado. Por exemplo, durante a guerra civil em Angola (1975-1991), a SDECE, e em particular seu serviço de ação, forneceu apoio militar à UNITA, um movimento guerrilheiro que lutava contra o regime comunista dominante. Entretanto, Angola é um país rico em petróleo e, em particular, a região de Cabinda. A Elf, e portanto Paris, abriram suas redes para se beneficiar da situação sob o pretexto da luta contra o comunismo. Em resumo, durante a Guerra Fria, a SDECE tornou-se um serviço para a defesa do distrito africano, a fim de manter a influência francesa sobre suas ex-colônias e garantir a sua apropriação dos recursos petrolíferos.
Fonte: Osservatorio Globalizzazione