As regras do mercado não são fatos da natureza
De Jag Bhalla
Estamos permitindo que “leis” não naturais nos enganem. Mercados não são como a gravidade; eles não são governados por leis da natureza, nem por mandamentos esculpidos em pedra. Delegar nossa ética aos mercados nos põe em risco de um erro oneroso.
1. Um aumento falho de 50 vezes no preço dos medicamentos (Daraprim, de $13 a $750) é revelador. Ele relembra a irritação com os “aumentos de preço” de 700% do Uber em tempestade de neve, quando adeptos do livre mercado reclamaram: as pessoas simplesmente não entendem “economia básica”.
2. Eu diria que alguns adeptos do livre mercado simplesmente não entendem as pessoas. Ou as reações éticas das pessoas. Apesar de rotular grandes aumentos de preços como “lógicos e justos” ou racionais e eficientes, eles ainda cheiram à exploração e incomodam as pessoas. Economia implica ética (ética contundente, sistêmica, global) e, com razão, provoca reações de “equidade”.
3. A “economia básica” relevante é a “lei” de oferta e procura. Grosso modo: os sinais de preço garantem que os mercados “compensam” com eficiência. Aumento dos preços = maior demanda = incentiva mais oferta e vice-versa. “Compensação” significa que toda a oferta é vendida (não necessariamente utilizada de forma eficiente).
4. Comparemos dois esquemas de alocação: um empreendedor faz 100 itens por US $ 10 cada. Usando o métido de preço de custo acrescido, ela vende tudo por US $ 13 cada = US $ 300 de lucro. Usando a maximização de preços “o quanto o mercado puder aguentar”, ela vende por US $ 750 cada = lucro de US $ 74.000. Muito melhor para ela, obviamente. Mas ao todo? É melhor que 100 clientes tenham menos $ 737? Como eles usam US $ 737 pode beneficiar mais a economia (maior multiplicador econômico).
5. Novamente, as normas do mercado não são fatos da natureza. São escolhas que moldam incentivos e orientam os mercados em direção a determinados objetivos. Nossas regras não precisam priorizar os lucros do fornecedor em relação a outras metas da comunidade. Observação: custo acrescido não limita o lucro — para lucrar mais, satisfaça mais clientes. Os adeptos do livre mercado podem preferir a manipulação de preços, mas seus benefícios não são auto-evidentes. A menos que seja ensinada, a lógica de mercado é “cognitivamente anti-natural”.
6. Ademais, os “mecanismos” de mercado variam empiricamente (enquanto leis da natureza como a da gravidade são inegociáveis — elas funcionam da maneira como funcionam, não importa o que façamos). Por exemplo, alguns mercados usam o método de preços com custo acrescido (= outrora popular em economia).
7. Antes de atender à multidão de “livre mercado em tudo”, lembre-se de que os mercados são sistemas feitos pelo homem para alocar recursos. Antes de permitir que as forças do mercado (descuidadamente) coordenem inúmeras transações, lembre-se de o quão completamente errados economistas podem estar (e que eles usam “racional” e “eficiente” diferentemente, às vezes enganosamente).
8. Além disso, a economia e suas “leis”/alegações geralmente falham. O livre mercado não converte lógica, nem empirica e automaticamente o interesse próprio em o bem social, nem gera resultados ótimos “ordenados espontaneamente”. Não é tão simples assim.
9. Aqueles que amam as muitas grandes coisas que os mercados fazem poderiam trabalhar mais para consertar os males relacionados. Nada nos obriga a deixar os californianos regarem exuberantes gramados, enquanto os poços pobres secam; ou fazerem toaletes musicais, enquanto alguns moram de fome. Dispositivos, remédios, Uber, toaletes musicais, comida e água não são eticamente equivalentes ou igualmente leiloáveis. Vamos escolher esquemas de alocação adequadamente.
10. Podemos usar o poder massivo das forças do mercado para apoiar nossos objetivos éticos. Talvez o objetivo das leis quando da fundação da América “saudáveis … para o bem público”.
Contudo, se você preferir um mundo seguro para a manipulação de preços, vamos fazer mais treinamentos de “economia básica”: simulações de inflação de mercado no jardim de infância? Juramentos diários de “uma nação sob” o lucro… dedicadas à idéia de “governo do povo, pelo povo”, para o lucro, não pereça na Terra?
Publicado em Big Think