Alguns anos atrás, gigantescos estoques do medicamento Tamiflu foram adquiridos por diversos governos em meio à pandemia da Gripe A. No caso da França, 94 milhões de vacinas foram adquiridas, para uma população inferior a 67 milhões, algo que favoreceu consideravelmente a empresa farmacêutica suíça A F. Hoffmann–La Roche AG, fabricante do Tamiflu, e também a Donald Rumsfeld, ex-secretário de defesa dos Estados Unidos e acionista da empresa americana Gilead Sciences, proprietária dos direitos do Tamiflu. Isto ocorreu, mesmo tendo em vista os questionamentos quanto à eficácia do medicamento, tendo sido defendido, por pesquisadores e profissionais de saúdes, que o medicamento não evitaria a disseminação da gripe, nem mesmo reduziria as complicações perigosas da doença, sendo o medicamento tão eficaz quanto um analgésico comum.
Diversos governos, entre eles o brasileiro, gastaram consideráveis somas, chegando a muitos casos a bilhões de dólares, na compra deste medicamento, que poderia, de acordo com muitos profissionais da área, ser substituído por analgésicos comuns. No caso do governo brasileiro, o Ministério da Saúde gastou um montante de R$ 400 milhões. Já na atual pandemia do Covid-19, podemos enxergar certas semelhanças, quando analisamos a insistência de alguns representantes no uso do medicamento Cloroquina, como o presidente dos Estados Unidos Donald Trump, que insistentemente, durante considerável tempo, promoveu o uso da Cloroquina, mesmo sem comprovação quanto a sua eficácia.
Torna-se interessante analisarmos que o presidente é um dos acionistas da empresa Sanofi, empresa francesa do setor farmacêutico que detém a patente da droga. Assim como o presidente americano, outro acionista é Ken Fisher, que é um dos maiores doadores de campanha para os republicanos, mesmo partido do presidente Donald Trump. Na mesma linha, em maio o governo brasileiro passou a considerar o uso do medicamento. Através de protocolo do Ministério da Saúde, se tornou possível o uso da droga para pacientes que apresentassem sintomas do Covid-19, desde que assinassem um termo de consentimento, reconhecendo que não há estudos conclusivos de que a cloroquina melhore de fato seu quadro de saúde.
Podemos verificar facilmente que a empresa farmacêutica Apsen, produtora do medicamento Reuquinol, medicamente composto por hidroxocloroquina, derivado este da cloroquina, tem como seu proprietário Renato Spallicci, um entusiasta do governo do presidente Jair Bolsonaro. Sua empresa consequentemente se beneficiou da ampla divulgação em torno do medicamento, tendo o remédio se esgotado nas farmácias de todo o Brasil, obrigando a Apsen a colocar em prática um plano emergencial para triplicar a produção do Reuquinol.
Indo mais além, podemos verificar o lucro exorbitante, e o abuso, por parte do setor fármaco-químico. A empresa americana Gilead Sciences fixou o valor de 2.340,00 dólares para um tratamento de cinco dias contra o Covid-19, valor este que no Brasil giraria em torno 12.000,00 reais. Analistas de Wall Street disseram que o medicamento antiviral pode gerar bilhões de dólares em receita nos próximos dois anos se a pandemia continuar. A grande indústria não tem escrúpulos, além de a pandemia desmascarar quem lucra com a desgraça que se apresenta, também evidencia as desigualdades e o antagonismo social existente, mesmo em um momento onde deveria prevalecer a solidariedade.