Santa Sé – “Os sentimentos de pertencer à mesma humanidade estão enfraquecidos, o sonho de construir justiça e paz juntos aparenta uma utopia dos tempos antigos”, aponta o Papa.
O Papa Francisco apresentou sua nova carta encíclica “Todos Irmãos” (Fratelli Tuti), um documento que nos convida a imaginar “uma nova visão de amizade e fraternidade”, bem como levanta uma crítica forte de ideologias que proclamam a conveniência de mercados não-regulados.
“No mundo hoje, o sentimento de pertencer à mesma humanidade está enfraquecido, os sonhos de construir justiça e paz juntos parecem uma utopia dos tempos antigos. Nós vemos o quanto o conforto, frieza e globalizada indiferença regem”, constata o Papa Francisco em sua maior encíclica política até o momento.
O líder da Igreja Católica analisa alguns recursos da atual globalização e enfatiza que “o mercado sozinho não resolve tudo”.
Ao contrário, a promoção indiscriminada de políticas econômicas pela liberação dos mercados gerou males globais públicos, como a destruição de bens comuns ambientais, desprezo por imigrantes e o controle virtual da população.
Em seu convite para construir um mundo mais justo, a encíclica revisa os maiores problemas gerados, que a crise durante a pandemia trouxeram à luz, de acordo com o que o funcionamento de cada sociedade diz respeito. Essas são “tendências que dizem respeito a um mundo que atrapalha o desenvolvimento da fraternidade universal”.
O Papa Francisco começa por enfatizar que o mundo está se afastando dos desejos de integração das nações, que busca eliminar a barreira física e imaterial dividindo as pessoas. Elas se tornaram “Sonhos Despedaçados”.
Nossos tempos demonstram sinal de regressão. Conflitos antigos acreditados anteriormente enterrados estão irrompendo novos, enquanto instâncias de um míope, extremista, ressentido e agressivo nacionalismo estão surgindo.
‘Abrindo ao mundo’ é uma expressão que foi cooptada pelo setor financeiro e econômico, que se tornou de uso exclusivo da abertura para interesses estrangeiros e de poderes de liberdade econômica ao investir sem obstáculos e complicações em todos os países.
Essa visão corporativa de globalização se aproveita de conflitos locais para um impor um único modelo cultural, que divide as pessoas e as nações. Porque “enquanto as sociedades se tornam mais globalizadas, nos fazem vizinhos, mas não irmãos”.
Dessa forma, também, os “poderes econômicos transnacionais” dividem e conquistam “as pobres e fracas regiões, tornando-as vulneráveis e dependentes”.
Nos limites do individualismo neoliberal
Simultaneamente com as tendências da ressurgência do nacionalismo, o Papa Francisco destaca as consequências das ideologias conservadoras que promovem o individualismo e concebem a sociedade “como a mera somatória de interesses coexistentes”.
Dessa lógica dominante, “aqueles que defendem os direitos das pessoas mais vulneráveis da sociedade são criticados como populistas. O entendimento de um povo é considerado construto abstrato, algo que realmente não existe”.
Acompanhando a rejeição do coletivo, o neoliberalismo promove um ataque ao Estado que paradoxalmente desprotege a pessoa individual que os neoconservadores clamam respeitar tanto.
“Vida privada não pode existir, ao menos que seja protegida pela ordem pública. Uma lareira doméstica não esquenta, ao menos que protegida pela lei, pelo estado da tranquilidade encontrado na lei, então pode gozar do mínimo dos bens garantidos pela divisão do trabalho, troca comercial, justiça social e cidadão político”.
Esta postagem foi escrita originalmente e publicada por teleSUR English e aparece aqui com permissão.