A Geopolítica da Russofobia: Uma Guerra Híbrida

No presente artigo, o filósofo e analista geopolítico Alexander Dugin analisa a situação dos conflitos interétnicos dos países integrantes da CEI (Comunidade dos Estados Independentes). Fomentados pela atual guerra híbrida, estes conflitos geram um sentimento de russofobia na região, assim, orquestrando um possível cenário para conflitos muito semelhantes com os vistos na Ucrânia.

Todos os dados ligados a Russofobia surgem nos países ligados à CEI[1]. A questão é: por que agora? De fato, a área de relações interétnicas é um tópico profundamente delicado. Tudo em uma sociedade está aqui. Por vezes tomando proporções catastróficas, como confrontos e massacres[2]. Além disso, poderia resultar em uma guerra de grande escala.

Por vezes permanece ao nível recorrente de confrontos. No entanto, em qualquer caso, se o objetivo é abalar esta ou aquela sociedade, então a esfera de relações interétnicas é o meio mais conveniente. Virtualmente desprovido de problemas.

A mídia possui um papel essencial nesta área. Se sua atenção é sistematicamente focada em tais tópicos e plots, consegue escalar facilmente o nível das situações. Um conflito diário e insignificante – no espírito de abuso de álcool, violência doméstica, ou colapso mental[3] – pode facilmente desembocar em um problema mais sério.

Imagine que exista um movimento para prevenir acidentes automobilísticos. Em cada acidente – incluindo corpos mutilados, sangue, atroz unidade entre partes mecânicas e pedaços humanos, crianças, animais, e idosos aos prantos –, cada uma das vítimas são filmadas e transmitidas na TV. Vídeos são postados online. Cada acidente automobilístico é friamente documentado. Após um mês de tal campanha, a adoção da lei para o banimento de automóveis na cidade seria automático. E aqueles que resistissem correm o risco de serem linchados.

Isso simplesmente não ocorre porque a quantidade de dinheiro arrecadado pela indústria automobilística é imenso.

O mesmo ocorre com conflitos interétnicos. Vale a pena registrá-los cuidadosamente, para então, disseminá-los em larga escala e emitir uma cobertura vigorosa, debatendo e analisando, e após um certo tempo, é consequência lógica esperar por conflitos reais e até mesmo guerra.

Esta é a lógica por trás do recorrente surgimento da Russofobia nos países que constituem a CEI. Não há dúvida que exista atrito. Eles sempre existiram, e na época do colapso da URSS, eles desempenharam um papel próximo de uma limpeza étnica e a prática de genocídio contra a população russa – em um largo território dos países da CEI. Atualmente, a escala é incomparavelmente menor. E porque milhões de russos foram forçados a fugir; também porque é completamente desvantajoso economicamente para as autoridades dos países integrantes da CEI chamar mais atenção para isso. Claro, novos países estão construindo seus próprios estados nacionais, e a língua desempenha um papel fundamental em tais casos. Mas, até mesmo isso pode ser resolvido gradualmente e gentilmente. Quando necessário, Cazaquistão, Uzbequistão, Quirguistão e Tajiquistão podem fazer isso.

Mas aqui estão os vídeos virais nos quais os povos das Repúblicas da Ásia Central, humilham russos de maneira sistematicamente dolorosa. O tema é levantado por nacionalistas locais que surgem por todos os lugares. Então houve uma onda de indignação entre nós. Totalmente justificada – nós estamos ultrajados como nossos irmãos e irmãs russas estão sendo insultados. Nós imediatamente esquecemos que epítetos nós mesmo estamos atribuindo aos imigrantes destas repúblicas – trabalhadores convidados e imigrantes ilegais. Mas nós somos Um, já eles…

O quadro de um grande pogrom[4] de russos já está se formando na Ásia Central. Algo deve ser feito…

Por que tudo isso agora? Estou convencido que isso faz parte da estratégia Ocidental para minar a integração do espaço eurasiano. A influência do Ocidente – incluindo as Repúblicas da Ásia Central – está em constante decadência. A Rússia como um polo sobreano, pelo contrário, está fortalecendo-se. Após a saída dos EUA no Afeganistão, o prestígio do Ocidente tende a zero. Melhor, a ameaça de expansão do Talibã banido na Rússia cai sobre a Ásia Central, e somente a Rússia é capaz de proteger Quirguistão, Tajiquistão, Uzbequistão e, ao mesmo tempo, o Cazaquistão.

Claro, a Rússia exigirá alguma retribuição. A integração estratégico-militar do espaço eurasiano fala por si só. Alguns nacionalistas turcos fracos de espírito[5] criam um canal que, sistematicamente, humilha russos. Um nobre ativista dos direitos humanos no Cazaquistão, que intercedeu pelos russos, está preso. Mas o nacionalista russo responde na mesma moeda[6] somente em relação aos turcos. Um grupo de imigrantes ilegais está sendo expulso do país. É o bastante para fornecer uma gama de argumentos convincentes para o despacho, assim, o problema torna-se um bola de neve.

É este o esquema da guerra híbrida. Há um telos: esfacelar o fortalecimento do papel de peso da Rússia no espaço eurasiano. Estratégia: usando tensões interétnicas – russofobia e nacionalismo russo recíproco. Recurso: network, suporte midiático para a companhia e uma série de demonstrações políticas[7] para reforçar a ameaça. A guerra híbrida envolve, não somente agentes e profissionais, mas também agentes provocadores nacionalistas de extrema-direita. Usa pessoas reais, emoções humanas, o desejo pela restauração da justiça e da proteção dos seus. Mas seja como for, o objetivo final já foi alcançado. Moscou está começando a se enfurecer com seus parceiros da Ásia Central. Esses respondem na mesma moeda. Integração em questão. A missão do Ocidente, que tem passado por tempos difíceis, foi cumprida.

De acordo com o mesmo cenário, tudo foi construído na Ucrânia, nos Países Bálticos e na Moldávia. Não é isso? É?

Notas
[1] Comunidade dos Estados Independentes (CIS)
[2] “Pogroms”.
[3] Mental breakdown.
[4] Palavra russa que significa “causar estragos de maneira violenta”.
[5] O termo usado aqui é feeble-minded.
[6] O termo utilizado é in kind. Não tenho certeza, mas acredito já ter visto esse termo com algo relacionado a “pagar com a mesma moeda”.
[7] “Political showcases”.

Fonte: Geopolitica.RU

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Aleksandr Dugin

Filósofo e cientista político, ex-docente da Universidade Estatal de Moscou, formulador das chamadas Quarta Teoria Política e Teoria do Mundo Multipolar, é um dos principais nomes da escola moderna de geopolítica russa, bem como um dos mais importantes pensadores de nosso tempo.

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