Escrito por Annie Holmquist
Desenhos animados não passam de puro escapismo infanto-juvenil ou eles possuem algum tipo de potencial pedagógico e cultural? Não podemos falar nada de positivo sobre os desenhos animados acompanhados pelas gerações atuais, mas para as gerações e nossos pais e avós, foram os desenhos animados os responsáveis por sua introdução à música clássica e a diversas referências literárias.
Eu recentemente peguei a obra “Um Ianque de Connecticut na Corte do Rei Artur”, de Mark Twain, pela primeira vez. Como achei o enredo bastante divertido, comecei a narrá-lo para meu pai durante o fim de semana. Como ele nunca tinha lido o livro, fiquei bastante surpreso quando ele começou a fazer perguntas informadas sobre a história. Em pouco tempo, foi ele quem começou a me ensinar sobre os elementos do enredo que eu ainda não havia alcançado.
“Espere um minuto”, perguntei. “Você tem certeza que nunca leu este livro?”
“Não, nunca li”, respondeu ele, “mas vi uma versão em desenho da história quando era mais novo e tudo o que sei vem daí.”
A sua revelação era bastante curiosa, e para ser honesta, não a primeira do tipo. Como muitos na geração do pós-guerra, meu pai cresceu assistindo desenhos animados clássicos, a maioria dos quais foram produzidos por empresas como a Warner Bros.
Mas esses desenhos animados fizeram mais do que entreter despretensiosamente uma geração de crianças. Eles também introduziram milhões de jovens às principais facetas da alfabetização cultural, particularmente ao domínio da literatura e da música.
Para além do caso acima mencionado do romance de Mark Twain, estes desenhos animados apresentaram às crianças histórias como “O Estranho caso do Dr. Jekyll e do Sr. Hyde”, de Robert Louis Stevenson, através do Pernalonga. Citações e cenas importantes das obras de William Shakespeare foram o tema principal de um curta chamado “A Ham in a Role“, dos Goofy Gophers. E o poema épico de Henry Wadsworth Longfellow “A Canção de Hiawatha” foi o foco de um curta de Walt Disney chamado “Little Hiawatha“.
Talvez até mais famosas do que as referências da literatura são as muitas maneiras pelas quais os desenhos animados introduziram as crianças ao mundo da música clássica, incluindo tanto seleções instrumentais como operáticas, entre os quais está o famoso “Coelho de Sevilha“. O crítico de cinema americano Leonard Maltin descreve bem a situação:
“Uma enorme parte da minha educação musical veio das mãos do [compositor da Warner Bros.] Carl Stalling, só que eu não me apercebi, eu não estava ciente, ela apenas penetrou no meu cérebro ao longo de todos aqueles anos em que eu via os desenhos animados da Warner dia após dia. Aprendi a Segunda Rapsódia Húngara de Liszt por causa dos desenhos animados da Warner Bros., eles usaram-na tantas vezes, mais notoriamente quando Friz Freleng mandou construir um arranha-céus ao som dela em ‘Rapsódia e Rebites‘”.
Mas Maltin não foi o único a aprender com estas incursões musicais clássicas. Na verdade, como testemunha o famoso pianista Lang Lang, foi a interpretação de Tom e Jerry da Rapsódia Húngara de Liszt no “The Cat Concerto” que o inspirou a começar a tocar piano aos dois anos de idade.
Estes exemplos apenas roçam a superfície das aulas de alfabetização cultural que os velhos desenhos animados deram aos nossos pais e avós. Mesmo que eles nunca tenham aprendido estes elementos na escola, pelo menos tinham algum quadro de referência sobre o qual podiam construir a sua compreensão dos livros e da música e até mesmo das ideias que tiveram impacto na cultura e no mundo em que vivemos hoje.
Mas poderíamos dizer o mesmo da geração atual? É certo que não sou muito versada nas ofertas de desenhos animados atuais, mas uma rápida busca de títulos populares parece sugerir que a resposta é não. Na maioria das vezes, eles parecem oferecer banalidade, escapismo e um foco no aqui e agora.
Em suma, nem as escolas, nem os desenhos animados da manhã de sábado parecem passar a tocha do conhecimento e da erudição. Poderia tal cenário ser uma das razões pelas quais vemos um aumento da apatia e da falta de substância na geração atual?
Fonte: Intellectual Takeout