A Venezuela não possui um histórico muito diferente dos outros países da América Latina: colônia espanhola, tornada independente no século XIX em um processo guiado pelo nacionalismo-liberal de Simón Bolívar, mantida fragmentada e separada de seus países vizinhos pelas artimanhas inglesas.
Não obstante, a Venezuela possuía uma das maiores reservas de petróleo do mundo, e isso seria determinante para o destino do país nos séculos XX e XXI.
Já nos anos 50 do século passado, no bojo da estratégia atlantista de ocupação da América Latina, os EUA plantaram na Venezuela um ditador-títere, Marcos Pérez Jiménez, para garantir a exploração do país pelas corporações estrangeiras, bem como elevadas remessas de lucro. Nesse período, agências de segurança estrangeiras praticamente dominavam as ruas venezuelanas, e metade do lucro da corporação americana Standard Oil vinha de suas operações na Venezuela.
O povo, enquanto isso, sofria. Na miséria, na fome, nas péssimas condições de trabalho. Nada fora do comum na América Latina, especialmente nesse período. A Venezuela era uma típica “república das bananas”. A bonança ditatorial não durou, porém, e uma crise nos preços do petróleo lançou o país no caos.
Posto pelos EUA, o ditador Jiménez foi derrubado também pelos EUA, para tentar garantir a pacificação do país e evitar que os lucros das megacorporações estrangeiras, especialmente as petrolíferas, fossem afetados pelos protestos populares.
Assim começou a chamada IVª República, um período que foi, provavelmente, um dos mais ruinosos para a Venezuela e seu povo, até a chegada do século XXI.
Quatro décadas de governos democráticos, mas nem tanto: prisões de opositores e repressão contra trabalhadores e estudantes abundaram nesse período. Desse período remontam, também, as crises de abastecimento e a falta dos alimentos e produtos mais básicos.
A pobreza e a fome se intensificaram com o “choque” neoliberal implementado nos anos 80. O resultado foi o “Caracazo”, um levante popular venezuelano, contra um governo que existia única e exclusivamente para garantir a exploração do país por empresas estrangeiras. O governo respondeu com o massacre de 3 mil trabalhadores e estudantes.
A raiz do chavismo está aí. Sem entender esse histórico é impossível entender o que veio depois.
10 anos após o Caracazo, Hugo Chávez, um militar patriota do Exército Venezuelano, fortemente influenciado pelo peronismo revolucionário via o intelectual argentino Norberto Ceresole, chegou ao poder na Venezuela para dar fim a décadas da miséria mais abjeta e vergonhosa, da situação social e econômica mais calamitosa de nosso continente.
No poder, Chávez enfrentou tentativas de golpe de Estado, locautes patronais criminosos, sabotagem financeira internacional e uma campanha de ódio midiático extremamente virulenta. Ao longo de seu governo, inúmeras vezes jornalistas pediam, ao vivo, o assassinato de Hugo Chávez (e há os que dizem que, sob seu governo, não havia “liberdade de expressão”…).
Os resultados, porém, foram inegáveis e irrefutáveis. Em pouco mais de 10 anos de governo, em comparação com o período que o precedeu:
(1) A renda per capita foi multiplicada em quase 4 vezes;
(2) A população abaixo do umbral de pobreza caiu de 50% para 28%;
(3) O desemprego caiu de um dos níveis mais altos no continente (15%) para 8%, em média;
(4) Houve queda na mortalidade infantil e aumento na expectativa de vida;
(5) A dívida externa caiu de 50% do PIB para 38%;
(6) A inflação caiu de 100% para 30%, nível mais baixo desde os anos 80;
(7) O coeficiente Gini, que avalia a desigualdade sócio-econômica, caiu de 0,487 para 0,380.
E poderíamos continuar. Hugo Chávez desafiou o poder internacional do sionismo e declarou-se inimigo implacável de Israel e de seus agentes internacionais. Seu país retirou-se do FMI e do Banco Mundial. Lançou seus primeiros satélites. Deu passos importantes para a formação de uma aliança geopolítica latino-americana.
Mas seu país tinha petróleo demais.
Petróleo em excesso significa duas coisas: (i) que Seu país, queira ou não, será alvo dos interesses e desejos de grandes potências; (ii) que sua economia será movida pelo petróleo e pelos preços dos barris no mercado internacional.
A primeira opção é inevitável, mas a segunda, não.
A dependência das exportações do petróleo pode ser resolvida industrializando país. Transformando ele em potência industrial e fazendo com que ele produza bens de alto valor agregado para exportá-los − ao invés de exportar petróleo e apenas petróleo. E essa era a Venezuela. Na Venezuela, desde os anos 50, importa-se tudo, praticamente tudo. E exporta-se, praticamente, só petróleo.
Mas a indústria venezuelana cresceu sob Chávez. É o que mostram os dados. A indústria privada, inclusive, cresceu muito mais que a pública. Mas o papel econômico da indústria petrolífera cresceu muito mais.
O petróleo seguiu representando 15% do PIB da Venezuela. E isso é muito. E o preço do petróleo começou a desabar já a partir de 2012. E com isso, endividamento e inflação voltaram a disparar.
Esse foi o erro fundamental de Hugo Chávez: a tentação da riqueza “fácil” do petróleo. A garantia de riqueza dada pelos altos preços do petróleo.
A isso devemos somar a intensificação da guerra travada pelas forças anti-nacionais internas contra o governo, a multiplicação das greves patronais, a radicalização da campanha de ódio da mídia. Para piorar, por causa dos problemas cambiais, hoje os empresários venezuelanos importam para vender no mercado negro, desabastecendo os mercados oficiais, ou mesmo importando para exportar, por causa dos subsídios para importação.
E o que temos agora?
O que temos agora é o resultado dos planos americanos já expostos pelo Wikileaks, de tentar fomentar uma “Primavera Venezuelana”. A estratégia é a mesma da Síria, da Líbia e da Ucrânia: financiar ONGs “pró-democracia”, financiar “jornalistas alternativos”, fomentar protestos violentos, provocar o derramamento de sangue e fazer de tudo para desestabilizar o governo.
É a aplicação dos mesmos manuais técnicos de golpe de Estado aplicados várias vezes nas últimas 2 décadas.
E para ficar claro: ISSO SERÁ PÉSSIMO PARA O BRASIL.
Não precisamos de mais um regime pró-americano no continente. Já há muitos, e todos eles formam uma espécie de “cordão sanitário” ao nosso redor, tentando limitar a formação de um bloco geopolítico latino-americano guiado pelo Brasil. Mesmo sob um governo pateticamente frouxo como o do Temer, limitar a influência do Brasil na América Latina ainda é pauta do governo americano.
Por isso, a única posição socialista patriótica possível é a de apoiar o governo bolivariano da Venezuela CONTRA TUDO E TODOS. Enquanto nenhuma alternativa real, ainda mais radical, ainda mais socialista e muito mais nacionalista surgir, apoiar qualquer outra alternativa é apoiar a entrega da Venezuela aos EUA e a seus lacaios parasitas. E isso equivale a apoiar o cerco ao Brasil.
Uma alternativa deverá surgir na América Latina, basta juntar nacionais-revolucionarios pra concorrer com Bolsonaro pra Presidente no lugar do Haddad, formando a frente das Massas Verdes.